Renfe e gestor da rede ferroviária espanhola revêem protocolos de segurança

Causas do acidente poderão ficar mais claras nesta terça-feira, dia em que as autoridades vão recolher a informação registada nas duas "caixas negras".

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O acidente fez 79 mortos Miguel Vidal/Reuters

As empresas responsáveis pelos comboios e pela gestão da rede ferroviária em Espanha, a Renfe e a Adif, começaram a rever os seus protocolos de segurança após o descarrilamento da semana passada em Santiago de Compostela, avança o jornal El País.

A reconstituição dos momentos que se seguiram ao acidente revela que o maquinista repetiu várias vezes, e perante várias testemunhas, que se sentia responsável pelo que tinha acontecido, mas também põe a descoberto uma declaração mais enigmática: "Já denunciei isto. Não se pode circular nesta via, a esta velocidade, sem um protocolo."

Com base em depoimentos de passageiros e de pessoas envolvidas nas operações de socorro, o jornal El País revela os momentos de desespero de Francisco José Garzón logo após o descarrilamento, que provocou 79 mortos.

O maquinista prestou as primeiras declarações oficiais ainda no local do acidente, ao chefe da Brigada Judicial da Corunha. Segundo o depoimento deste responsável, Garzón perguntou se havia vítimas mortais. "Não se preocupe com isso agora", respondeu o comissário. "Mas como quer que me acalme? Com o que provoquei, prefiro morrer", terá dito o maquinista.

Pouco antes de ter sido encaminhado para o gabinete improvisado da polícia, Francisco José Garzón terá proferido palavras semelhantes em conversas com vários passageiros. Um deles, Alfonso Manuel Lecandatiene, de 33 anos, disse que ouviu o maquinista afirmar que preferia ter morrido: "Sou o maquinista. Tinha de ter ficado aí debaixo." Terá dito isso, enquanto olhava para os restos dos vagões.

Mas um dos primeiros habitantes de Santiago de Compostela a chegar ao local do acidente, Julio Santiso Rielo, de 34 anos, disse à polícia que o maquinista também se queixou de uma alegada falta de protocolo para a circulação de comboios naquela via: "Já denunciei isto. Não se pode circular nesta via, a esta velocidade, sem um protocolo."

O jornal El País avançou que tanto a Adif (Administrador de Infra-estruturas Ferroviárias, empresa pública responsável pela gestão da maioria das linhas espanholas, dependente do Ministério do Fomento), como a Renfe começaram a rever os seus protocolos de segurança após o acidente em Santiago de Compostela.

Segundo o jornal, as questões técnicas que rodeiam o descarrilamento "têm sido muito opacas", mas nas últimas horas a Adif avançou alguns pormenores que podem ser relevantes para a investigação. A empresa fez saber que o sistema de segurança mais avançado, conhecido como ERTMS, está instalado em 80 quilómetros do troço Ourense-Santiago (onde ocorreu o acidente), mas revelou que não pode ser utilizado pelo comboio Alvia por falta de homologação.

Em vez disso, o Alvia é acompanhado nesse troço pelo sistema ASFA, um pouco mais permeável a falhas humanas. Não está em causa a legalidade da situação – como o Alvia não ultrapassa os 200 km/h no trajecto Ourense-Santiago, o sistema ASFA é considerado adequado. Mas alguns especialistas citados pelo El País entendem que o sistema ERTMS poderia ter evitado o acidente da semana passada, embora esta não seja uma opinião consensual.

A Renfe não explicou por que motivo o comboio Alvia não pode ainda funcionar com o sistema ERTMS, mas a Adif fala em "problemas de homologação", sem especificar. O El País sublinha que o comboio Avant, que faz o mesmo percurso, já funciona com o sistema ERTMS no troço em causa.

Este sistema de segurança mais avançado foi instalado no troço entre Ourense e Santiago em Maio de 2010 pela empresa Thales (à qual foi adjudicado por 136 milhões de euros), mas três anos depois continua sem funcionar com o comboio Alvia. Segundo o El País, a Adif disse apenas que o sistema será activado "quando a tecnologia deixar de causar problemas de interferência".
 
 

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