Teixeira dos Santos fez a mudança que Campos e Cunha recusara

A primeira grande medida do novo ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, foi a de fazer a vontade ao primeiro-ministro
e substituir a administração da Caixa Geral de Depósitos, uma mudança que Campos e Cunha recusara por considerar que
a equipa de Santos Martins estava no início do seu mandato e interessava manter a estabilidade na instituição, que agora passa
a ser presidida por um gestor socialista. O Presidente da República soube das mudanças pela comunicação social e não gostou

O Presidente da República, Jorge Sampaio, não foi avisado previamente por José Sócrates da decisão de mudar a administração da Caixa Geral de Depósitos, uma das instituições mais relevantes do tecido económico nacional, tendo sabido da notícia através da televisão. O PÚBLICO apurou que o Presidente terá reagido mal não só ao facto de José Sócrates não o ter informado, como Durão Barroso habitualmente fazia quando tomava medidas semalhantes, mas também não terá visto com bons olhos a entrada do ex-ministro socialista Armando Vara para administração, já que fora por sua pressão que ele saíra do Governo quando era ministro da Administração Interna de António Guterres, após o escândalo da Fundação para a Prevenção e Segurança. A transferência de poder dentro do Grupo Caixa Geral de Depósitos (CGD) foi, por outro lado, um dos pontos de discórdia entre o chefe do Governo, José Sócrates, e o anterior titular da pasta das Finanças, Luís Campos e Cunha, que se recusou a mudar a administração a meio do mandato. Esta terá sido mesmo uma das razões que levaram à saída de Campos e Cunha do Governo.
Loga nas primeiras semanas de governação, José Sócrates sugeriu ao anterior ministro de Estado e das Finanças que procedesse à substituição da administração da CGD, liderada por Vítor Martins, o que este recusou fazer. No braço-de-ferro que travou então com o primeiro-ministro, Campos e Cunha alegou que o mandato de quatro anos seria para levar até ao fim. Isto porque a administração indicada pelo Executivo de Santana Lopes tinha tomado posse há menos de um ano, em Outubro de 2004.
No entender de Campos e Cunha, as mudanças na estrutura de topo da Caixa, nesta fase, não só poderiam indicar um reforço da politização da empresa, com efeitos negativos na sua imagem exterior, mas contribuiriam igualmente para criar instabilidade no tecido social do grupo financeiro, que ainda recentemente levou a cabo uma greve geral contra a transferência do Fundo de Pensões para a Caixa Geral de Aposentações. Por isso, na última assembleia-geral da Caixa, a 17 de Junho, o Estado, o único accionista da CGD, chegaria mesmo, por indicação de Campos e Cunha, a manifestar total confiança em Vítor Martins, uma figura respeitada que fora secretário de Estado dos Assuntos Europeus de Cavaco Silva.
Porém, apesar do voto favorável, a tutela optou na altura por não atribuir prémios aos gestores e por não proceder à sua avaliação, dando sinais de poderem existir divergências quanto ao futuro. O que aliás se acabou por confirmar.

Um gestor ligado à ala guterrista do PS
Segunda-feira ao final do dia, e apenas dez dias depois de tomar posse, Teixeira dos Santos esclareceria as dúvidas, ao anunciar de forma inesperada para os mercados financeiros que o Governo iria proceder a mudanças na gestão da Caixa Geral de Depósitos, nomeando agora um financeiro da área seguradora e um nome próximo da ala guterrista do PS: Carlos Santos Ferreira.
O gestor, que amanhã assume funções de presidente, passará a trabalhar com um conselho composto por um total de nove membros (menos dois que a anterior administração, que dispunha do número máximo permitido pelos estatutos).
Nos últimos anos, uma "mescla de critérios" não exclusivamente "financeiros" tem orientado a escolha das administrações do banco público, com a maioria dos administradores a transitar da equipa de Vítor Martins. Mesmo assim sai reforçado o peso dos nomes com ligações partidárias fortes ao PS, PSD e PP. É o caso de Armando Vara e Maldonado Gonelha, ambos dirigentes do PS e ex-ministros de governos socialistas, e de Celeste Cardona, dirigente do PP e ex-ministra de Durão Barroso. Refira-se que Celeste Cardona é amiga pessoal de Maldonado Gonelha.

Os argumentos de Teixeira dos Santos
Quanto ao actual titular da pasta das Finanças, este justificou as mudanças em comunicado oficial por, entre outras coisas, a Caixa necessitar de "uma liderança forte e uma relação com o accionista Estado assente na transparência". Segundo Teixeira dos Santos, "nos últimos meses uma série de eventos e notícias" vieram "fragilizar a imagem interna e externa da actual administração, bem como a relação de confiança que deveria existir entre ela e o accionista". Razão que o levou "a criar condições que permitam à CGD prosseguir com firmeza a sua estratégia". Para o actual ministro, ao indicar o nome de Santos Ferreira para liderar o banco público, a sua preocupação foi a de assegurar a competitividade do grupo Caixa num mercado muito concorrencial, como é o financeiro
Contudo para João Lopes, sindicalista da CGD, a nomeação de uma nova administração é um acto "surpreendente" pois "ainda há pouco tempo os actuais gestores tinham recebido o apoio do Governo", o mesmo que agora "vem contestar actos de gestão realizados" por Vítor Martins. "É uma história mal contada, até porque a Caixa está a atravessar um bom momento" do ponto de vista económico e financeiro. Para João Lopes, "se o Governo tivesse feito as mudança quando chegou ao poder era mais razoável".
Para preparar a transição, Carlos Santos Ferreira encontrou-se ontem com o ainda líder da instituição Vítor Martins, para acordarem a passagem de testemunho.

Sugerir correcção