Paz mais perto na Ucrânia, mas solução política adiada

Hollande e Merkel asseguram que intervenções russas na Ucrânia e na Síria não estão relacionadas. Prazo para conclusão do processo de paz no Leste ucraniano adiado para depois do final do ano.

Foto
Hollande recebeu Petro Poroshenko no Palácio do Eliseu Alain Jocard / AFP

À mesa dos líderes da Alemanha, França, Rússia e Ucrânia, reunidos esta sexta-feira em Paris, estava o conflito ucraniano e o vislumbre de que um acordo de paz possa de facto vir a ter efeitos práticos. Mas, apesar de estar ausente da agenda oficial, a intervenção russa na Síria dos últimos três dias não pôde deixar de figurar.

Angela Merkel e François Hollande fizeram desde logo questão de sublinhar que o papel de Moscovo nos dois palcos não está relacionado. Os dois líderes sentiram necessidade de colocar um ponto final nas especulações de que a descida da intensidade nos combates no Leste da Ucrânia esteja ligada ao início dos bombardeamentos russos no território sírio. Os governos da União Europeia e da NATO acusam a Rússia de apoiar com armas, equipamento e soldados as forças separatistas que combatem o exército ucraniano desde Abril de 2014 – algo que sempre foi negado pelo Kremlin - num conflito que já fez mais de oito mil mortos.

O objectivo do encontro de Paris era aproveitar a acalmia dos combates no Leste da Ucrânia para fazer avançar a aplicação do Acordo de Minsk, assinado em Fevereiro. Desde o início de Setembro que o regime de cessar-fogo tem sido amplamente respeitado – apenas com a excepção de alguns episódios esporádicos e sem grandes consequências, de acordo com os relatórios da missão da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) no terreno. À saída do encontro de Paris, o Presidente ucraniano, Petro Poroshenko, dizia sentir um “optimismo cauteloso”.

Nos últimos dias, um novo desenvolvimento veio dar força à possibilidade de que as hostilidades possam ter realmente entrado na fase terminal. O Governo de Kiev e as autoridades separatistas de Donetsk e Lugansk chegaram a acordo para retirar as peças de artilharia pesada e o restante equipamento militar que ainda permanece na linha da frente.

A decisão vai ao encontro de um dos pilares do Acordo de Minsk 2 (assim designado por ser a segunda versão dos acordos de paz), que prevê um recuo de 15 quilómetros do equipamento militar de ambos os lados, de forma a criar uma área desmilitarizada. O chefe da equipa negocial que representa os separatistas, Denis Pushilin, disse que o acordo alcançado “pode simbolizar o fim da guerra”.

Mas se no terreno o clima é de descida da tensão, as divergências mantêm-se no campo político. Um dos pontos mais disputados do Acordo de Minsk continua a ser o aprofundamento da autonomia dos territórios actualmente ocupados pelas forças separatistas. No final de Agosto, a primeira votação das emendas constitucionais que conferem maior autonomia a estas regiões terminou com protestos violentos à porta do Parlamento ucraniano, em que morreram três polícias, e com a materialização de profundas divergências entre os partidos que apoiam o Governo.

O Acordo de Minsk refere a necessidade de um processo de descentralização do poder em favor de Donetsk e Lugansk, sem que a soberania ucraniana seja posta em causa. Mas é sobretudo entre as facções nacionalistas que a lei da autonomia é encarada com maus olhos. Consideram-na um abrir de portas à permanente influência de Moscovo sobre a região do Donbass. Para os líderes separatistas a solução também está longe de ser a ideal, por ficar aquém do estatuto de semi-autonomia que exigem.

Também a data das eleições regionais – outro dos pontos abrangidos por Minsk 2 – gera discórdia entre os dois lados do conflito. O Governo de Kiev quer que os territórios controlados pelas forças pró-russas organizem eleições dentro do enquadramento legal ucraniano e na mesma data que as outras regiões. As autoridades separatistas avançaram unilateralmente para uma data diferente.

A reunião desta sexta-feira serviu para tentar encontrar um meio-termo para este dossier. François Hollande revelou que as eleições regionais terão que ficar para o início do próximo ano, o que impede que seja cumprido o prazo dado inicialmente para que o Acordo de Minsk fosse concluído. Assim, será também improvável que haja até lá uma reversão das sanções económicas aplicadas à Rússia. Para além disso, será necessário que os líderes separatistas acedam à mudança do calendário eleitoral.

Sugerir correcção
Ler 3 comentários