Em Portugal, só duas universidades têm creche e jardim-de-infância

Coimbra e Lisboa têm 245 vagas para filhos de alunos e professores. Em Aveiro, uma IPSS tem protocolo com a universidade para acolher crianças e, no campus da Costa da Caparica da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UNL, uma instituição privada gere uma creche e um jardim-de-infância.

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Apenas três das 29 instituições de ensino superior públicas são servidas por uma creche ou jardim-de-infância Adriano Miranda

Apenas três das 29 instituições de ensino superior públicas são servidas por uma creche ou jardim-de-infância destinados aos filhos dos seus estudantes, professores e funcionários. As universidades de Coimbra e Lisboa são as únicas que têm um serviço próprio. Em Aveiro, uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) gere um serviço independente da universidade, mas que funciona no interior do campus. Nas restantes, “faltam recursos” para que o panorama seja diferente, diz um dos responsáveis.

De acordo com os dados recolhidos pelo PÚBLICO junto das instituições de ensino superior nos últimos meses, há 245 vagas para crianças nas creches e jardins-de-infância geridos directamente pelas universidades — 100 lugares na Universidade de Lisboa (UL), os restantes na Universidade de Coimbra (UC). No último ano, 90% das vagas estiveram preenchidas. A estes juntam-se outros 210 (todos ocupados) na creche do Centro de Infância Arte e Qualidade (CIAQ), que funciona no campus da Universidade de Aveiro.

Os filhos dos estudantes de licenciatura e mestrado têm sempre prioridade de acesso às creches das universidades, mas representam uma percentagem pouco significativa dos inscritos (11,8% em Lisboa; 16,4% em Coimbra). A maioria dos inscritos são filhos de professores e funcionários. As creches reservam sempre lugares para as crianças de investigadores que passam temporadas curtas nas instituições. Os preços estão divididos por patamares – entre os 60 e os 380 euros na UL, dos 36 aos 247 euros na UC – tendo em conta as condições socio-económicas das famílias.

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Várias instituições têm discutido a abertura de creches universitárias Adriano Miranda

A realidade portuguesa “surpreendeu muito” a investigadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Isabella Lopes, que está a trabalhar na Universidade do Minho no âmbito do seu doutoramento, cujo tema são as creches universitárias. O número “é pequeno”, defende, o que é ainda mais difícil de entender num país onde a educação infantil é “muito assente em privados”.

No Brasil, as creches universitárias têm um enquadramento legal próprio e, entre 23 e 27 — o número não é certo porque uma alteração legal em 2011 fez com algumas creches tivessem sido municipalizadas e deixassem de estar na dependência directa das instituições de ensino superior — das cerca de 70 universidades federais têm um serviço como este.

Porque não acontece o mesmo em Portugal? “Porque faltam recursos”, defende Carlos Dá Mesquita administrador dos Serviços de Acção Social (SAS) da Universidade de Lisboa, lembrando outras situações em que o apoio social à comunidade académica é deficitário. Por exemplo, as residências universitárias, que também são geridas pelos SAS, só têm lugar para 12% dos estudantes deslocados.

A abertura de uma creche para os filhos de estudantes e funcionários já foi defendida noutras instituições. Por exemplo, a Associação de Funcionários da Universidade do Minho faz dessa ideia uma bandeira há mais de uma década e na Universidade do Porto o assunto também já foi discutido publicamente. O certo é que os projectos nunca avançaram.

Inovação pedagógica

Caso diferente é o do Politécnico de Leiria, que chegou a ter serviço de creche e jardim-de-infância, inaugurado em 2003/04, mas que não chegou a completar dez anos de actividade. Foi encerrado no final do ano lectivo 2011/12, na sequência de uma quebra da procura. A “baixa natalidade” aliada ao reforço da rede pré-escolar pública no concelho, que passou a ser a preferida dos pais, justificou a diminuição do número der crianças inscritas, avança ao PÚBLICO Miguel Jerónimo, administrador dos SAS do Politécnico de Leiria.

Para a doutoranda da Universidade do Minho Isabella Lopes, a “grande vantagem” das creches universitárias é precisamente a sua ligação com as universidades. “Estão num lugar onde existem muitos investigadores que querem desenvolver trabalho com as crianças e isso pode ser benéfico porque as expõe a metodologias modernas de trabalho”, explica ao PÚBLICO.

É isso que acontece na creche da UC, fundada em 1973. As educadoras seguem a pedagogia de Reggio Emilia, que privilegia a participação das famílias e tem em conta os interesses das crianças. “Se somos uma universidade, devemos estar sempre actualizados em termos pedagógicos”, defende Conceição Marques, que dirige os SAS daquela universidade.

Os benefícios da creche universitária atingem também a organização das famílias. “Resolvemos a vida a muitas pessoas”, entende Conceição Marques, salientando que as crianças recebidas na creche da UC são de famílias deslocadas e por isso sem rede familiar na cidade, famílias monoparentais ou investigadores que estão em Coimbra por períodos curtos de tempo no âmbito de investigações ou bolsas de pós-doutoramento.

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A creche da UC foi fundada em 1973 Adriano Miranda

A creche da UL — inaugurada na década de 1980 — tem vivido um período de expansão. Este ano atingirá o limite de vagas que pode comportar face ao número de funcionários que tem e está a ser estudado um alargamento, com a criação de cerca de 20 lugares de berçário. Além disso, a creche pode passar em breve a receber filhos de pessoas ligadas a outras instituições de ensino superior de Lisboa, estando a decorrer conversações “bastante avançadas” com o ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, para que os filhos dos seus alunos, professores e funcionários tenham acesso em igualdade de circunstâncias com quem tem ligação à UL.

A situação da Universidade de Aveiro (UA) é diferente da de Coimbra e Lisboa. No campus desta instituição há um serviço de creche, jardim-de-infância e ATL, mas a gestão é totalmente independente da universidade. É o CIAQ, uma IPSS, quem gere a estrutura desde 1980, que é financiada pela Segurança Social à semelhança de outras IPSS. A admissão é completamente aberta ao público geral e segue critérios habituais nestas situações, como a proximidade ao local de residência e ao local de trabalho. Esta circunstância faz com cerca de metade das crianças inscritas sejam filhos de pessoas ligadas à UA.

O CIAQ tem dois pólos dentro do campus da UA e as educadoras têm acesso às bibliotecas da universidade e à sua rede informática, por exemplo. “O facto de estarmos num ambiente universitário valoriza muito a imagem da instituição. Nós somos vistos como a creche da Universidade”, valoriza a directora, Irina Saur-Amaral.

No campus da Costa da Caparica da Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) da Universidade Nova de Lisboa (UNL) funciona também uma creche e um jardim-de-infância. É gerido por uma instituição privada, o Instituto Particular de Desenvolvimento Sócio-Cultural, mas dá facilidade de acesso aos filhos de alunos, professores e funcionários da faculdade.

Notícia actualizada: foi acrescentada informação sobre o campus da FCT na Costa da Caparica.

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