ModaLisboa, Modtissimo e Portugal Fashion: o digital “não substitui a 100%”, mas desenvolve “novas ferramentas”

O formato híbrido é o ideal, garantem as organizações dos três eventos. Por um lado, o digital abre a moda a novos públicos, mas por outro dificulta a interacção, fundamental para a indústria.

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Portugal Fashion costuma realizar-se na Alfândega do Porto Nelson Garrido

Pela primeira vez, a ModaLisboa, o Modtissimo e o Portugal Fashion serão exclusivamente digitais. Que desafios acarreta organizar eventos de moda no digital? Fazer desfiles online também tem vantagens? O PÚBLICO conversou com as organizações dos três eventos e unanimemente defendem que “a moda precisa de interacção” e mal podem esperar por voltar a reunir designers, empresas, modelos e jornalistas num só espaço.

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Pela primeira vez, a ModaLisboa, o Modtissimo e o Portugal Fashion serão exclusivamente digitais. Que desafios acarreta organizar eventos de moda no digital? Fazer desfiles online também tem vantagens? O PÚBLICO conversou com as organizações dos três eventos e unanimemente defendem que “a moda precisa de interacção” e mal podem esperar por voltar a reunir designers, empresas, modelos e jornalistas num só espaço.

De 10 a 14 de Março, sob o tema Comunidade, terá lugar a 56.ª edição da ModaLisboa — que assinala os 30 anos do evento. No mesmo fim-de-semana, entre os dias 10 e 12, a Alfândega do Porto recebe o Modtissimo, que reúne a indústria do têxtil e vestuário. Já o Portugal Fashion está também de regresso de 18 a 20 de Março. O que têm os três eventos em comum? É a primeira vez que serão exclusivamente digitais.

Em 2020, a componente digital já fez parte dos eventos de moda. Ainda assim, os desfiles ainda contaram com a presença de público — mais restrito do que o normal, claro. As edições passadas foram então uma espécie de ensaio para o que agora irá acontecer à distância. “Não substitui a 100% a edição presencial, mas não o podemos fazer de outra forma”, começa por reconhecer Eduarda Abbondanza, directora da ModaLisboa, em conversa com o PÚBLICO.

Também Mónica Neto, directora do Portugal Fashion (PF), e Manuel Serrão, CEO da Associação Selectiva Moda, que organiza o Modtissimo, sabiam que não havia “outro caminho”, que não “a digitalização integral do evento”. Os três concordam que é “um desafio muito grande” organizar este tipo de eventos exclusivamente no digital.

A primeira dificuldade relacionada com a digitalização prende-se com a produção, explica Eduarda Abbondanza. Os desfiles do PF e da ModaLisboa serão transmitidos em diferido e para isso têm, claro, de ser filmados com antecedência. As equipas de produção de ambos eventos — compostas por staff da organização, modelos, designers, cabeleireiros, maquilhadores, etc. — terão de testar negativo à covid-19 antes das filmagens.

Mónica Neto explica que o plano de contingência obrigou “a reduzir ao mínimo as equipas de produção”. Esse jogo de cintura é, para o PF, o “principal desafio”. A filmagem dos desfiles também não será toda de seguida, como era habitual nas apresentações com público e, na ModaLisboa, os bastidores serão quatro vezes maiores que “antigamente”.

E se a ModaLisboa sempre transmitiu os desfiles em streaming, o mesmo não acontecia com o Modtissimo, destaca Manuel Serrão. Na indústria têxtil “nem todas as empresas estão preparadas, como nem todos os potenciais compradores estão disponíveis para esta nova realidade virtual”, explica o CEO da Associação Seletiva Moda ao PÚBLICO. Esse é o principal desafio para o evento têxtil.

“A moda mexe com emoções”

Para o PF e para a ModaLisboa, o digital traz ainda outra adversidade — menos relacionado com logística e mais, sim, com a criatividade. Como conseguir prender a atenção do espectador a um evento digital? “A moda mexe com emoções e transmitir emoções, digitalmente, é difícil”, lamenta Eduarda Abbondanza. Há então que encontrar formas de criar essas emoções à distância e, sublinha, “produzir a maior interacção que conseguimos com a nossa comunidade”.

Essa interacção de que fala Eduarda Abbondanza é imprescindível e o digital nem sempre a possibilita. Ainda que num patamar diferente, também os têxteis precisam da interacção e da emoção. Manuel Serrão explica que nenhuma edição digital poderá substituir o sentido do tacto, por exemplo. O CEO da Associação Seletiva Moda acredita que, no futuro, “estes eventos venham a evoluir para um formato híbrido, mas sempre com grande predominância do evento presencial”.

O formato híbrido é o ideal, defendem as três organizações, até porque a digitalização e a pandemia também trouxeram aspectos positivos. “Temos aprendido imenso com a digitalização”, confessa Mónica Neto, que destaca a criatividade necessária para organizar um evento exclusivamente online. A directora do PF acredita que há “um entusiasmo inédito” e que os “designers estão a abraçar muito bem o desafio”.

“São muitas restrições, mas em termos criativos desenvolvem-se novas ferramentas e dinâmicas”, explica Mónica Neto. Nesta edição, por exemplo, o Portugal Fashion optou por não fazer uma produção para o cartaz, mas sim recorrer a ilustrações de Hugo Van Der Ding.

Também Eduarda Abbondanza celebra “o desenvolvimento de muitas linguagens novas”. O movimento das marcas independentes é uma das muitas conquistas que a pandemia trouxe para a moda, na perspectiva da directora da ModaLisboa. Estas marcas aproximaram-se e estreitaram relações com o cliente. Essa aproximação faz cada vez mais sentido para a organização do evento, que aboliu a imposição de estação na passerelle. “Temos de trabalhar as marcas que estamos a representar, de acordo com as suas estratégias mais favoráveis”, explica.

Tanto a organização do Portugal Fashion, como da ModaLisboa acreditam que esta aproximação da moda ao consumidor veio para ficar e celebram a democratização da moda, acelerada pela digitalização. Mónica Neto acredita, no entanto, que “a moda em Portugal continua a estar longe do conceito de democratização” e apela ao consumidor nacional que valorize a moda de autor. É que os criadores portugueses dependem agora, mais do que nunca — por culpa da pandemia de covid-19 — do mercado nacional.