World of Horror é um videojogo de terror feito no MS Paint – por um dentista

O dentista polaco Pawel Kozminski passou sete anos a fazer um videojogo, frame a frame, no Paint. O jogo já foi comprado mais de 263 mil vezes e é a “fonte principal de rendimento” de Pawel.

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Captura de ecrã do jogo World of Horror Ysbryd Games / panstasz
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Se já utilizou um computador com sistema operativo Windows, é quase certo que já se divertiu, pelo menos uns minutos, a fazer rabiscos no MS Paint. Pawel Kozminski, também conhecido como Pantasz, foi mais além e fez algo que parece impossível para uma ferramenta de desenho: um videojogo.

Pawel é um dentista polaco de 31 anos. Leu bem: o responsável pela criação de World of Horror não é programador ou game developer. Foi no tempo que sobrava do seu part-time que construiu, frame a frame, o seu primeiro videojogo. Demorou sete anos.

“Uma pessoa poderia dizer que fazer um videojogo usando o MS Paint é uma loucura, impossível”, reconhece ao PÚBLICO, por email. A certa altura, ele próprio duvidou da exequibilidade do projecto e pensou em desistir. “No final de contas, porém, ainda bem que continuei e completei o produto.” As óbvias limitações da ferramenta, “claro”, não deixaram que o jogo fosse 100% feito no Paint. Houve todo um trabalho de pós-processamento forçosamente feito num programa de desenvolvimento de jogos (game engine, como é normalmente designado em inglês).

World of Horror é um RPG (role playing-game, ou “jogo de interpretação de papéis”, em tradução livre), no qual o jogador veste a pele de um adolescente que investiga uma série de mistérios sobrenaturais na cidade japonesa fictícia de Shiokawa. Ao longo da história, o jogador tem de ir tomando várias decisões que influenciam o curso dos acontecimentos.

Há um total de vinte investigações a completar, mas em cada novo jogo só se tem acesso a cinco, escolhidas aleatoriamente. No final de cada, o jogador é confrontado com um dos “deuses antigos”, os vilões da história. O sistema de combate, como acontece em RPG clássicos como Pokémon ou os primeiros Final Fantasy, é turn-based (por turnos).

Para encontrar e completar a totalidade do jogo, portanto, exigem-se vários regressos a World of Horror. O site How Long to Beat estima que cada jogo demore cerca de duas horas. Encontrar todos os cenários e desbloquear todo o conteúdo extra pode levar até 38 horas.

Um jogo que parece vindo do passado

Decidir fazer um jogo em estilo 1bit – cada píxel só pode ser preto ou branco – foi uma das razões que motivaram Pawel a usar o MS Paint. “A baixa resolução e usar padrões com dither [ruído visual] em vez de cores permitiram-me, como artista inexperiente, cometer alguns erros que acrescentaram algo ao aspecto onírico do jogo”, explicou o autor ao PÚBLICO.

A estética que remete para manga de terror dos anos 1980 e 1990 não é acidental. “World of Horror é uma carta de amor aos media de terror com que cresci na adolescência. O trabalho incrível de Junji Ito [autor de manga de terror] provocou-me muitas noites sem sono e esta é a minha homenagem”, confirmou o responsável pelo jogo.

Apesar de ter tratado de todo o design sozinho, World of Horror não é fruto de um “exército de um homem só”. A banda sonora a lembrar as velhinhas arcades, por exemplo, contou com a mão dos compositores Qwesta e Sebastian “Garoslaw” Zybowski.

Lançado oficialmente em Outubro, World of Horror esteve disponível em early access (acesso antecipado, em português) desde Fevereiro de 2020. Durante este período, vários jogadores experimentaram uma versão incompleta e foram partilhando feedback. “Muitas ideias de fãs”, confirmou Pawel, foram incorporadas no jogo. “É o bónus de ter um título em early access com uma comunidade a construir-se ao seu redor.”

Desde o lançamento que o jogo tem sido, em geral, recebido com entusiasmo. Na loja da Steam, 92% das 8030 avaliações dos utilizadores são positivas. O site de jogos IGN colocou World of Horror na lista dos cinco melhores jogos de terror de 2023. No Metacritic, tem uma pontuação de 78 em 100, com base em 22 críticas.

De acordo com o Video Game Insights, que agrega dados sobre a indústria dos videojogos, só na Steam o jogo já foi vendido mais de 263 mil vezes e gerou 3,3 milhões de dólares em receitas. Hoje, o “projecto de paixão” de Pawel tornou-se a sua principal fonte de rendimento.

Publicado pela Ysbryd Games e a Playism, o World of Horror pode ser actualmente jogado na Nintendo Switch e na Playstation 4 e 5, assim como no computador. Quer no site do jogo, quer na loja da Steam ou das consolas, o preço do jogo ronda os 20 euros.

Pawel está, actualmente, a trabalhar num expansion pack (um pacote de conteúdo extra), que cobre a história que precede a narrativa de World of Horror. Sobre projectos futuros, o dentista-programador polaco só levanta um pedacinho do véu. “Estou actualmente a desenhar um jogo de terror que vai explorar mais uma localização exótica para o jogador ocidental.” Se vai voltar a ser no Paint? Logo se verá.

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