A milícia armada do Oregon perdeu os líderes, está cercada, mas ganhou um mártir

Líderes do movimento foram capturados quando se preparavam para dar uma conferência fora da reserva governamental que ocuparam há três semanas. O FBI cercou as instalações pela primeira vez.

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A polícia deteve Ammon Bundy, o líder do movimento, para além de ter ferido sem gravidade o seu irmão. Rob Kerr/AFP

Durante as últimas três semanas em que uma pequena milícia ultraconservadora ocupou as pequenas instalações da Reserva Natural de Malheur, nos arredores de uma pequena cidade do Oregon, Burns, as autoridades norte-americanas deixaram que os homens armados viajassem e discursassem nas localidades próximas, recebessem mantimentos, jornalistas e até novos voluntários. As exigências eram claras de ambos os lados: governantes e polícia queriam o grupo fora dali, mas o líder da milícia prometia não abandonar o posto até se cumprirem as suas condições. Algo que, antevia há dias Ammon Bundy, “demorará vários meses, no melhor dos casos”.

Bundy fazia pedidos difíceis e a polícia, consciente dos banhos de sangue que se seguiram a intervenções contra grupos paramilitares norte-americanos nas décadas de 80 e 90, parecia disposta a esperar que o grupo se cansasse. Mas os planos alteraram-se. Ao final da tarde de terça-feira, agentes do FBI e polícia de Oregon mandaram parar o carro em que viajavam os líderes do grupo para um novo comício. Detiveram sem grandes incidentes Ammon Bundy, o seu irmão Ryan – atingido sem gravidade num braço – e três outros membros. Mas uma pessoa morreu durante a operação: Robert Finicum, o porta-voz informal da milícia. Testemunhas dizem que tentou carregar sobre a polícia e foi baleado.

Perto de uma hora depois das prisões na auto-estrada, foram capturados dois outros paramilitares em Burns. À medida que isto acontecia, um outro membro do grupo, o oitavo a ser detido, entregava-se às autoridades num estado diferente – o Arizona. Estão todos acusados do crime de conspiração para impedir, através de ameaça ou intimidação, que responsáveis governamentais cumpram as suas funções. Neste caso, os funcionários do Serviço de Fauna e Peixes dos Estados Unidos que gerem as instalações ocupadas. 

As pequenas instalações do Governo federal ainda estão ocupadas por um número incerto de homens armados. Contactado pouco depois de conhecida a morte de Finicum e as detenções dos líderes um aparente novo porta-voz do grupo disse que a noite seria passada ainda em ocupação. “Está tudo muito calmo por estes lados”, declarou Jason Patrick, à medida que começava a madrugada no Oregon. “O plano é [continuar] a resolução pacífica pela noite dentro. Ammon diz que a luz solar é o melhor desinfectante. Deixemos o Sol brilhar e veremos o que se passa.”

Momento de desfecho?
A luz revelou um cenário completamente diferente do das últimas semanas. O FBI ordenou aos ocupantes que abandonassem os edifícios de forma pacífica e instalou durante a madrugada vários controlos de estrada e barreiras. Os militantes estão cercados pela primeira vez desde que tomaram a reserva natural, no dia 2 de Janeiro. Só dois repórteres estavam na zona ocupada ao romper da manhã: John Sepulvado, do jornal local The Oregonian, que anunciava a construção de barricadas pela milícia; e Julie Turkewitz, do New York Times, que num tom diferente escrevia que os ocupantes pareciam menos determinados em levar a missão até ao fim.

Não é certo que a nova atitude do FBI e a detenção dos líderes do grupo contribuam para um desfecho rápido da ocupação no Oregon. A milícia tomou a reserva natural depois de uma marcha de solidariedade com dois rancheiros de Burns, condenados a novas penas de prisão por terem incendiado terrenos do Governo. Mas os dois homens e a comunidade local rapidamente se distanciaram das acções do grupo, que foi pedindo reforços armados para a luta contra aquilo que dizem ser o controlo excessivo de um Estado tirano sobre a vida privada.

Dizem que os governantes em Washington estão a violar a Constituição e que isso lhes permite alguma forma de resistência armada. Em todo o caso, há ideologias e agendas diferentes entre os militantes. Os irmãos Bundy, por exemplo, tentavam criar um movimento nacional seguindo o exemplo do pai, Cliven, que no passado desafiou as leis de propriedade federal no Nevada. Ammon exigia a libertação dos dois rancheiros de Burns, a entrega de terrenos federais a privados e o fim das licenças de pastoreio. Dizia agir por desígnio religioso e insistia – embora nem sempre de forma clara – numa ocupação pacífica.

Já não acontecia o mesmo com Robert Finicum, que agora se tornou numa espécie de mártir para os resistentes e seus apoiantes. O grupo afirma que o antigo porta-voz foi assassinado ao render-se pacificamente, de braços levantados – apesar dos testemunhos em contrário, esta opinião é repetida por vários adeptos da ocupação e alguns políticos conservadores. A verdade é que Finicum afirmara nos primeiros dias no Oregon que preferia morrer a ser detido pela polícia.

“O meu pai era um homem tão bom”, disse ao Oregonian uma das suas onze filhas, Arianna, horas depois da morte de Robert Finicum. “Ele nunca faria mal a alguém, embora acredite que deve defender a liberdade e saiba os riscos que isso traz.”

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