Oklahoma à espera de decisão de McVeigh

Darrell McClanahan, 59 anos, quer falar. Não sabe é como responder às perguntas. Na sexta-feira à tarde, decidiu visitar, pela primeira vez, o Memorial de Oklahoma City, erguido no lugar onde, há seis anos, morreram 168 pessoas num atentado bombista. Na sexta-feira à tarde, a execução do autor do crime, Timothy McVeigh, foi adiada devido a um erro do FBI. Oficialmente, a polícia federal perdeu 3100 documentos de prova que deveriam ter sido usados no julgamento de Timothy McVeigh, há quatro anos. Tecnicamente, ocultou provas. Encontrou-as agora, a escassos dias da data marcada para a execução, que teve que ser adiada para 11 de Junho, para permitir que os advogados as analisem. "É difícil de entender que o FBI tenha cometido este erro. Todos se esforçaram para que a investigação e o processo judicial corresse bem, para evitar que ele se safasse por pormenores legais. Agora isto", diz Darrell McClanahan, que só soube do adiamento quando já estava no Memorial. Preparava-se para uma homenagem muito privada a um amigo que morreu na explosão. "Moro na cidade. Estive aqui no dia da explosão, à procura do meu amigo. Vi o horror. Nunca mais voltei. Não tinha chegado o momento de regressar, aconteceu hoje", diz Darrell McClanahan, que deparou com uma enchente.Assim que o "Attorney General" (ministro da Justiça), John Ashcroft, oficalizou o adiamento, dezenas de pessoas dirigiram-se para a ferida na paisagem de Oklahoma City. No lugar onde estava o edifício federal Alfred P. Murrah, o alvo de McVeigh, estão hoje 168 cadeiras. De dia, parecem flutuar sobre um tapete de relva, ilusão óptica conseguida com bases de vidro. O espaço está interdito ao público. Só os familiares das vítimas o podem pisar. Na sexta-feira, as cadeiras encheram-se de flores. Foi ali, no grande cemitério sem corpos que é o Memorial, que os familiares quiseram estar no dia da "desilusão", como chamaram ao adiamento. "Para mim, esta execução era o fim de um reino de terror emocional, que agora vai continuar", diz Arlene Blanchard, que sobreviveu à explosão que, entre as 9h01 e as 9h03 de 19 de Abril de 1995, derrubou um terço do Alfred P. Murrah. Duas paredes separadas por um comprido tapete de água representam a passagem do tempo, o momento em que o que existia deixou de existir. Arlene Blanchard sabe que Timothy McVeigh não é o culpado pelo erro do FBI. Mas não consegue aceitar que o desfecho do atentado de Oklahoma esteja nas mãos do criminoso. "Eu sei que não foi ele quem fez a asneira, mas parece que é ele quem continua nos comandos". diz Arlene Blanchard. Como disse o advogado de McVeigh, Robert Nigh, se o seu cliente não tivesse contrariado as suas ordens e se tivesse mantido calado, estaria, hoje, "no topo do mundo". Estaria a "dar cartas". Durante o julgamento, McVeigh, que rebentou o edifício para castigar o Governo federal, que considera opressor, não admitiu culpa. Já na prisão, aceitou colaborar na redacção de uma biografia, "American Terrorist". No livro, explica os seus seus motivos e assume ter sido o autor ao atentado. Acusou-se, dificultando o trabalho dos advogados que, na sexta-feira, passaram seis horas na prisão de Terre Haute, no Indiana, onde a execução deveria realizar-se quarta-feira, a explicar ao cliente quais são as suas opções legais.John Ashcroft disse que os documentos não contêm dados que alterem a sentença. Mas o erro foi feito, abrindo a possibilidade de McVeigh contestar o julgamento, exigindo a sua repetição e, eventualmente, pedir a comutação da pena. Os advogados de McVeigh podem também exigir mais tempo para reverem os documentos, pelo que 11 de Julho só será o dia da execução se McVeigh assim o decidir. "É como se ele estivesse a jogar xadrez. Parece que tudo continua a ser um jogo dele", prossegue Arlene Blanchard. Ontem, Ashcroft esteve reunido com o Presidente George W. Bush para discutir a falha do FBI, e a investigação interna que foi ordenada devido a esta demonstração de incompetência no caso de Oklahoma. E que é o último de uma cadeia de embaraços que esteve na origem da recente demissão do director Louis Freeh. Embaraços que passaram pelo desaparecimento de computadores com informações secretas ou da descoberta de um agente que fez espionagem para Moscovo durante 15 anos.Para os advogados de McVeigh - os actuais e os do julgamento -, a ocultação dos documentos não foi acidental. Como não foi por acaso que foram descobertos menos de uma semana antes da data que tinha sido marcada para a execução. Os advogados disseram que houve "intencionalidade", mas disseram não poder dar mais explicações antes de lerem os documentos. Contudo, voltaram a falar no "segundo suspeito", de quem o FBI chegou a fazer um retrato robot nos dias que se seguiram à explosão. Depois, deixaram caír a teoria do "segundo homem" - existe um mistério por resolver e que é o da perna encontrada nos escombros, que não pertence a nenhuma das vítimas identificadas. "Tudo isto é lamentável", diz Darrell McClanahan, que não conseguiu serenidade no dia em que revisitou o lugar onde vio o horror. A notícia de que a teia legal dos EUA pode dar a McVeigh a possibilidade de um novo julgamento, e a agitação à sua volta, enervaram-no. "Estou cheio de sentimentos contraditórios", diz. Largos minutos depois de ter conversado com o PÚBLICO, Darrell McClanahan regressa. "Já sei como dizer o que penso de tudo isto. A frase não é minha, mas diz que justiça adiada é justiça negada".

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