Joel Pina, mestre de várias gerações no fado, morreu a poucos dias de completar 101 anos

A poucos dias de completar 101 anos, o que sucederia no dia 17 de Fevereiro, o músico Joel Pina, mestre e professor que popularizou a viola-baixo no fado, deixou-nos. Morreu esta quinta-feira, na sequência de um AVC.

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Apesar da sua longevidade, a notícia apanhou de surpresa o mundo do fado: no mês em que completaria 101 anos, Joel Pina não resistiu a um AVC. Recém-hospitalizado no Hospital de Cascais, entrou em coma e morreu esta quinta-feira ao princípio da noite. O agravamento do seu estado de saúde, nos últimos dias, só era conhecido dos que lhe eram mais próximos. Em 2020, ainda celebrou o 100.º aniversário num jantar que foi um encontro festivo, na casa de fados Mesa de Frades, e onde ainda tocou, a acompanhar fadistas (como João Braga) que ali cantaram nessa noite.

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Apesar da sua longevidade, a notícia apanhou de surpresa o mundo do fado: no mês em que completaria 101 anos, Joel Pina não resistiu a um AVC. Recém-hospitalizado no Hospital de Cascais, entrou em coma e morreu esta quinta-feira ao princípio da noite. O agravamento do seu estado de saúde, nos últimos dias, só era conhecido dos que lhe eram mais próximos. Em 2020, ainda celebrou o 100.º aniversário num jantar que foi um encontro festivo, na casa de fados Mesa de Frades, e onde ainda tocou, a acompanhar fadistas (como João Braga) que ali cantaram nessa noite.

Um músico transversal a tudo”

Nascido na aldeia de Rosmaninhal, em Idanha-a-Nova, distrito de Castelo Branco, no mesmo ano em que nasceu Amália Rodrigues, 1920, Joel Pina acompanhou Amália durante 29 anos, de 1966 a 1994. Mas, como lembrou ao PÚBLICO o guitarrista Pedro de Castro, por altura do espectáculo que em finais do ano passado celebrou em Lisboa a arte de Joel Pina, ele “gravou com tudo o que foi fadista: Fernando Farinha, Beatriz da Conceição, Maria Teresa de Noronha, Frei Hermano da Câmara, tudo o que se possa imaginar. Ele foi completamente transversal a tudo.”

Sendo há muito uma referência no mundo do fado, como viola-baixo e professor, participaram nesse espectáculo em homenagem a Joel Pina, em 24 de Setembro de 2020 no Teatro Municipal São Luiz, vários músicos e fadistas, com alguns dos quais ele também ali tocou. Ali estiveram António Zambujo, Mariza, Ricardo Ribeiro, Carminho, Maria da Fé, Lenita Gentil, Katia Guerreiro, Mísia, João Braga, Teresinha Landeiro, Gaspar Varela, Pedro Moutinho, Joana Amendoeira, Ana Sofia Varela, Rodrigo Costa Félix, Teresa Siqueira, António Pinto Basto, Rodrigo Rebelo de Andrade, Joana Almeida, Tânia Oleiro, Gonçalo Salgueiro, Matilde Cid, Beatriz Felício, Zé Maria Souto Moura e Nuno da Câmara Pereira. A acompanhá-los, neste espectáculo promovido pelo Museu do Fado e pela EGEAC, estiveram os músicos Pedro de Castro (guitarrista, e aqui também coordenador), Jaime Santos (viola de fado) e Francisco Gaspar (viola-baixo).

De um bandolim a Amália

Foi aos 8 anos que João Manuel Pina (Joel foi o nome que usaria mais tarde, soma das duas primeiras letras de João com as duas últimas de Manuel) se iniciou na música, a tocar um bandolim que o seu pai lhe ofereceu. Em 1938, mudou-se para Lisboa e conheceu Martinho d’Assunção, que em 1949 o convida a integrar o seu quarteto de guitarras, substituindo o baixista Alberto Correia. E é a partir daí que Joel populariza a viola-baixo no fado.

Ficou dez anos Adega Machado, de 1950 a 1960, foi convidado a participar, com Amália, no filme Os Amantes do Tejo, em 1954, e continuou a acompanhar inúmeros fadistas, como Maria Teresa de Noronha, com a qual andou em tournées pelo Brasil e por Inglaterra. Integrou ainda o Conjunto de Guitarras de Raul Nery, com Fontes Rocha e Júlio Gomes. E foi com Raul Nery que passou a integrar, em 1966, o grupo de músicos que acompanhava regularmente Amália Rodrigues. Com ela correu mundo, até 1994, num período que considerava “o melhor” da sua vida.

A vida num filme e num livro

Joel Pina foi, à parte das lides musicais fadistas, também por duas vezes funcionário público. Primeiro, na Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos, de onde se viu subitamente desempregado em 1950, pouco antes de ser contratado para o grupo de músicos da Adega Machado, por sugestão do guitarrista Francisco Carvalhinho. Em 1961 voltou a empregar-se na Função Pública, agora na Inspecção Económica, onde acabaria por ficar até à reforma.

A arte e o seu exemplo de Joel Pina, cuja boa disposição e jovialidade eram contagiantes, influenciaram inúmeros músicos e fadistas, que o tratavam carinhosamente por “professor”. Recebeu a condecoração da Ordem do Infante D. Henrique em 2012 e a sua vida está espelhada no documentário Joel Pina – O Professor, realizado por Ivan Dias em 2014, e também num livro que o Museu do Fado tem no prelo, para editar oportunamente.