Ex-biblioteca do Marquês vai ser equipamento cultural

Hasta pública para arrendamento da cafetaria no Marquês foi anulada pela Câmara do Porto por suspeita de ilegalidades e caso será enviado ao Ministério Público. Autarquia não repetirá processo e vai devolver equipamento à cidade

Foto
Biblioteca Pedro Ivo, na Praça Marquês de Pombal, foi inaugurada em 1948 Nelson Garrido

A história tem meandros de romance policial, com actores anónimos e activistas, políticos, polémicas e posições extremadas. Mas, depois de uma hasta pública suspeita, parece terminar, agora, com um final ansiado por muitos: a ex-biblioteca Pedro Ivo, na Praça do Marquês do Pombal, voltará a ser um “equipamento para fins culturais”. A Câmara do Porto estará ainda a estudar o modelo, mas promete anunciar o projecto brevemente.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

A história tem meandros de romance policial, com actores anónimos e activistas, políticos, polémicas e posições extremadas. Mas, depois de uma hasta pública suspeita, parece terminar, agora, com um final ansiado por muitos: a ex-biblioteca Pedro Ivo, na Praça do Marquês do Pombal, voltará a ser um “equipamento para fins culturais”. A Câmara do Porto estará ainda a estudar o modelo, mas promete anunciar o projecto brevemente.

A decisão foi anunciada pela autarquia esta quarta-feira, depois de a repetição da hasta pública de arrendamento da cafetaria instalada na ex-biblioteca ter decorrido de “forma anormal” e acabar por ser anulada. O caso será agora enviado para o Ministério Público. A licitação-base de 570 euros, o valor da renda actual, foi rapidamente ultrapassada em “mais de dez vezes” e a suspeita de combinação entre licitadores ficou no ar. Dois deles chutaram as ofertas para os milhares de euros – uma de 6500, outra de 7000 –, mas desistiram no final, entregando a vitória a um outro que havia oferecido o terceiro valor mais alto: 750 euros. 

Não era a primeira vez que a suspeita se instalava. A hasta pública da cafetaria aconteceu pela terceira vez, “tendo as anteriores sido também marcadas por situações que levantam legítimas dúvidas resultantes de sistemáticas desistências”. Esse receio, diz agora o executivo de Rui Moreira, havia motivado a construção de um regulamento diferente, “procurando prevenir situações anómalas”. A concessão continuava, no entanto, a ser restrita à “instalação de um estabelecimento de cafetaria” e o critério de adjudicação era o mesmo: o valor mais elevado proposto pela concessão de exploração, não podendo ser inferior ao valor-base de licitação, os 570 euros.

Desta vez, pela forma como os trabalhos correram, a câmara entendeu que “poderiam estar em causa as condições de livre concorrência”, disse em comunicado, e os indícios recolhidos nesta e nas outras sessões serão enviados para o Ministério Público.

Na hasta pública anterior, a 14 de Novembro, uma sessão de menos de 15 minutos terminou com uma renda de 4500 euros, subida de quase 800% em relação ao valor-base. No entanto, à saída do edifício da autarquia, o vencedor, sócio do arrendatário que até então assumia a gestão do espaço, já admitia ao PÚBLICO estar a ponderar desistir.

A dupla de empresários na área da restauração mostrava-se revoltada com o processo, dizendo que a autarquia tinha feito publicidade enganosa com uma fotografia da cafetaria de 43 metros quadrados reabilitada e equipada com os bens deles. “Este valor não tem assunto. Gostava de manter o espaço do meu sócio, mas assim vai ser difícil”, assumia André Gomes.

No início do ano, a decisão confirmava-se. O primeiro classificado desistiu do negócio depois de ter sido notificado pela autarquia, o segundo também. A hasta pública ia repetir-se, anunciava a autarquia, e desta vez o procedimento previa que todos os candidatos seriam notificados em caso de desistência de quem se classificasse à sua frente.

Ainda não se sabe se o destino cultural agora determinado - que será definitivo, garantiu a autarquia ao PÚBLICO – passará por um regresso à ideia original do espaço, aberto em Janeiro de 1948, do qual muitos portuenses guardam felizes memórias. Num jardim da cidade, nasceu nessa altura uma das primeiras bibliotecas populares do Porto, chamada Pedro Ivo e mais tarde classificada como infantil, pelo tipo de livros privilegiados no local.

O espaço acabaria por ser encerrado no início do século, mantendo as portas fechadas até 2012. Nessa altura, um grupo de activistas ocupou o edifício tentando transformá-lo na Biblioteca Popular do Marquês. O sonho, porém, não durou mais do que três dias - a Polícia Municipal e uma equipa da Domus Social retiraram o “recheio” e emparedaram o local, um destino não muito diferente do que havia sido dado ao movimento ES.COL.A do Alto da Fontinha, que foi despejado e detido pela polícia quando ocupou o antigo estabelecimento de ensino para lá instalar um projecto educativo para crianças do bairro.

Com Rui Rio presidente, o edifício foi, então, colocado em hasta pública, com uma base de licitação de 260 euros e sem destino definido pela autarquia. No entanto, o caderno de encargos estipulava como “fundamento de resolução” do contrato a “utilização das instalações para fim e uso diverso do autorizado pela autarquia”. Manuel Leitão, responsável pelo guia Porto Menu, que viu uma das suas edições retiradas dos espaços municipais por ter uma capa com a frase “Rio és um FDP”, algo que o tribunal considerou insultuoso, mas que o empresário alegou serem as siglas de “Fanático Dos Popós” tentou ocupar essa brecha. Mas após dois anos de portas fechadas, Rui Moreira acabaria por entregar o espaço ao segundo classificado.