Podemos tenta unir esquerdas, PSOE quer impor-se como única opção ao PP

A caminho das legislativas, e enquanto falta negociar pactos e coligações um pouco por todo o país, os partidos da oposição já pensam em Novembro e em derrotar o PP. Iglesias quer aglutinar listas cidadãs. Sánchez promete mudança sem ruptura.

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Pedro Sánches quer ser o novo primeiro-ministro de Espanha, mas não é o único Pierre-Philippe Marcou/AFP

A política espanhola faz-se por estes dias a muitas velocidades e desenha-se nos muitos municípios ou regiões onde nenhum partido conseguiu maioria clara nas eleições de 24 de Maio. Se olharmos para as estratégias gerais de cada partido, faz-se pelo menos a duas: aquela que dita cada pacto que é preciso negociar nas próximas semanas e a que mostrará aos espanhóis o que oferece cada formação a caminho das legislativas de Novembro.

Para já, os dois processos são simultâneos e difíceis de analisar em separado. Mas as lideranças das quatro formações com que agora se conta em Espanha – Partido Popular e PSOE, mais a esquerda saída do 15M e chamada Podemos, e o Ciudadanos, formação de centro-direita que rouba votos dos conservadores fartos do PP –, debatem internamente cada decisão, ao mesmo tempo que já falam aos eleitores a pensar nas eleições gerais.

O Podemos percebeu que a sua estratégia de apoiar candidaturas municipais de unidade popular deu frutos e tem um objectivo claro, unir todas as forças que em Maio se apresentaram como “marcas brancas” do partido numa só liderança e candidatura. Após o escrutínio das municipais e das autonómicas, estas listas poderão governar em sete capitais: Madrid, Barcelona, Santiago de Compostela, Corunha, Cádis, Saragoça e Oviedo. Em Madrid, por exemplo, a coligação Ahora Madrid obteve mais de meio milhão de votos e mais 45% dos boletins somados pelo Podemos na comunidade.

“A ferramenta política que é o Podemos continua a ser o vector para a mudança em Espanha”, disse no fim-de-semana o número dois de Pablo Iglesias, Íñigo Errejón. Em todo o país, para além das coligações de grupos de cidadãos que o Podemos agora apoiou, há partidos e candidaturas (Compromís, em Valência; as “marés” de protesto que foram a votos na Galiza, por exemplo) que tiveram bons resultados e que têm suficientes pontos de contacto com o partido de Iglesias para que este tente incluí-los nas suas listas.

Há mais uma negociação para travar, entre o Podemos e pelo menos uma parte da Esquerda Unida. Nas listas do Ahora Madrid estava metade da Esquerda Unida na capital, que se afastou por acreditar na nova alternativa. Se a coligação encabeçada pela ex-juíza Manuela Carmena tivesse contado com o apoio de toda a Esquerda Unida o acordo de governo seria muito mais fácil. Assim, para governar, Carmena precisa dos nove vereadores socialistas.

Este é o plano do Podemos. O plano do PSOE de Pedro Sánchez é inviabilizar essa estratégia, impondo-se como a verdadeira alternativa de esquerda capaz de roubar o poder ao PP de Mariano Rajoy. “O desafio do Podemos é tomar consciência que os cidadãos não querem rupturas mas mudança de políticas e nas instituições”, diz Sánchez, entrevistado pelo El País.

Já em campanha para as legislativas, sem rivais internos, apesar de não ter conseguido que o PSOE fosse a força mais votada (ficou a 2% do PP), Sánchez sabe que tem de pesar cada decisão e não descarta acordos pontuais com o Ciudadanos.

Aliás, os dois partidos estão em negociações para se coligarem na comunidade de Madrid e formarem governo, impedindo a eleição de Cristina Cifuentes, a mais votada, do PP. Mas o partido que Albert Rivera fundou há nove anos na Catalunha sabe que os seus novos eleitores no resto do país estão atentos, votaram nos seus candidatos por estarem zangados com Rajoy, não por quererem uma Espanha governada à esquerda.

Dar a volta

“Nós não damos a volta, nós reafirmamos a nossa posição na social-democracia”, diz agora Sánchez. No encerramento da campanha, dizia que o seu partido “é hoje um partido melhor porque aprendeu com os erros, não vai voltar a esquecer que é um partido de esquerda, para fazer políticas de esquerda e governos de esquerda”.

Ora, é isso que cobra o Podemos. “Se o PSOE não der a volta não pode haver acordos connosco”, avisa Iglesias. Ou seja, se os socialistas escolherem por exemplo negociar com o PP em Cádis, para “impedir uma autarquia de mudança”, será difícil para o Podemos negociar outros pactos com o partido de Sánchez.

Na entrevista ao El País, o líder socialista responsabilizou a formação e Iglesias pelo futuro dos municípios e das regiões onde se negoceia. “O Podemos será culpado por permitir ou impedir que a esquerda governe.” Iglesias e Sánchez têm falado ao telefone, mas já adiaram várias vezes um encontro cara a cara.

Derrotas históricas

“Mais humildade, Pedro, tiveste o pior resultado desde 1979”, respondeu Iglesias – e é verdade, o PSOE reivindica um empate técnico com o PP, com os seus 25%, mas baixou desde 2011, quando teve 27% e admitiu uma derrota histórica. Desta vez, o partido de Rajoy somou 27% (baixando dos 37% de 2011) e teve a sua derrota histórica, mesmo vencendo. Contas de um novo tabuleiro, onde agora entram mais partidos e novas lideranças.

Paradoxalmente, é no PP que se esperam menos mudanças de estratégia. Rajoy admitiu que tem de mudar de atitude – em campanha já tinham acabado as conferências de imprensa sem perguntas e o primeiro-ministro quis mostrar-se próximo das pessoas. Há pressões internas, mas não há alternativa nem Rajoy é conhecido por desistir. Ficou quando perdeu para o PSOE em 2004, e de novo em 2008, quando a sua equipa já esvaziava as gavetas. “Eu continuo”, anunciou depois de uns dias a descansar nas Canárias.

Quatro anos depois, a paciência compensou por fim, em 2011, quando o PP varreu as urnas, primeiro regionais, depois com a maioria absoluta nas legislativas. Os tempos são outros, Rajoy continua igual a si próprio. Não desiste nem gosta de mudanças à sua volta. Se depender dele, os ministros ficam e a direcção do partido mudará muito pouco daqui até Novembro.

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