Morreu aos 92 anos Presidente da Tunísia, figura fundamental da transição democrática

Béji Caïd Essebsi assumiu o cargo em 2014 e chefiou o primeiro governo após a deposição do ditador tunisino Ben Ali em 2011. Foi substituído pelo presidente do Parlamento, Mohamed Ennaceur.

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O Presidente tunisino, Béji Caïd Essebsi, morreu esta quinta-feira num hospital militar em Tunes, capital da Tunísia. O presidente do Parlamento, Mohamed Ennaceur​, já tomou posse como como chefe de Estado interino, por um período entre 45 a 90 dias, segundo a Constituição da Tunísia. AS eleições presidenciais, que estavam marcadas para 17 de Novembro, devem ser adiantadas, disse o presidente do órgão que fiscaliza as eleições.

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O Presidente tunisino, Béji Caïd Essebsi, morreu esta quinta-feira num hospital militar em Tunes, capital da Tunísia. O presidente do Parlamento, Mohamed Ennaceur​, já tomou posse como como chefe de Estado interino, por um período entre 45 a 90 dias, segundo a Constituição da Tunísia. AS eleições presidenciais, que estavam marcadas para 17 de Novembro, devem ser adiantadas, disse o presidente do órgão que fiscaliza as eleições.

O chefe de Estado de 92 anos e até agora o segundo mais velho no Mundo – só Isabel II lhe ficava à frente por mais um ano – foi ministro do pai da independência, Habib Bourguiba, e presidente da Câmara de Deputados do ditador Zine El Abidine Ben Ali, deposto em 2011, dando inicio ao que se veio a chamar Primavera Árabe. Mas reconverteu-se ao regime democrático e teve um papel importante para assegurar a estabilidade na transição democrática tunisina. Chegou ao cargo em 2014, o primeiro a ser eleito por voto popular, através de um pacto com o partido islamista Ennadha.

Essebsi foi por duas vezes internado de emergência em pouco mais de um mês, por causa de uma “grave crise de saúde”, sem mais pormenores a serem adiantados. Desde 1 de Julho, data do seu primeiro internamento, que foi apenas visto publicamente duas vezes.

A Tunísia terá eleições legislativas a 6 de Outubro e as presidenciais estavam previstas para três semanas mais tarde. Mas o presidente do Parlamento tem agora 90 dias para organizar presidenciais, pelo que deverão ser adiantadas e realizar-se até 23 de Outubro, diz o Le Monde. Será a terceira vez que os tunisinos elegem um Parlamento e a segunda que escolhem um Presidente.

O país está ainda a recuperar de 60 anos de ditadura. As fracturas políticas e sociais são ainda evidentes. Secularistas, nos quais se incluem esquerdistas e nacionalistas árabes, opõem-se a islamistas que obtiveram 28% dos votos nas eleições de 2014. O desemprego é muito alto: permanece em 15%, quando em 2010 era de 12%. Falta investimento e a economia não cresce. Há um grande nível de insatisfação social entre os jovens, tal como o que levou aos protestos populares que derrubaram a ditadura em 2011.

Uma velha mão na política

Essebsi atravessou a história política da Tunísia independente. Nascido a 29 de Novembro de 1926 e com formação em Direito, foi assessor do pai da independência tunisina do colonialismo francês, Habib Bourguiba. Desempenhou uma série de cargos sob a sua orientação, entre 1957 e 1971, entre os quais director da Polícia Nacional, ministro do Interior e da Defesa e até de embaixador na capital francesa.

Mais tarde, com a chegada de Ben Ali ao poder, por via de um golpe de Estado em 1987, Essebsi trocou de lealdade política e continuou a desempenhar cargos políticos sob o novo poder em Tunes. Foi embaixador na Alemanha e, entre 1990 e 1991, presidente do Parlamento tunisino.

Em 2011, a Tunísia foi o primeiro país muçulmano sob regime ditatorial a ser palco das revoltas de jovens que ficaram conhecidas como as Primaveras Árabes, Milhares de tunisinos tomaram as ruas e conseguiram depor, pela pressão popular, Ben Ali, obrigando-o em dez dias a fugir para a Arábia Saudita.

O país arriscava-se a cair no caos e violência e Essebsi desempenhou um papel fundamental ao ser nomeado pelo então Presidente interino, Fouad Mebazaa, primeiro-ministro interino, até se realizarem eleições para a Assembleia Constituinte. Negociou com os partidos uma transição pacífica para a democracia. Os seus críticos acusam-no de, aos poucos, ter consolidado o poder em torno da sua figura.

Em 2011, os tunisinos foram a votos e o partido islâmico Ennahda ganhou-as com mais de 50%. Coligou-se com outros dois partidos – o secular Congresso para a República e o Ettakatol – e uma nova Constituição foi redigida. Três anos depois, nas legislativas de 2014, o partido fundado por Essebsi, o secular Nidaa Tounès (Apelo de Tunes, em português), chegou ao Governo. 

Concorreu às primeiras eleições presidenciais democráticas, em 2014, e ganhou-as com 55,68% dos votos – tinha então 88 anos. Em 2018, anunciou que não se iria candidatar a um segundo mandato para dar lugar a alguém mais jovem.

Mas os seus críticos acusam-no de, à distância, ter controlado o Governo tunisino com a ajuda do seu filho, Hafedh Caïd Essebsi, presidente do Nidaa Tounès, concentrando o poder na sua figura. Uma prática que foi comparada à de Ben Ali, durante décadas.