Sintonia da oposição não impediu aprovação dos novos estatutos da RTP

Deputados de esquerda questionaram independência do Conselho Independente proposto pelo Governo. Ministro confirmou que Norte será sede de um serviço de programas com autonomia.

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Ministro confirmou que Centro de Produção do Norte terá um serviço de programas com autonomia de decisão Enric Vives-Rubio

A criação de um Conselho Geral Independente (CGI) na RTP, com o poder de nomear e fiscalizar a actuação do conselho de administração, foi o aspecto mais contestado pela oposição no debate desta sexta-feira sobre as alterações ao estatuto da empresa e à Lei de Rádio e Televisão. Mas a sintonia dos deputados de esquerda não impediu a aprovação dos diplomas propostos pelo Governo e pela maioria PSD/CDS .

Num debate que também evocou as personagens de Miguel Relvas, Augusto Santos Silva e até de D. Quixote, os deputados do PS, PCP, PEV e BE seguiram de perto algumas das críticas que já constavam do parecer facultativo da Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC) às propostas legislativas em apreço e puseram em causa a operacionalidade e a própria independência do CGI preconizado pelo Governo para a RTP.

Cecília Honório, do BE, insurgiu-se contra o facto de dois dos seis membros do CGI serem nomeados pelo Governo e de aquele órgão acabar por se auto-fiscalizar, ao assumir poderes de destituição de uma administração que ele próprio nomeará, para executar linhas de acção que ele próprio definirá. Aludindo ainda ao facto de o regime actual já prever a fiscalização do serviço público de televisão por uma série de entidades, Cecília Honório previu uma “mixórdia orgânica”. “Faça-nos um organigrama”, desafiou dirigindo-se ao ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional, Miguel Poiares Maduro.

Inês de Medeiros, do PS, não pediu ao ministro que fizesse um desenho – pediu-lhe que não fizesse nada. “A RTP, até este este Governo, não tinha nenhum problema substancial”, proclamou a deputada socialista, argumentando que a empresa vinha a reestruturar as contas desde 2003, num caminho para a sustentabilidade desencadeado até por um Governo do PSD, e que contava com uma nova Lei de Televisão que os vários grupos parlamentares haviam conseguido consensualizar , “de forma exemplar”, em 2011.

“O maior problema da RTP com que somos confrontados chama-se Miguel Relvas. Foi aí que começou o descalabro com decisões arbitrárias”, disse Inês Medeiros, aludindo às intervenções do antigo ministro sobre o custo, alegadamente, excessivo do serviço público de televisão. E acusou Poiares Maduro de assumir uma atitude quixotesca: “O antecessor inventou o problema e, agora, por razões dúbias, o sucessor só lembra D. Quixote, mas sem o talento, o carácter picaresco e sem Sancho Pança”.

Sérgio Azevedo, do PSD, contra-atacou: “Julguei que o problema era [o ex-ministro de José Sócrates] Augusto Santos Silva, que quis transformar a RTP no braço armado da propaganda do anterior Governo.” O deputado social-democrata defendeu a decisão do Governo de acabar com a indemnização compensatória do serviço público de televisão, insistindo que os contribuintes gostarão de ver acabar o financiamento da RTP via Orçamento de Estado, para melhor poderem controlar quanto é que esta custa.

Inês de Medeiros também argumentou que a independência da RTP não se garantia por via da criação do CGI, mas pelo respeito da "regra de ouro" de que a sua administração não interfere nos conteúdos dos programas e da informação. “E nesse aspecto a sua proposta nada diz”, atirou a Poiares Maduro.

O ministro devolveu a crítica. “O PS pede a independência da política de conteúdos, mas esta tem que ser definida por alguém. Quem? O PS não diz. Quem define as orientações gerais? O PS não diz. D. Quixote dizia que não há bem nem mal que durem sempre. No caso da RTP, felizmente, o bem está para chegar”.

Poiares Maduro também aproveitou o debate para confirmar que, nos termos do novo contrato de concessão, o Centro de Produção do Norte da RTP, em Gaia, será a sede de um serviço de programas – que não especificou - com autonomia de decisão. “Não por interesse do Norte, mas do país”, acrescentou.

A descentralização foi aplaudida por deputados do PSD. “O Norte conta”, disseram. Pelo contrário, deputados do PS eleitos pela Madeira e Açores criticaram o facto de as propostas em análise serem omissas quanto ao futuro dos Centros de Produção Regionais.

Poiares Maduro garantiu que não foi esquecimento, que já tratou de visitar os centros de produção das Regiões Autónomas às quais prometeu anunciar em primeira mão as novidades e que as propostas neste domínio seguem dentro de momentos.

O Parlamento também aprovou, e por unanimidade, um projecto de lei do PCP que prescreve que um dos membros do Conselho de Opinião da RTP passe a ser designado pelo Conselho das Comunidades Portuguesas.

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