Aluno de Massamá que atacou colegas pede nulidade do acórdão que o condenou

Pedro Proença espera que Tribunal da Relação se pronuncie ainda esta semana. E aponta vários erros ao julgamento do Tribunal de Sintra.

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O ataque aconteceu a 14 de Outubro. O tribunal decidiu o destino do jovem a 4 de Fevereiro. Agora falta saber o resultado do recurso Nuno Ferreira Santos

As movimentações na sala de aula, naquele dia, são passadas em revista. Um rapaz com uma faca de cerâmica na mão. Uma colega que foge para o quadro e é agarrada pela camisola. Outro colega que foge para a porta. Uma das teses do recurso do advogado do adolescente que, a 14 de Outubro, atacou dois alunos e uma funcionária da Escola Secundária Stuart Carvalhais, em Massamá, é a de que o rapaz, hoje com 16 anos, não queria de facto matar. Que se o quisesse fazer, tinha tido condições para o fazer — bastava ter feito mais força quando golpeou. Pelo que não pode ser castigado por homicídio qualificado na forma tentada. Mas Pedro Proença também aponta várias irregularidades e erros de julgamento.

Desde logo, o advogado contesta que a juíza tenha pedido ao jovem, durante uma das sessões, para escrever um excerto do alegado plano para matar 60 pessoas que levava consigo na mochila no dia do ataque. A juíza ditou parte do documento, explica Proença, o jovem escreveu. Quis assim o tribunal fazer um “exame directo” à letra do jovem, comparando os dois documentos — já que o rapaz não quis falar sobre os factos.

Pedro Proença pede a nulidade do acórdão por causa disso. Diz que no seu recurso alega que estão em causa “direitos elementares" de defesa, porque não só o seu cliente não foi informado dos resultados desse exame, para efeitos de exercício do direito ao contraditório, como o tribunal não cita o dito exame para fundamentar a sua convicção de que foi o jovem que escreveu o “plano do massacre”.

Recorde-se que quando a polícia o deteve, já na rua, o jovem tinha consigo uma folha A4 em que descrevia um plano para matar 60 pessoas e imitar um massacre, como o de Columbine, nos Estados Unidos. Um plano que terá sido feito com outro colega da escola. Foi isso que contou quando, pouco depois de ser detido, foi ouvido no primeiro interrogatório judicial, em declarações que foram gravadas sem que alguém lhe tenha dito, segundo Pedro Proença, que poderiam ser usadas em tribunal. Este é outro dos pontos essenciais do recurso: o tribunal decidiu decretar uma medida de internamento de dois anos e meio em regime fechado tendo em conta uma audição de declarações que, diz Pedro Proença, não poderia ter acontecido, por violar a lei.

Foi há quase dois meses (4 de Fevereiro) que o Tribunal de Família e Menores de Sintra determinou que o jovem de Massamá deverá ficar internado num centro educativo mais dois anos e meio — para além dos três meses que já levava de internamento. Três crimes de homicídio qualificado na forma tentada e a um crime de detenção de arma proibida foram dados como provados. Caíram, entre outras, a acusação de terrorismo.

Pedro Proença apresentou recurso, este foi aceite no dia 18 de Fevereiro e, em declarações ao PÚBLICO, o advogado explica, pela primeira vez, no que é que se baseia para pedir uma revisão da medida a que o jovem foi sujeito. De resto, aguarda que ainda esta semana o Tribunal da Relação decida — uma vez que, diz, aquele “tinha 15 dias para se pronunciar mas já passou um mês”, sendo que o tempo que, entretanto, o jovem leva de internamento não será contabilizado se o recurso não for aceite. Ou seja, os dois anos e meio de “castigo” só passarão a contar depois da Relação dizer o que fará agora.

“Falha de avaliação”
O recurso contesta aquilo que o tribunal considerou como provado, a começar pela intenção de matar (todos os golpes nas vítimas foram ligeiros, apesar da dimensão da faca, 11,5 centímetros) e contesta também aquilo que se considera ser um errada avaliação da personalidade do jovem.

O tribunal teve em conta um relatório pericial realizado apenas por um psicólogo forense que trabalha no centro onde o jovem está internado e não por um pedopsiquiatra como, por várias vezes, o advogado pediu que acontecesse. Ora, prossegue Pedro Proença, tendo em conta que o próprio tribunal reconheceu que o jovem tem características que exigem uma intervenção imediata, nomeadamente ao nível da pedopsiquiatria, o tribunal “arriscou” tomar uma decisão que por “falha de avaliação no plano da saúde mental” poderá pôr em risco a integridade física do menor.

O advogado pede, em suma, que o jovem seja absolvido dos crimes de homicídio qualificado na forma tentada e que lhe seja aplicada uma medida em regime semi-aberto, de forma a poder ter contacto com os pais, sendo acompanhado por especialistas da área da psicologia e da pedopsiquiatria.

Depois da sentença, o rapaz teve uma “crise aguda de depressão”, nas palavras de Pedro Proença, na altura. Hoje está melhor. Tem estado “ansioso”, enquanto não se conhecem os resultados do recurso, mas tem “bom comportamento e bom aproveitamento escolar”.

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