Linfoma - uma doença de muitas caras

A propósito do Dia Mundial do Linfoma, que se assinala a 15 de Setembro, a especialista em oncologia médica Manuela Bernardo lembra os sinais de alerta para “a doença maligna de sangue mais frequente”.

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ADRIANO MIRANDA / PUBLICO

O linfoma é uma doença maligna que resulta da proliferação de células de origem linfóide. Manifesta-se com frequência por aumento de volume / inchaço dos gânglios linfáticos, um processo que pode ser lento e sem outros sintomas ou, pelo contrário, de evolução muito rápida e acompanhado de febre, perda de peso ou suores nocturnos. Embora seja comum este envolvimento dos gânglios, o linfoma pode ocorrer em qualquer órgão, e nesse caso os sintomas são relacionados com o local envolvido.

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O linfoma é uma doença maligna que resulta da proliferação de células de origem linfóide. Manifesta-se com frequência por aumento de volume / inchaço dos gânglios linfáticos, um processo que pode ser lento e sem outros sintomas ou, pelo contrário, de evolução muito rápida e acompanhado de febre, perda de peso ou suores nocturnos. Embora seja comum este envolvimento dos gânglios, o linfoma pode ocorrer em qualquer órgão, e nesse caso os sintomas são relacionados com o local envolvido.

A doença é mais frequente em adultos jovens e particularmente em idades avançadas, pelo que a sua incidência tem vindo a aumentar devido ao aumento da longevidade. É a doença maligna de sangue mais frequente.

Existem múltiplas causas para o seu aparecimento, como exposição a vírus (EBV, HIV), ou outros agentes infecciosos, doenças auto-imunes ou estados de imunossupressão prévios (em doentes transplantados, por exemplo). No entanto, em muitos casos não há qualquer factor causal conhecido.

Em 1832, Thomas Hodgkin, um genial médico (patologista) inglês, então curador do museu de anatomia do Guy's Hospital, em Londres, descreveu pela primeira vez este tipo de doença, que tomou o seu nome. No entanto, com o desenvolvimento dos exames histológicos, veio-se a compreender que há uma enorme variedade de tipos de células, ligados a entidades clínicas diferentes (mais de 50 sub-tipos). Sabemos actualmente que o linfoma de Hodgkin, o primeiro a ser descrito, é na realidade muito menos frequente (cerca de 15%) do que os linfomas não Hodgkin, que constituem a grande maioria (os 85% restantes). Estes subdividem-se habitualmente em dois grandes grupos, B e T, consoante a sua célula de origem é um linfócito B ou T e a fase do desenvolvimento celular em que ocorre o processo de transformação maligna.

Os linfomas não são doenças evitáveis, mas o diagnóstico precoce é muito importante porque nalguns sub-tipos isso pode significar a cura.

O que devemos ter em atenção? O aparecimento de qualquer inchaço anormal que persiste deve ser motivo para consultar o médico. Como disse antes, pode haver linfomas em que isso não ocorre, e nesses casos a falta de apetite, perda de peso ou suores nocturnos deve ser valorizada, tal como febre que não tem causa aparente, mesmo que seja febre baixa. No caso dos linfomas T, pode ocorrer numa fase inicial apenas prurido (comichão) ou alteração da pele, por vezes confundida com eczema ou psoríase. A regra é que se consulte sempre o médico, que saberá valorizar os sintomas e sinais em cada caso.

Por vezes são detectadas alterações nas análises, mas estas também podem ser completamente normais.

É fundamental para o diagnóstico saber o tipo exacto de célula linfóide envolvida, pois disso depende a escolha do tratamento correcto. Portanto deve ser sempre efectuada uma biópsia, quer dos gânglios, quer doutros órgãos em que a doença surja.

São necessários também exames de imagem, cada vez mais exactos, que nos indicam qual a extensão da doença - TAC, PET, entre outros. Devem ser repetidos mais tarde, após a terapêutica, para comparação e avaliação da resposta obtida.

O linfoma é uma doença heterogénea, com quadros clínicos e comportamento muito diversos, que levam a modalidades de tratamento também diversas. Nalguns casos, não há sequer indicação para qualquer terapêutica nas fases iniciais, e em doentes mais idosos pode não haver essa necessidade. Noutros, em especial nos jovens, a doença é mais agressiva e necessita de tratamento vigoroso e imediato.

Poderá parecer paradoxal, mas a possibilidade de cura é maior nos linfomas mais agressivos. Nos chamados “indolentes”, apesar de a doença não se curar, pode-se conviver com ela durante muito tempo, evitando os efeitos secundários dos tratamentos.

Nos últimos anos, temos observado felizmente uma enorme evolução no tratamento desta doença. Actualmente (enfatizando que para cada tipo particular existe uma abordagem particular) a combinação de quimioterapia, corticóides e anticorpos monoclonais é o tratamento inicial de eleição na maioria dos casos. Noutros casos, em doença mais limitada, é suficiente efectuar radioterapia localizada ou até apenas antibióticos ou tratamentos tópicos na pele.

As taxas de cura dependem, como já foi dito, do tipo de linfoma. No caso do linfoma de Hodgkin, os resultados actuais são particularmente optimistas, obtendo-se cura em cerca de 80% dos casos, e em mais de 90% quando a doença é detectada muito precocemente. Neste caso, a preocupação actual é já reduzir ao máximo as complicações futuras dos tratamentos.

Mas nem sempre foi assim. E entre tantos casos anónimos, sabemos de alguns particularmente tocantes.

Dinu Lipatti foi um brilhante pianista romeno que teve o diagnóstico de linfoma de Hodgkin em 1947, aos 30 anos. Era um dos casos em que a sintomatologia não era óbvia, e o diagnóstico só foi efectuado após vários meses de doença, com febre e emagrecimento persistentes. Estava radicado em Genebra desde a guerra, onde se testava então a utilidade dos corticóides, que tão úteis viriam a ser no tratamento do linfoma. A melhoria, embora transitória, foi tão notável que lhe permitiu efectuar durante largos meses a maioria das gravações que conhecemos.

Infelizmente, como hoje sabemos, os corticóides não são suficientes como terapêutica. Dinu Lipatti deu o último concerto a 16 de Setembro de 1950 em Besançon, já de novo muito doente, com febre elevada. Depois de interpretar Bach, Mozart, Schubert e 13 das 14 valsas de Chopin, não aguentou e substituiu a última valsa pela sua peça de apresentação que sabia de cor (uma obra de Bach). Veio a falecer três meses mais tarde.

Tivesse Dinu Lipatti vivido hoje e seria talvez um dos nossos actuais sobreviventes de linfoma de Hodgkin (com a longevidade lendária dalguns pianistas...), continuando a brindar os seus ouvintes com as suas excepcionais interpretações.

E é expectável nos próximos anos, com todos os avanços que a investigação nos tem dado nos últimos anos, que os resultados da terapêutica nos vários subtipos se aproximem cada vez mais dos que já temos actualmente no linfoma de Hodgkin.