Prova de ingresso para os professores

Se o ministro está de boa-fé, pode e deve seguir a recomendação do provedor de Justiça e excluir da PACC, pelo menos, os professores contratados experientes.

É um facto que a proliferação, nas últimas dezenas de anos, de estabelecimentos superiores de formação inicial de professores, muitos deles de discutível qualidade científica e, não raro, especialmente os de iniciativa privada, com práticas “comerciais” agressivas gerou dezenas de milhares de licenciados em ensino que o mercado de emprego docente tem atualmente dificuldade em acomodar.

À inflação de “notas” finais de licenciatura (agora mestrado), nem sempre correspondem perfis de formação científica e pedagógica igualmente elevados.

Por essa e por outras razões, já anteriores governos sentiram necessidade de criar mecanismos de verificação do “produto final” saído daqueles estabelecimentos de ensino. Chegou a ser criado e existiu durante anos (mais) um instituto público, o INAFOP – Instituto Nacional da Formação de Professores. Acabou por ser extinto, sem ter alcançado o seu escopo: a melhoria significativa dos cursos superiores de formação inicial de docentes.

O atual secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário, João Grancho, que durante anos trabalhou e presidiu à Associação Nacional de Professores, afirmou em 2007, em entrevista à revista Xis, que "ensino tem sido invadido por aquilo a que chamo 'indiferenciados', isto é, indivíduos que não possuem uma vocação nem preparação adequada para a docência. É urgente que exista um órgão – a Ordem, neste caso, que fiscalize e leve a cabo o reconhecimento da capacidade e da competência para ensinar de cada professor".

Esta era, genericamente, a perspetiva de quem está atualmente à frente do ministério, tendo, à época, PSD e CDS militado contra a introdução, em sede de ECD, da previsão de uma prova de ingresso na carreira.

Anteriormente mostravam-se favoráveis a que fosse uma Ordem de professores a assumir atribuições e competências nesta matéria, mas, agora, no poder, ao imporem esta prova de avaliação de conhecimentos e capacidades (PACC) – revelam uma mundividência monopolizadora e centralizadora sobre a Profissão Docente. Aliás, contraditória com o art.º 2.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro (Lei das Associações Públicas Profissionais) que prevê a existência de ordens profissionais.

Verdade seja dita que (porventura por receio de perderem o seu atual “monopólio” sobre os professores) não é do agrado das principais federações sindicais a existência de uma Ordem dos professores. A exemplo do que acontece com outras ordens profissionais, seria esta e não a entidade patronal a estabelecer os critérios de ingresso na profissão.

Uma Ordem dos professores, ao emanar do seio da profissão docente, seria uma entidade autónoma e independente do poder político com atribuições e competências próprias em matéria de autorregulação da profissionalidade docente, baseada num Código de Ética e Deontologia Profissional.

No tempo e no modo como está a ser imposta esta PACC, somos levados a presumir que o grande objetivo do MEC é despedir ainda um maior número de docentes contratados.

Se assim não for, e se o ministro está de boa-fé, pode e deve seguir a recomendação do provedor de Justiça e excluir da PACC, pelo menos, os professores contratados experientes e que "há vários anos satisfazem as necessidades permanentes". Era, aliás, esse o espírito da legislação, ora revogada, ao dispensar da prova todos os docentes que haviam tido uma boa avaliação de desempenho.

Outra hipótese, uma vez que esta matéria vai ser avocada pela AR, será remetê-la para apreciação na respetiva comissão de especialidade, facto que inviabilizaria a realização da PACC, pelo menos na data prevista.

Professor de Direito e presidente da Pró-Ordem

 
 
 
 

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