Beethoven Remix na abertura da Festa da Música

Uma obra de Pierre Henry baseada na combinação de material musical extraído das nove sinfonias de Beethoven com sons trabalhados electronicamente será remisturada ao vivo pelo compositor francês

Como seria a música de Beethoven se este tivesse nascido no século XX e tivesse à sua disposição as técnicas de amplificação sonora, de sobreposição, de filtragem e de espacialização? Como soariam as suas sinfonias se tivesse conhecido o jazz, a pop, a música techno e a música concreta? Nunca o saberemos, mas o compositor Pierre Henry (n. 1927), cujo nome é recordado na história da música como pioneiro da música concreta (feita a partir da combinação de sons e ruídos pré-gravados), apresenta-nos uma hipotética proposta que pode ser ouvida hoje, às 20h30, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa (numa tenda montada na Praça do Museu) no concerto inaugural da Festa da Música, este ano dedicada a Beethoven e seus amigos.A Décima Sinfonia Remix é a última versão de uma obra que o compositor francês (que estará presente na CCB para fazer a remistura ao vivo) concebeu em 1979 com base no material musical das nove sinfonias de Beethoven. Esta versão foi passando posteriormente por várias transformações relacionadas com o próprio percurso artístico de Pierre Henry e o desenvolvimento das novas tecnologias.
Na Folle Journée de 2003, dedicada ao barroco italiano, o director artístico René Martin tinha já encomendado a Henry uma composição alusiva ao tema, construída a partir de sons gravados em Veneza e obras musicais ligadas à história da cidade, mas esta não chegou a ser apresentada na edição da Festa da Música de Lisboa. Desta vez invertem-se os termos, já que a Décima Sinfonia Remix não fez parte da programação de Nantes (França).
Na Décima Sinfonia (estreada em 1979 no Beethovenhalle de Bona, Alemanha) os excertos das sinfonias de Beethoven eram tratados como "sons concretos", sujeitos a novas combinações numa collage gigantesca. Em 1988 uma versão com algumas alterações foi apresentada na Salla Pleyel de Paris (com uma recepção controversa) e dez anos depois (em 1998) surge a Décima Sinfonia Remix, estreada no Festival de Jazz de Montreaux.

"Cenário de um filmeimaginário"
Considerada por Pierre Henry num texto alusivo à composição como uma espécie de "cenário de um filme imaginário", esta versão vai muito mais longe graças "a uma ritmicidade mais rápida, com batimentos, transes electrónicos, cintilações desfasadas, flutuação de filtros, aumentos de frequências, dobragens de reverberação". São também usados ritmos acústicos e faz-se "um piscar de olho à actualidade" com intervenções curtas de um som de caixa de ritmos no princípio e no fim da obra. Em 2002 Pierre Henry fez uma nova "orquestração" e acrescentou-lhe um andamento inicial (Larghetto), mas será a versão de 1998, em dez andamentos, a ser apresentada no CCB.
Aluno de Olivier Messiaen e Nadia Boulanger, Pierre Henry começou por compor obras instrumentais ao mesmo tempo que fazia carreira como músico de orquestra (no domínio do piano e da percussão) para além de investigações sobre uma lutherie experimental (construção de instrumentos). Em 1949 juntou-se a Pierre Schaeffer com quem realizou a Symphonie pour un homme seul (posteriormente coreografada por Maurice Béjart) e partir de então tornou-se responsável pelos trabalhos do Groupe de Recherche de Musique Concrète (GRMC) da rádio até 1958, no qual fundou o seu próprio estúdio (Apsome).
Autofinanciou o seu estúdio até 1982 compondo música para cinema (a sua última banda sonora é destinada ao filme L"Homme à la Caméra. de Dziga Vertov), teatro e publicidade. A carreira de Pierre Henry conta ainda com inúmeras colaborações com coreógrafos (Béjart, Balanchine, Carlson, Cunningham, Nikolaïs, Marin) e artistas plásticos (Yves Klein, Jean Degottex, Georges Mathieu, Nicolas Schöffer e Thierry Vincens).


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