Taxa sobre produtos com excesso de sal e açúcar só com acordo em Conselho de Ministros

Ministro da Saúde admitiu que a medida não faz parte do Documento de Estratégia Orçamental, um dia depois de o secretário de Estado Leal da Costa ter escrito um artigo no PÚBLICO com críticas aos governantes que estão contra a taxa.

Foto
A medida tem gerado posições controversas Adriano Miranda

A ideia de aplicar uma taxa especial sobre os produtos que tenham na sua composição excesso de sal ou de açúcar chegou à Comissão Parlamentar de Saúde através da deputada socialista Luísa Salgueiro, que questionou directamente Paulo Macedo para saber se o ministro era contra ou a favor. A resposta do governante não foi directa, com o ministro a preferir esclarecer que a medida ainda carece de estudo e que só poderá ser eventualmente aprovada se houver acordo em Conselho de Ministros. Uma posição que surge apenas um dia depois de o secretário de Estado adjunto da Saúde ter defendido a ideia num artigo de opinião no PÚBLICO, no qual deixava críticas indirectas aos governantes que se têm manifestado contra o imposto.

O ministro da Saúde foi nesta quarta-feira ouvido na Comissão Parlamentar de Saúde, na sequência de um pedido potestativo do PCP. Numa das intervenções da bancada socialista, Luísa Salgueiro lançou o tema que tem gerado discórdia – mesmo dentro do próprio Governo. A taxa foi anunciada em meados de Abril pela ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, que a apresentou como exemplo de uma forma de arrecadar dinheiro para aplicar na diminuição das dívidas no sector da saúde.  

Só que não há consenso, com a ministra da Agricultura e o ministro da Economia a admitirem publicamente que não vêem a taxa como o caminho a seguir. “Posso dizer que essa matéria não foi discutida no Conselho de Ministros e, portanto, eu creio que não vale a pena estarmos a falar sobre aquilo que, na minha perspectiva, é, neste momento, uma não-questão”, pronunciou-se Assunção Cristas. “Não há taxa. É uma ficção, um fantasma que nunca foi discutido em Conselho de Ministros e cuja especulação só prejudica o funcionamento da economia”, disse, por seu lado, António Pires de Lima.

Paulo Macedo veio agora admitir que, para ser viabilizada, a medida teria mesmo de passar no crivo dos restantes ministros e disse que a taxa “não está implícita no Documento de Estratégia Orçamental”. “Nenhuma taxa será introduzida sem haver acordo em Conselho de Ministros e não houve ainda esse acordo”, reforçou o ministro.

"Agressões ao bem-estar das pessoas”
A posição de Paulo Macedo surge um dia depois de o secretário de Estado adjunto da Saúde, Fernando Leal da Costa, ter escrito um artigo de opinião no PÚBLICO intitulado "O saber não ocupa espaço" e onde explica as vantagens de aplicar esta medida, respondendo de forma indirecta a alguns argumentos, como o de Pires de Lima: “É errado invocar a economia para justificar a persistência de políticas que perpetuam agressões ao bem-estar das pessoas”, escreveu Leal da Costa, dizendo ainda que cuidar da saúde da população é um dever de todos os governantes, ainda que “estas medidas tenham custos políticos que necessitam de vontade política para serem ultrapassados”.

Agora, na comissão de Saúde, Leal da Costa suavizou o discurso e garantiu que o artigo era uma reflexão, como tem feito noutras alturas, sobre temas de saúde pública. “Não há menção a qualquer membro do Governo ou de qualquer partido, seja ele qual for”, garantiu aos deputados o secretário de Estado, insistindo que é “um artigo reflexivo de saúde pública” que destaca a “oportunidade de estudar medidas efectivas para reduzir a carga da doença”.

O tema mereceu ainda uma troca de humor entre Leal da Costa e o coordenador do Bloco de Esquerda, João Semedo. Em determinada altura, o bloquista ironizou que alguns parlamentares já estavam em hipoglicemia, por a comissão se arrastar há mais de três horas. Leal da Costa repescou a expressão para garantir que, por agora, a hipoglicemia (falta de açúcar no sangue) de Semedo tem solução: “Neste momento pode o sr. deputado João Semedo ficar descansado que não se põe para já a hipótese de uma taxa adicional no tratamento da hipoglicemia”.

Apesar dos vários temas abordados, a audição requerida pelo PCP tinha como principal mote as “políticas de saúde do actual Governo”, com os comunistas, nas suas intervenções, a criticar o “desmantelamento” que o Ministério da Saúde tem feito no SNS. O foco de muitas questões foi para a recente portaria que classifica os hospitais de acordo com o seu grau de complexidade, determinando, por exemplo, que valências devem ter. Para a oposição, o documento dá um pontapé de saída unilateral na reforma hospitalar, abrindo porta para o encerramento de serviços. O ministro garantiu, por seu lado, que é apenas uma base de trabalho que contou com colaborações, nomeadamente da Ordem dos Médicos, e que nada está fechado. Por outro lado, destacou que a portaria prevê que todas as unidades tenham as especialidades de psiquiatria e neurologia – o que não acontecia até agora.

Sugerir correcção
Comentar