Jean-Claude Juncker avisa: “A crise não terminou…”

O candidato do centro-direita à presidência da Comissão Europeia, apoiado por PSD e CDS, reuniu-se com Passos Coelho e visitou uma quinta biológica com Paulo Portas. Com o seu humor mordaz, registou algumas subtilezas.

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Juncker e Passos desta vez não estão afinados Rui Gaudêncio
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O luxemburguês Jean-Claude, 60 anos, não estava preparado para tanto neo-realismo, neste domingo de manhã. Assim que entrou na Quinta do Arneiro, em Azureira, envergando o seu fato escuro e gravata, foi recebido por uma ministra, Assunção Cristas, de mala de mão e saltos altos. O pior estava para vir, na visita guiada liderada por Paulo Portas, de camisa de quadrados aberta, calças de ganga a desfazerem-se na bainha, botas de couro, e chapéu-panamá na cabeça.

Toda a comitiva do candidato do Partido Popular Europeu, que apoia Juncker na corrida à sucessão de Durão Barroso, calcou torrões de terra seca, levantando uma nuvem de pó, até entrar na primeira estufa, onde se produzem alfaces, acelgas, espinafres e rúcula. Portas, sorridente distribuía elogios à ministra do CDS, e com à vontade e verve, discorria em bom francês.

A diferença: antes disto, que se passou depois do meio dia e meia, em Mafra, Juncker esteve com Pedro Passos Coelho, na Lapa. Aí conversou em inglês, e com políticos trajando o uniforme de serviço. No caso do primeiro-ministro português, um casaco azul escuro, umas calças cinzento-carvão, com dobra na bainha, e camisa azul clara. Passos reuniu-se com Juncker à porta fechada, na sede do PSD, na Lapa, em Lisboa. A conversa privada foi breve. No fim, falaram ambos aos jornalistas.

Passos começou, referindo-se ao “bom amigo de Portugal” que é Juncker (Portas pronuncia ‘Junkér’, Passos prefere ‘Iúnker’). “É seguramente um homem que pode trazer à União Europeia uma perspectiva de desenvolvimento.” “Não é possível ter uma Europa mais solidária sem ter uma Europa mais responsável”, prosseguiu Passos.

Juncker ia ouvindo uma tradução simultânea, ao ouvido direito, fornecida por uma assessora que trajava de laranja. O primeiro-ministro português lembrou “o apoio” de Juncker enquanto ex-presidente do Eurogrupo. “Apesar de termos cometido os nossos erros no passado, damos hoje prova de termos uma grande confiança no projecto europeu e no projecto do euro, de que fazemos parte e não pretendemos abandonar”, destacou Passos. O presidente do PSD garantiu, algo contra-a-corrente, que “a Europa, nestes últimos três anos, deu um salto qualitativo e evoluiu”. <_o3a_p>

Quando chegou a sua vez, Juncker falou num inglês com "franco-sotaque". “Quando estou neste País estou em harmonia comigo mesmo”, lembrando os 20% de portugueses que vivem no Luxemburgo. “Quando saio de casa cheiro pastéis de Belém”, gracejou. Há pouco mais de uma semana, Martin Schulz, o adversário socialista de Juncker, mostrara conhecer as virtudes literárias de Portugal, citando Saramago e Lobo Antunes. Juncker seduz a plateia com uma confissão: “Portugal é um dos meus dois países europeus preferidos, mas não vos vou dizer qual é o outro…”

Mais a sério, felicitou Passos por “sair do plano de resgate de uma forma limpa”. “Foi uma performance enorme.” Juncker lembrou que, na sua opinião, “a consolidação orçamental e o crescimento económico orientado para a criação de emprego são as duas faces da mesma moeda”. Apelidou de “irresponsáveis” os políticos que prometem criar défices orçamentais. Criticou Putin, defendeu o Tratado Transatlântico, da Europa com os EUA, considerando que isso beneficiaria a posição ocidental de Portugal numa Europa que virou a Leste.<_o3a_p>

Findas as declarações, vieram as perguntas. Juncker ficou em branco. Nenhuma ia além da política interna. O luxemburguês gracejou, agradecendo o pouco trabalho que teve para responder a… nada. Passos, pelo contrário, teve de “misturar as campanhas”, a europeia e a futura legislativa. “Ainda temos défice para reduzir”, defendeu. Considerou “prematuro” pensar-se num “alívio fiscal”. “Não creio que haja nenhuma crise na coligação, nem nenhuma tensão na coligação”, respondeu, sobre o mal-estar do CDS a propósito das suas palavras recentes que deixavam em aberto a hipótese de um Governo de Bloco Central.

As declarações de Carlos Moedas, sobre a possibilidade teórica de um novo resgate, essas não são “notícia”. “Não há nenhuma razão para que Portugal não seja bem sucedido no futuro.” “Ninguém no Governo nem no PSD apresenta mensagens desligadas da realidade”, garantiu.<_o3a_p>

Com todos no terraço da sede do PSD, Passos e Juncker trocaram breves palavras em inglês, enquanto trincavam pastéis de nata. Passos apresentou-lhe Fernando Ruas, candidato do PSD, pedindo ajuda ao ex-autarca de Viseu para traduzir “município” para inglês. Depois, os dois portugueses debateram, na língua de Camões, a duração do mandato de Ruas à frente da Associação Nacional de Municípios Portugueses, que Passos ia jurar que fora de quatro anos, mas Ruas teimava em assegurar que foram 12. Juncker olhava. Pouco depois receberia, das mãos do primeiro-ministro, um pacote de pastéis de nata e uma garrafa de vinho do Porto.<_o3a_p>

Portas, mais tarde, inovaria, oferecendo a Juncker um caixote personalizado com hortícolas biológicos. O vice-primeiro-ministro recusou-se a comentar a actualidade política interna. Com Juncker ao lado, leu-lhe, em francês, uma frase pintada no local onde duas funcionárias embalavam as alfaces e demais legumes em caixotes iguais aos que o luxemburguês recebeu: “Unir-se é um bom começo; manter a união é um bom progresso; trabalhar em conjunto é a vitória.” “Juro que isto já cá estava, não foi pintado agora, de propósito, gracejou.” <_o3a_p>

Juncker é conhecido pelo seu espírito mordaz. Certa vez disse que, “quando as coisas se tornam sérias, temos de mentir”. A frase persegue-o. Em Mafra, talvez para se redimir, garantiu: “Se eu disser a um desempregado português que ele deveria estar orgulhoso por os mercados financeiros terem de novo confiança em Portugal, isso não lhe interessava e, provavelmente, não compreenderia.” E para rematar: “A crise não terminou”…<_o3a_p>

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