Tribunais de Salazar, sem culpa formada nem direito a advogado

Divulgado primeiro estudo sobre funcionamento dos tribunais plenários que julgava os opositores ao Estado Novo

a Mais de quatro mil presos políticos foram julgados em tribunais plenários, sem culpa formada, desde que aqueles foram criados em 1945. Foram sujeitos a tortura em interrogatórios onde não era admitida a presença de advogado e seleccionados para julgamento segundo os critérios da polícia politica. São dados revelados no estudo intitulado Tribunais Militares Especiais e Tribunais Plenários durante a Ditadura Militar e o Estado Novo (1926-1974), apresentado na semana passada em Lisboa.Realizado a pedido do ministro da Justiça, este trabalho de investigação foi coordenado pelo professor universitário Fernando Rosas, com o objectivo de explicar o funcionamento dos tribunais políticos especiais (que incluía o Tribunal Militar Especial e os tribunais plenários) como instrumentos do Estado Novo contra os seus opositores. A equipa de investigação do Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, integrou os historiadores Inácia Rezola, Irene Pimentel, Luís Farinha e João Madeira.
Durante a apresentação deste estudo, no Tribunal da Boa Hora, em Lisboa (precisamente na sala onde eram realizadas os julgamentos do plenário), Rosas criticou que a maioria dos magistrados que pertenceram a estes tribunais tenham ficado impunes.
Os autores do estudo referem que apenas os juízes que estavam nos plenários em 25 de Abril de 1974 foram aposentados compulsivamente. Os restantes acabaram a sua carreira no Supremo Tribunal de Justiça sem nunca terem sido julgados.
De 1926 a 1945, existem registos de 10.366 presos políticos com processos e 2500 condenados, refere o estudo. A partir de 1945, o número de presos totaliza os quatro mil, aos quais foram aplicadas medidas de segurança. A maioria (51,4 por cento) provém do operariado, aumentando ao longo dos anos o número de estudantes e de intelectuais.
O papel dos advogados que "punham em causa a sua carreira e liberdade para defenderem os presos políticos" foi também salientado por Rosas durante a apresentação. A investigação constata ainda que, de uma média anual de 300 réus julgados anualmente pelo Tribunal Militar Especial, entre 1933 e 1945, passa-se para menos de metade no período dos tribunais plenários.
A polícia política levava a julgamento apenas uma minoria dos presos políticos, de forma a tornar possível uma punição política efectiva, explicam os investigadores. Só 33 por cento dos 3942 réus que serviram de base à amostra deste estudo foram absolvidos em julgamento ou amnistiados, embora mais de metade tivesse aguardado entre seis meses a um ano pelo julgamento.

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