Quantas casas vagas há na minha freguesia? Veja o mapa

Com uma distribuição desigual no país, os alojamentos vagos que podem em teoria vir a ser alvo de arrendamento forçado surgem nas áreas do país em perda populacional, mas também em núcleos urbanos.

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Alojamentos vagos
sem ser para venda ou arrendamento

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Fonte: Censos 2021

No dia 19 de Abril de 2021, o Instituto Nacional de Estatística contabilizou como vagos 375.118 fogos habitacionais que estavam desocupados por motivo de falecimento do anterior morador, porque aguardavam partilha de herdeiros, obras de beneficiação, ou ainda outras situações não especificadas. Trata-se dos imóveis que, não sendo residência habitual, também não estão classificados como residência secundária ou uso sazonal, nem estão colocados no mercado para venda ou arrendamento. São, assim, os imóveis que podem vir a ser abrangidos pelo “regime de arrendamento obrigatório de casas devolutas”, enquadrado no pacote legislativo Mais Habitação, que o Governo tem ainda em discussão pública até dia 24 de Março.

Graças ao esforço censitário feito pelo INE há quase dois anos, podemos perceber onde é que estão as “casas sem gente” a que governantes, políticos e opinião pública tantas vezes fazem alusão, apontando-as também como uma solução necessária para aumentar o número de fogos no mercado da habitação. Nos Censos 2021, o INE encontrou 348.097 casas vagas, mas já colocadas no mercado de arrendamento – pelo que estas não podem ser inseridas na medida agora proposta pelo Governo. É a soma destas duas parcelas – os fogos vagos para venda ou arrendamento e os vagos por outros motivos – que permite chegar ao número de 723.215 imóveis não ocupados como residência habitual.

Se inserirmos os dados apurados pelo INE no mapa do território nacional, percebemos que o fenómeno é expressivo, se distribui de modo muito desigual e que pode ter causas muito variadas. Na proposta de lei que está em consulta pública, o Governo propõe-se avançar com o arrendamento forçado nas casas desocupadas que não sejam “casas de férias”, “casas de emigrantes ou de pessoas deslocadas por razões de saúde e razões profissionais ou formativas” ou ainda “casas cujos proprietários estão num equipamento social como um lar ou estão a prestar cuidados permanentes como cuidadores informais”. Na impossibilidade de saber quais os imóveis que cumprem ou não estes requisitos, resta perceber, onde se localizam estas propriedades que, em teoria, poderão vir a ser abrangidos por esta medida.

Os dados apurados revelam que uma grande parte dos fogos vagos surge nas áreas do país onde há perda populacional – um sinal do despovoamento e da falta de procura destes territórios. Mas também há uma grande concentração de casos nas áreas metropolitanas e em zonas de pressão urbanística.

Na verdade, fazendo uma análise por freguesias, como aquela que o PÚBLICO efectuou, percebe-se que o problema parece estar concentrado num número restrito. Das 3092 freguesias portuguesas, só 60 têm mais de mil fogos vagos que não estavam para venda ou arrendamento. Se a análise for feita em termos absolutos, vamos encontrar o maior número de casos em freguesias eminentemente urbanas, como é o caso da União das Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória, no Porto – com um total de 3382 fogos vagos, seguida de muito perto da freguesia de Santo António dos Olivais, em Coimbra, com 3285 fogos vagos.

Se a análise incidir em termos proporcionais – número de fogos vagos face ao património edificado existente –, vamos encontrar casos dramáticos, como o da freguesia de Pinzio, no concelho de Pinhel, que dos 478 fogos existentes, 203 estão vagos – atingindo uma taxa de 42,47%. Esta taxa só é superada, a nível nacional, pela freguesia de Ilha, no município de Santana, na região Autónoma da Madeira, que tem uma taxa de fogos vagos de 46,1% – mas que apenas dispõe de 193 imóveis.

Conceitos antigos

Os conceitos de casas devolutas, alojamentos vagos e arrendamento coercivo não são propriamente novidade no sistema jurídico nacional – a primeira vez que se cruzaram os conceitos de casas desocupadas e mercado de arrendamento data de 2006, com a publicação do Novo Regime de Arrendamento Urbano. E a função social da habitação, isto é, a que determina que todo o imóvel deve cumprir a sua função social, ficou consagrada na Lei de Bases da Habitação, que está em vigor desde 2019. Mas a forma como o Governo se propõe densificar estes conceitos e utilizá-los encerra algumas novidades. E trouxe críticas de vários quadrantes.

Por um lado, levantam-se dúvidas sobre a constitucionalidade: pode o direito à habitação sobrepor-se ao direito à propriedade, se são ambos constitucionais? Por outro, contesta-se a exequibilidade da medida: terão os municípios meios para analisar facturação de consumo (empresas de abastecimento água, electricidade e gás sinalizam contadores onde não haja consumos mínimos), contactar proprietários, pôr o imóvel no arrendamento e entregar as rendas aos senhorios?

No Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) actualmente em vigor, o arrendamento forçado serve apenas como mecanismo para a administração pública recuperar despesas com eventuais obras coercivas. Não há dados sobre quantos imóveis já foram sujeitos a este regime de arrendamento forçado desde que ele entrou em vigor, em 2019. Mas sabe-se, por exemplo, quantos imóveis foram sinalizados pelos municípios como devolutos no ano de 2021. E como é que se sabe? Porque as autarquias podem agravar os impostos municipais a estes imóveis sem utilização, multiplicando por três, ou por 12 (no caso de se situarem em zona de pressão urbanísticas) as taxas de Imposto Municipal de Imóveis (IMI).

Segundo as informações dadas pela Autoridade Tributária ao jornal Eco, foram apenas 35 os municípios que aplicaram este agravamento de taxas, aumentando o imposto a 10.372 prédios. Este agravamento significou para os municípios uma receita de mais de sete milhões de euros.

Por enquanto, ainda não há dados referentes a 2022, porque a liquidação do IMI pode ser feita até Abril. Mas as câmaras de Lisboa e Porto já se pronunciaram publicamente sobre o número de imóveis devolutos que vão declarar relativamente a 2022: 2646 imóveis no caso de Lisboa e 1788 no caso do Porto

A ministra da Habitação, Marina Gonçalves, tem vindo a público lembrar que o executivo não tenciona dar prioridade a esta medida e que pretende usá-la apenas em última instância. “Mas faz sentido tê-la na lei, para ser usada quando necessário”, afirmou a ministra numa sessão para apresentação do programa a militantes socialistas. E no Conselho Nacional da Habitação, convocado de urgência no início do mês, o PÚBLICO sabe que a Marina Gonçalves chegou a defender a medida argumentando que ela servirá para apoiar os proprietários que têm mais dificuldades em arrancar com o processo – e neste caso será o IHRU a tratar do contrato e a entregar as rendas ao proprietário.

O Estado propõe-se, em primeiro lugar, arrendar a habitação devoluta para a subarrendar a valores acessíveis. No caso de o proprietário não aceitar a proposta que lhe for apresentada, é-lhe dado formalmente um prazo para dar uso ao imóvel. Se não o fizer, o Estado pode então proceder ao seu arrendamento forçado. A vereadora da Habitação da Câmara Municipal de Lisboa, Filipa Roseta, já disse que não pretende empenhar muitos esforços na execução desta medida , porque elas não são prioritárias e vão aumentar a litigiosidade. Esta medida é também uma daquelas que o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, já questionou se seria concretizável.