Americano que desapareceu no Irão em 2007 era espião da CIA

Robert Levinson foi sempre descrito pelas autoridades norte-americanas como um cidadão comum que foi sequestrado numa viagem de negócios, mas afinal tinha sido contratado para obter informações.

Levinson sempre foi apresentado como um americano que desapareceu durante uma viagem privada
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Levinson sempre foi apresentado como um americano que desapareceu durante uma viagem privada DR
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Algumas das mensagens que Levinson foi deixando durante o longo período de cativeiro DR
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Algumas das mensagens que Levinson foi deixando durante o longo período de cativeiro DR
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Algumas das mensagens que Levinson foi deixando durante o longo período de cativeiro DR
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Algumas das mensagens que Levinson foi deixando durante o longo período de cativeiro DR

Durante quase sete anos foi apresentado como um simples cidadão norte-americano que desapareceu no Irão, em 2007, numa viagem de negócios, mas a história veio a revelar-se mais complicada do que parecia à primeira vista. Robert Levinson, um antigo agente do FBI que foi sequestrado na ilha de Kish, trabalhava para a CIA e estava a tentar obter informações sobre o programa nuclear iraniano.

A revelação pública foi feita nesta sexta-feira pela agência Associated Press (AP) e pelo jornal The Washington Post, ao fim de três anos de investigação, mas a verdade já era do conhecimento das autoridades norte-americanas pelo menos desde finais de 2007.

No dia 8 de Março desse ano, Robert Levinson voou do Dubai para a ilha iraniana de Kish, onde se encontrou num hotel com Dawud Salahuddin, um norte-americano nascido na Carolina do Norte e convertido ao islão que, em 1980, assassinou um crítico do ayatollah Khomeini exilado nos EUA. Depois de ter conversado durante várias horas com Salahuddin, Levinson saiu do hotel no dia seguinte, entrou num táxi e nunca mais regressou a casa.

A família só soube que ele estava vivo quase quatro anos depois, em Novembro de 2010, quando recebeu um curto vídeo, com menos de um minuto. “Trinta e três anos ao serviço dos Estados Unidos merece que façam alguma coisa. Por favor, ajudem-me”, disse Levinson. Depois de 22 anos no FBI, o norte-americano trabalhou ainda seis anos na agência de combate ao tráfico de drogas – os restantes cinco, soube-se nesta sexta-feira, foram passados ao serviço da CIA, mais precisamente em estreita colaboração com uma analista de topo, Anne Jablonski, que não tinha autoridade para contratar operacionais.

A relação começou em 2005, depois de terem trocado pontos de vista sobre criminalidade organizada. Os dois tinham um interesse comum: enquanto agente do FBI, Robert Levinson dedicara-se ao combate à máfia russa, e Anne Jablonski era uma das especialistas da CIA em assuntos relacionados com a Rússia.

Aproveitando a experiência do antigo agente do FBI, Jablonski conseguiu que Levinson fosse contratado pelo gabinete de combate ao financiamento ilícito da CIA, e os dois anos seguintes foram recheados de sucessos. Entre outras operações importantes, Robert Levinson obteve informações valiosas sobre o tráfico de droga na Colômbia e sobre o então Presidente venezuelano, Hugo Chávez.

O problema é que Anne Jablonski fazia parte da divisão de analistas da CIA e não tinha autorização legal para contratar espiões. Apesar disso, de acordo com a investigação da AP e do The Washington Post, Levinson recebeu 85 mil dólares para descobrir informações confidenciais, pagos pela agência – um contrato que deveria ser renovado quando regressasse do Irão, em Março de 2007.

A versão oficial manteve-se inalterada ao longo de quase sete anos. Pouco depois de Levinson ter desaparecido, um comunicado do Departamento de Estado norte-americano descrevia-o como “um cidadão comum envolvido em negócios particulares no Irão”; há apenas três semanas, um comunicado assinado pelo porta-voz da Casa Branca, Jay Carney, frisava que Robert Levinson “desapareceu durante uma viagem de negócios à ilha Kish, no Irão”.

Entre os dois comunicados, as autoridades norte-americanas fizeram tudo para esconder a colaboração de Levinson com a CIA e lançaram inúmeros apelos ao Irão para que colaborasse na sua libertação. Nem com a mudança de ventos em Teerão a situação se alterou. O actual Presidente, o moderado Hassan Rohani, repetiu em Setembro deste ano as palavras do seu antecessor, Mahmoud Ahmadinejad: “Não sabemos onde é que ele está, nem sabemos quem ele é. É um americano que desapareceu. Não temos informações sobre ele.”

Como parte de um acordo para impedir que o caso chegasse a tribunal, a CIA assumiu a responsabilidade pelo desaparecimento de Robert Levinson e pagou à sua família 2,5 milhões de dólares. Anne Jablonski e outros dois analistas da agência foram forçados a pedir a demissão, por terem agido à margem da divisão operacional da CIA, e sete outros funcionários foram punidos.

O FBI mantém no seu site uma recompensa de um milhão de dólares por informações sobre o paradeiro do seu antigo agente, mas as hipóteses de Levinson estar vivo são cada vez mais remotas – a última vez que a família recebeu provas de vida foi em 2010 e são conhecidos os seus problemas de saúde. A hipótese mais provável para as autoridades norte-americanas, avançam a AP e o The Washington Post, é que Levinson tenha morrido durante o seu cativeiro, vítima de maus-tratos ou de falta de cuidados de saúde.

A Administração Obama lamentou que a AP tenha divulgado esta informação. “Sem querer comentar a suposta ligação entre Levinson e o Governo, a Casa Branca e outros elementos do Governo pediram com firmeza à AP para não divulgar esta história, por colocar a vida de Levinson em perigo”, disse Caitlin Hayden, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional. “Lamentamos que a AP tenha optado por difundir esta história que em nada ajuda a trazer Robert Levinson para casa. A investigação sobre o desaparecimento de Levinson continua e estamos determinados a trazê-lo de volta”.

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