Apenas investimento e consumo público resistiram à terceira vaga da pandemia

Consumo privado caiu mais 4,5%, no meio das medidas de confinamento adoptadas no primeiro trimestre deste ano. Investimento voltou a resistir, com crescimento em cadeia de 3,1%.

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Rui Gaudencio

A recaída registada na economia portuguesa durante os primeiros três meses deste ano deveu-se principalmente à contracção acentuada do consumo privado ocorrida numa altura em que voltaram a ser aplicadas medidas apertadas de confinamento, revelam os dados das contas nacionais publicados nesta segunda-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). O investimento e o consumo do Estado, em contrapartida, voltaram a apresentar uma evolução positiva.

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A recaída registada na economia portuguesa durante os primeiros três meses deste ano deveu-se principalmente à contracção acentuada do consumo privado ocorrida numa altura em que voltaram a ser aplicadas medidas apertadas de confinamento, revelam os dados das contas nacionais publicados nesta segunda-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). O investimento e o consumo do Estado, em contrapartida, voltaram a apresentar uma evolução positiva.

O números agora divulgados confirmam, para o valor total do PIB, aquilo que o INE já tinha dado a conhecer no final de Abril na sua estimativa rápida: que nos primeiros três meses do ano a economia se contraiu 3,3% face ao trimestre imediatamente anterior e 5,4% relativamente a igual período do ano anterior. Mas, para além disso, a autoridade estatística deu nesta segunda-feira a conhecer como é que as diferentes componentes do PIB se comportaram no início do ano.

Sem surpresa, tendo em conta as medidas de confinamento que foram aplicadas no primeiro trimestre para controlar a terceira vaga da pandemia, o consumo privado regressou a um desempenho negativo. Depois da recuperação registada no terceiro trimestre de 2020 e de ter estabilizado no quarto trimestre (redução de 0,4% em cadeia), o consumo das famílias portuguesas voltou nos primeiros três meses deste ano a cair significativamente, registando uma variação negativa em cadeia de 4,5%.

Não é uma queda tão grande como a verificada no início da pandemia, que foi de 14,1% no segundo trimestre do ano, mas representa, em termos históricos, uma recaída assinalável na componente que mais peso tem no PIB. O INE revela ainda que a quebra do consumo foi mais significativa no caso dos bens duradouros (como automóveis ou electrodomésticos), onde a variação em cadeia negativa chegou aos 10,7%.

Outra recaída importante aconteceu ao nível das exportações. Depois da queda a pique do segundo trimestre de 2020 (36,4%), este indicador vinha apresentando uma retoma forte, sentida particularmente no comércio de bens, mas que parecia, no final do ano passado, querer estender-se também aos serviços (onde se incluem as exportações de turismo).

No entanto, com a terceira vaga da pandemia a afectar a possibilidade de entrada de turistas em Portugal, essa tendência quebrou-se. As exportações caíram 2,5% no primeiro trimestre face ao trimestre imediatamente anterior, tendo a queda de 15,4% das exportações de serviços mais do que anulado o crescimento de 1,8% verificado nas exportações de bens.

Estado compensa

Neste cenário de interrupção da retoma a que se assistiu no arranque de 2021, houve, no entanto, alguns pontos positivos. Por um lado, o Estado continuou a compensar parcialmente as quebras registadas no sector privado, contribuindo de forma positiva para a evolução do PIB. No primeiro trimestre do ano, o consumo público cresceu 2,6% face ao trimestre anterior, um resultado a que não será alheio o reforço do esforço orçamental realizado com as medidas de combate ao efeito da pandemia.

Por outro lado, os níveis de investimento voltaram a apresentar uma trajectória ascendente. Depois da queda de 9,4% registada no segundo trimestre de 2020, o investimento tem vindo sucessivamente a apresentar taxas de variação positivas, tendo-se esta tendência mantido no início deste ano, com um crescimento em cadeia de 3,1%. A taxa de variação mais forte aconteceu no investimento em máquinas e equipamentos para além dos de transporte (6,7%), mas o desempenho mais estável e positivo desde o início da crise tem acontecido no investimento em construção, que ainda não registou, em qualquer trimestre, uma variação negativa. Desta vez, o crescimento foi de 2,4%.

Aliás, quando se olha para a evolução dos diversos sectores de actividade, apenas dois, o da construção e o das actividades financeiras, seguros e imobiliárias, apresentam, no início de 2021, um nível de actividade superior ao de igual período do ano anterior.

Para o total da economia, o problema é que estes contributos positivos do consumo público e do investimento não chegam para compensar a quebra registada no consumo privado. E assim, no primeiro trimestre deste ano, a quebra de 3,3% do PIB face ao trimestre passado contou ainda com um contributo negativo de 2,3 pontos percentuais da procura interna (consumo e investimento) e de um ponto percentual da procura externa líquida (exportações menos importações).

A expectativa agora é a de que, depois deste arranque em falso do ano, a economia portuguesa consiga aproveitar, já a partir do segundo trimestre do ano, o aliviar das medidas de confinamento, conseguindo no total de 2021 apresentar uma taxa de crescimento positiva. No Programa de Estabilidade, o Governo prevê uma variação de 4% no PIB. Esta segunda-feira, a OCDE reviu em alta as suas projecções para a economia portuguesa, apontando para um crescimento de 3,7% este ano.