Dispensa para levar filhos à escola no privado gera controvérsia e é adiada

Bloco de Esquerda quer consagrar na lei a possibilidade de os trabalhadores do privado terem três horas de dispensa para acompanharem os filhos no primeiro dia de aulas, como acontece na função pública. CDS diz que se trata de uma “golpada”.

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José Soeiro, deputado do BE, envolveu-se em acesa troca de palavras com António Carlos Monteiro, deputado do CDS. Rui Gaudêncio

A proposta do Bloco de Esquerda para estender aos trabalhadores do sector privado a dispensa até três horas para acompanhar as crianças no primeiro dia de aulas gerou, nesta terça-feira, controvérsia no Parlamento e a sua votação voltou a ser adiada. Este foi um dos temas que dominou a reunião do grupo de trabalho das leis laborais e que, também nesta terça-feira, remeteu para 2021 a aplicação da taxa de rotatividade às empresas que abusam da contratação a termo.

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A proposta do Bloco de Esquerda para estender aos trabalhadores do sector privado a dispensa até três horas para acompanhar as crianças no primeiro dia de aulas gerou, nesta terça-feira, controvérsia no Parlamento e a sua votação voltou a ser adiada. Este foi um dos temas que dominou a reunião do grupo de trabalho das leis laborais e que, também nesta terça-feira, remeteu para 2021 a aplicação da taxa de rotatividade às empresas que abusam da contratação a termo.

Respondendo ao apelo feito pelo Presidente da República e pelo próprio líder do PSD, o Bloco de Esquerda apresentou na semana passada uma proposta para acrescentar no artigo 249.º do Código do Trabalho uma nova alínea, prevendo que é falta justificada “a motivada por acompanhamento de menor de 12 anos no primeiro dia do ano lectivo, até três horas por cada menor”.

Na reunião do grupo de trabalho para as leis laborais desta terça-feira, o deputado José Soeiro insistiu em sujeitar a proposta a votação, mas PS, PSD e CDS mostraram resistência em analisá-la, questionando o seu enquadramento no processo legislativo em curso e remetendo o tema para a reunião de amanhã da comissão parlamentar do Trabalho e Segurança Social.

José Soeiro sublinhou que, com a sua proposta, o BE está a pôr em pé de igualdade os trabalhadores do público (que desde a semana passada já têm este direito consagrado) e os do privado. “O que o BE faz é dar oportunidade aos partidos de aprovar o mesmo direito para os trabalhadores do privado e achamos que devia ser votado agora”, desafiou.

O apelo não encontrou eco nas outras bancadas parlamentares, com excepção da do PCP. Do lado do PS, a deputada Wanda Guimarães reconheceu que a intenção de estender a dispensa ao sector privado “é positiva”. O problema é que “os termos em que o faz não são semelhantes aos que existem na Administração Pública”, criticou, acrescentando que no sector público a dispensa está dependente da organização dos serviços e a proposta do BE não refere esta necessidade de articulação dentro das empresas. “Há um automatismo na iniciativa do BE que não podemos acompanhar”, frisou, reconhecendo que também tem dúvidas se a proposta pode ser votada no grupo de trabalho.

Clara Marques Mendes, deputada do PSD e coordenadora do grupo de trabalho, também levantou dúvidas sobre a admissão da proposta do BE e acabou por sugerir que isso fosse discutido na reunião da comissão parlamentar marcada para esta quarta-feira. A deputada evitou, contudo, adiantar qual será a posição do PSD em relação ao assunto, tendo-se escusado a responder às provocações de José Soeiro que citou a publicação de Rui Rio no Twitter a defender que a dispensa devia ser alargada ao privado (e onde se manifestou contra a dispensa de um dia, pronunciando-se sobre uma proposta que não existe). Ou quando, depois de ler o tweet do líder do PSD a dizer que ia propor dispensa de duas horas no privado, deixou a provocação: “Até pensei que o PSD ia propor, mas como não o fez avançámos nós”.

Mas a troca de palavras mais violenta aconteceu com o CDS. Visivelmente impaciente, o deputado centrista António Carlos Monteiro considerou que a proposta do BE “é uma iniciativa nova e deveria ser objecto de um projecto de decreto-lei”, não tendo lugar no actual processo de alteração à lei laboral. O que o BE está a fazer, acusou, “é um bypass do processo legislativo normal, é uma golpada e o CDS não entra em golpadas”, acusou, recusando-se a analisar o “mérito” da proposta e a anunciar que votaria contra.

Pelo meio houve troca de qualificativos, com Monteiro a considerar Soeiro “populista e demagogo” e o deputado do BE a acusar o do CDS de ser “mentiroso”.

Pondo água na fervura, Wanda Guimarães voltou a dizer que a intenção o BE “é louvável” e o “conteúdo merece ser analisado”, pedindo que o assunto fosse retomado na quarta-feira.

José Soeiro acabou por aceitar. Mostrando-se disponível para melhorar a proposta e para encontrar uma redacção aceitável para o PS e até para o PSD, o deputado do BE lembrou que a lei já determina que o trabalhador deve comunicar ao empregador a ausência sempre que seja previsível (numa resposta às dúvidas do PS). “O importante é que se estenda este direito aos trabalhadores do privado”, concluiu.

Rita Rato, deputada do PCP foi a única que se perfilou ao lado do BE, avisando que se a dispensa não for aprovada agora já não irá a tempo do próximo ano lectivo.