A incompetência de quem despediu Paulo Bento

O mundo do futebol é instável. "O que hoje é verdade, amanhã pode ser mentira", disse um dia Pimenta Machado, então presidente do Vitória de Guimarães. Dirigentes, treinadores e empresários teimam em ressuscitar ciclicamente essa máxima, fazendo tábua rasa das suas próprias promessas e declarações.

Agora que Paulo Bento falou pela primeira vez da sua saída do cargo de seleccionador nacional de futebol ficou bem mais claro como tudo se passou. O treinador foi empurrado para a porta de saída. Podemos tomar como verdadeira a palavra de Paulo Bento porque este deu a cara, enquanto o presidente da Federação (ou alguém por ele) se escudou, primeiro, num comunicado que falava de rescisão amigável e, depois, num sopro anónimo para jornais e televisões a fazer crer que o seleccionador tinha pedido para sair.

O mais importante, no entanto, nem é se foi Paulo Bento a pedir para sair. O ponto central neste caso é que o seleccionador saiu após ter conduzido a equipa em apenas um jogo da fase de qualificação. A demissão de Paulo Bento dias depois da derrota com a Albânia não tem qualquer justificação racional, por muito escandaloso que tenha sido perder em casa com uma selecção de quarta ou quinta linha.

Um projecto de uma selecção, ainda por cima pouco tempo depois de o seleccionador ter visto os seus poderes reforçados com a supervisão de todas as categorias, não pode ser abalado por um só resultado.

A demissão de Paulo Bento logo no início da fase de qualificação significa que algo já estava muito mal antes do jogo com a Albânia. E isso significa que a Federação Portuguesa de Futebol afinal não fez uma avaliação rigorosa e transparente do que se passou no Mundial do Brasil, preferindo maquilhar tudo com mudanças no departamento médico.

Fernando Gomes não foi capaz de manter a coerência. Renovou contrato com Paulo Bento ainda antes do Mundial 2014, algo que o futebol actual desaconselha. Manda a lógica que se contratem seleccionadores por ciclos de dois anos. Se alguém arrisca contratar por mais tempo, então deve estar disposto a defender a sua opção. Fernando Gomes disse isso, alegando no momento da renovação que não eram só os resultados que estavam em causa. Mas fez algo bem diferente: na primeira dificuldade depois do Mundial, deixou cair o treinador. Paulo Bento deixou a ideia de que Fernando Gomes foi pressionado por quem o rodeia, mas isso só diz que, além de incoerente, o presidente da FPF é fraco.

O que aqui se diz não é nenhuma desculpabilização de Paulo Bento. É certo que o treinador encontrou vários jogadores em fase descendente e não teve um leque de seleccionáveis ao nível de outros tempos, mas Paulo Bento cometeu vários erros. E provavelmente estava desgastado de mais para continuar depois do Mundial. Fernando Gomes, Humberto Coelho e João Vieira Pinto tinham obrigação de ter feito um diagnóstico correcto quando voltaram do Brasil.

Como não fizeram o diagnóstico correcto (ou não tiveram coragem para implementar a solução correcta), a demissão de Paulo Bento só pode ser vista de uma forma: mais do que a incompetência de quem sai, mostra a incompetência de quem fica.

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