O empresário que pagou para acolher 58 famílias sírias no Canadá

País prevê receber refugiados desde que "patrocinados" por famílias canadianas. Jim Estill pagou 1,4 milhões e envolveu a sua comunidade para ajudar. Hoje, já não é um "porco capitalista", "acham que sou óptimo”.

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Refugiados sírios na fronteira entre a Grécia e a Macedónia, a 8 de Setembro de 2015 Reuters/YANNIS BEHRAKIS

Um empresário canadiano fez da história de milhares de sírios em busca de uma vida melhor mais uma história de sucesso na sua lista de projectos. Das notícias sobre o que teve a certeza de ser “claramente uma crise humanitária” há anos a fermentar na Síria, passou à prática, gastando 1,4 milhões de euros para ajudar 58 famílias sírias a mudar-se para o Canadá com um plano de integração, emprego e autonomia. Antes, achava que a sua mulher e filhos tendiam a achar que ele era “só um porco capitalista”. “Mas agora acham que sou óptimo”.

Este é o princípio e o fim da história de Jim Estill, contada pelo próprio à jornalista Horatia Harrod, que a transformou num testemunho na primeira pessoa no Financial Times. “Não sou muito ligado às notícias”, conta, mas os relatos do que se passava na Síria, onde um conflito armado, político e religioso dilacera o tecido social da região e as vidas de milhares de pessoas, ficaram-lhe na mente. “Estava sempre a pensar que alguém ia intervir e fazer alguma coisa. Mas ninguém parecia estar a fazer grande coisa”, lamenta. Entretanto, a sua história correu mundo: Jim Estill, o empresário de Guelph, Ontário, que se empenhou na ajuda aos refugiados sírios ao abrigo de um programa encetado no Canadá durante a Guerra do Vietname, que prevê o acolhimento de refugiados desde que por um ano sejam “patrocinados” por uma família canadiana.

Um empresário de sucesso, começou a sua vida activa ainda na universidade, com uma primeira empresa e depois tornando-se gestor e actualmente presidente da Danby Appliances, uma empresa de electrodomésticos canadiana. A sua experiência, há cerca de oito anos, quando se mudou para Nova Iorque e sentiu a solidão de ser um estrangeiro num país estranho, contribuiu para ser sensível às necessidades práticas dos refugiados – aquelas que vão para além da subsistência básica. “Aprendi que o importante é fazer parte do tecido social. Por isso, é o que tentámos criar” no projecto de acolhimento e integração de refugiados a uma nova escala, que começou a desenhar no final de 2015. Contactou organizações religiosas e associações da sua pequena cidade de cerca de 120 mil habitantes e pôs o plano em marcha.

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“Como homem de negócios, tenho noção dos benefícios da escala”, explicou ao diário financeiro londrino. Concluiu que levar meia centena de famílias seria mais fácil no que toca à burocracia ou à sua empregabilidade. Contas feitas aos custos para um ano de sustento de uma família multiplicadas por 50, chegou à cifra de 1,4 milhões de euros. “Sabia que podia dar isso.” No Canadá, “faz-se um compromisso de um ano com o Governo para albergar, alimentar e tratar dos seus refugiados. O que foi importante para mim foi assegurar-me de que eles não acabam dependentes – de mim, depois de o ano acabar, ou do sistema de segurança social canadiano”.  

O seu projecto ganhou uma estrutura como a de uma empresa. “Um director para o emprego, um director de transportes, um director de alimentação e um director de mentoria – eles supervisionam cerca de 800 voluntários”, explica Jim Estill. Esses directores de mentoria falam árabe e estabelecem depois relações entre as famílias sírias e outras famílias de língua inglesa também com papéis de mentoria, que vão desde o apoio na assistência médica ou andar de autocarro com os recém-chegados para os ajudar a orientarem-se. Outro programa associado, desenvolvido também pelo empresário, visava o ensino de inglês. “Trabalhei sobretudo por instinto.” 

Com a mediatização da sua ideia, vieram também as solicitações. Não só tinha quem o ajudasse mas, desde Novembro de 2015, quem precisasse e lhe pedisse ajuda. A escolha de quem seria beneficiado envolveu também momentos menos bons – o projecto de Estill era baseado na estrutura familiar de pais e filhos, uma unidade que acha que “tem uma probabilidade maior de ter sucesso no Canadá”. “Mas isso significava que não podia ajudar uma mãe solteira com seis filhos. Senti-me muito mal, porque até certo ponto está-se a fazer de deus, a dizer quem vive e quem morre”.

No final do processo, 58 famílias foram escolhidas, a primeira chegou há um ano ao Canadá e agora são 47 os agregados familiares de refugiados sírios a habitar na comunidade de Estill. Visita-os ao final do dia para beber um chá e tem o apoio da sua própria família, que ao princípio não sabia da sua ideia de ajudar os refugiados sírios que viam nas notícias. Na sua empresa, alguns dos refugiados têm acesso a estágios de três meses, e outros estão a desenvolver os seus próprios negócios. "Temos um que está a gerir um negócio de pizzas a partir da mesquita, porque têm uma cozinha equipada; estamos à procura de um restaurante para alugar", elencou no mês passado à revista Toronto Life.   

Mais 11 famílias estão a caminho nos próximos meses, disse ao Guardian, e o sucesso da sua experiência fá-lo querer manter um fluxo de 50 famílias por ano rumando ao Canadá.

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