Lucky Luke e Rantanplan perderam o pai Morris

Desde Maio de 1999 que uma equipa de cientistas portugueses, de várias áreas, está a analisar o que acontecerá a Portugal num mundo onde haverá mais dióxido de carbono na atmosfera lançado pela mão do homem, e que por isso deverá tornar a Terra mais quente. O estudo tem o nome inglês de "Scenaries, Impacts and Adaptation Mesures" ("Cenários, Impactes e Medidas de Adaptação"). Ou simplesmente SIAM. Financiado pela Fundação Gulbenkian e Fundação para a Ciência e Tecnologia, o projecto é coordenado por Filipe Duarte Santos, da Faculdade de Ciências de Lisboa. Em fase de redacção, estará concluído em Outubro, mas o PÚBLICO falou com alguns especialistas envolvidos e deixa aqui cenários para os efeitos das alterações climáticas em duas áreas - a energia e a saúde pública.

Só se soube ontem, mas aconteceu na passada segunda-feira: Morris, o criador de Lucky Luke, faleceu num hospital de Bruxelas, cidade onde vivia, em consequência de embolias pulmonares que sobrevieram a uma operação ao colo do fémur. Tinha 77 anos.Tudo se passou com muita rapidez. Há 15 dias, aparentava uma "grande forma", nas palavras de um porta-voz da editora francesa Dargaud que o vira recentemente na capital belga. Uma semana depois Morris deu uma queda e fracturou o colo do fémur. Foi submetido a uma operação, sempre delicada numa idade tão avançada, e não sobreviveu. O mundo dos quadradinhos está, obviamente, mais pobre. Foi ontem a enterrar em cerimónia privada que contou apenas com a presença da família.Os 87 álbuns de Lucky Luke (quase todos publicados em português pela Meribérica-Liber) dizem tudo acerca da fantástica capacidade de trabalho do artista. Em Março passado saiu a última aventura, "L'artiste peintre", e já tinha mais um álbum e meio preparados. Participara também na preparação de 52 episódios de desenhos animados - no ar a partir de Setembro próximo - com as aventuras do "cow boy" (que dispara mais depressa do que a sua sombra...) para o canal público de televisão France 3. E tinha em projecto uma longa-metragem para 2002 ou 2003, com Djamel no papel de Jo Dalton. Sem esquecer, claro, as aventuras independentes do estúpido cão Rantanplan, que Morris autonomizou em 1987 numa série própria.Apesar de se manter sempre no "posto de comando", o artista contou quase desde o início com uma equipa de argumentistas (Vicq, Bob de Groot, Van Banda, Claude Klotz, Guy Vidal e outros), que o iam alimentando, em diversas fases, com ideias e guiões para as suas bandas desenhadas. Criou mesmo uma editora para gerir os seus negócios, a par do investimento que a Dargaud, detentora dos direitos sobre uma parte substancial da obra, fez no mesmo sentido em 1999 ao criar a Lucky Comics.Ao contrário de Hergé, Morris sempre manifestou o desejo de ver os seus heróis sobreviverem-lhe e assim deve acontecer. Os 300 milhões de álbuns já publicados em todo o mundo e os produtos derivados geram um volume de negócios anual de 240 milhões de francos (cerca de 11 milhões de contos) demonstrativos de que este é um filão muito rico que continuará a ser explorado.Para chegar até aqui, porém, foi longo o caminho desde que Luke apareceu, pela primeira vez, no "Almanach Spirou 1947", em Dezembro de 1946. A aventura intitulava-se "Arizona 1880" e era assinada por um tal Morris, nome artístico de Maurice De Bévère). Comparada com o seu actual aspecto gráfico, era uma figura tosca onde se vislumbrava a influência do cinema de animação, em que o autor dera os primeiros passos. No ano seguinte o herói entra pela porta grande na revista "Spirou" ("A mina de ouro de Dig Digger"), mas Morris já não assiste ao lançamento dessa história no primeiro de uma longa série de álbuns porque, entretanto, partiu para os Estados Unidos com Jijé e Franquin.É em Nova Iorque que conhece René Goscinny, que se torna seu argumentista e cúmplice na realização das melhores e mais vibrantes aventuras da série. Em 1977 Goscinny morre prematuramente e Lucky Luke - tal como Astérix - nunca mais se recomporá por completo dessa ausência. Mas a partir de 1982 a série ainda recupera alguma da estabilidade perdida com o ensaio de diversos argumentistas, graças à colaboração duradoura com Xavier Fauche e Jean Léturgie.Banda desenhada, cinema de animação, "merchandising" e mesmo filmes com actores de carne e ossos conjugam-se para tornar este herói popular, sensato e com humor um dos "best-sellers" incontornáveis da BD europeia. O Lucky Luke dos primeiros tempos era um herói duro e violento que deu depois lugar a um personagem mais "positivo" e fleumático - um pouco à imagem do próprio Morris, conhecido pelo seu temperamento afável e discreto. Tais qualidades são reconhecidas unanimemente pelos seu pares, que viam nele um homem trabalhador, sensível e modesto. Mas, também, um homem com um peculiar sentido de humor que gostava de repetir esta frase: "Abro todas as manhãs o jornal na página da necrologia. Como vejo que o meu nome não consta, ponho-me a trabalhar".

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