Em Madaya vão morrer 400 pessoas, se não forem tratadas imediatamente

Representantes da ONU dizem que o desastre humanitário na cidade "não tem comparação" com outro local da Síria.

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Centenas de pessoas esperaram a chegada de ajuda alimentar Marwan IBRAHIM/AFP

Na cidade síria de Madaya há 400 pessoas que morrerão muito em breve, de doenças ou de fome, se não foram imediatamente retiradas da cidade para serem tratadas, disse o responsável pelas missões humanitárias das Nações Unidas, Stephan O’Brian.

"Temos que arranjar maneira de chegar a um entendimento para retirar, o mais depressa possível, estas pessoas, para que possam receber tratamento médico. Se isso não acontecer, correm o risco de morrer de subnutrição ou por complicações de saúde", disse O’Brian aos jornalistas em Nova Iorque, depois da reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU em que foi discutida a situação nesta cidade síria.

O'Brian, que falou na noite de segunda-feira, confirmou o que um seu colega em Madaya tinha dito poucas horas antes, quando tinha chegado à cidade um comboio de ajuda alimentar, o primeiro autorizado a entrar desde Outubro. Os relatos sobre a tragédia humanitária de Madaya são credíveis, disse O'Brian.

O sofrimento dos habitantes de Madaya "não tem comparação" com qualquer outro lugar da Síria, tinha dito um seu colega, citado pela AFP. "O que vimos é verdadeiramente horrível". "Há quem diga que se está a exagerar o que aqui se passa. A esses, infelizmente, tenho que dizer: não há exagero, não há qualquer exagero, é tudo verdade", disse este responsável, falando para as câmaras da BBC.

Madaya, cidade a 25 quilómetros de Damasco, foi apanhada na guerra civil que dura desde 2011. Tomada por grupos que querem derrubar Bashar al-Assad — são sobretudo extremistas islamistas dos grupos Ahrar al-Sham e da al-Qaeda ligada à Frente al-Nusra —, foi cercada em Julho pelas tropas governamentais. A fome e a doença minaram a população e o Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV), o Crescente Vermelho e a ONU estão a negociar com todas as partes para que seja dada autorização de passagem às 400 pessoas em risco de vida.

"Trata-se de um processo muito complicado", disse à AFP Pawel Krzysiek, porta-voz do CICV em Damasco. Para retirar os doentes, os feridos, os subnutridos e os que estão a morrer de fome em Madaya, seja por terra, seja por mar, é preciso que as tropas governamentais e "as outras partes" — as tropas rebeldes — garantam a segurança de todos, explicou Krzysiek.

A ajuda alimentar que chegou na segunda-feira à cidade, destinada a 40 mil pessoas, começou, entretanto, a ser distribuída. "Trouxeram comida? Trouxeram medicamentos?", perguntaram as centenas de pessoas que se juntaram para receber o comboio organizado pela Cruz Vermelha; muitas levaram os seus pertences, na esperança de poderem sair de Madaya nas carrinhas da Cruz Vermelha.

Os camiões da Cruz Vermelha levaram arroz, óleo, farinha, açúcar, sal, água, leite, papas para bebés e alguns medicamentos, material cirúrgico e cobertores. Puderam entrar devido a um acordo negociado com as partes em conflito.

Alguns dos relatos que a ONU diz serem credíveis falam em muitas pessoas mortas de fome. Os Médicos Sem Fronteiras anunciaram que numa sua clínica na cidade morreram de fome 28 pessoas (seis delas crianças) desde 1 de Dezembro; desde meados de Outubro que não entrava na cidade ajuda alimentar.

Os médicos, disseram os habitantes aos jornalistas que entraram em Madaya com a coluna de ajuda alimentar, não têm nem medicamentos nem equipamento e, durante meses, tudo o que puderam dar aos doentes e aos subnutridos foi água com sal e água com açúcar.

O enviado do jornal francês Libération relata que Madaya é uma cidade em privação e a calma nas ruas — ou a desolação — é uma consequência disso. As folhas das oliveiras foram colhidas para serem comidas, depois de fervidas em água; a erva foi apanhada e comida, os gatos e os cães foram cozinhados.

Hiba Abdel Rahman, de 17 anos, disse à AFP: "Vi um rapaz matar gatos e dizer à família que tinha apanhado coelhos. Algumas pessoas revistavam o lixo, outros comiam erva". "A nossa situação é muito má, as crianças têm fome... Temos tremuras, sofremos de anemia. As crianças choram durante toda a noite e não conseguimos encontrar nada para lhes dar de comer", disse uma residente da cidade à enviada da BBC, Lyse Doucet.

Os habitantes contaram também que a pouca comida que existe ou é muito cara, e poucos a podem comprar, ou está nas mãos dos combatentes, que não a distribuem pela população civil.

 

 

 

 

 

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