Como acabar com o shutdown se ninguém deseja um compromisso?

Quase três semanas depois do encerramento de várias agências e departamentos públicos, o fosso entre a Casa Branca e o Partido Democrata só dá sinais de se alargar.

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Donald Trump visita a fronteira com o México na quinta-feira Reuters/JIM YOUNG

A luta política à volta da construção de um muro na fronteira dos EUA com o México foi transformada nas últimas semanas numa batalha entre o Bem e o Mal, com o Partido Democrata a dizer que a promessa de Donald Trump é "uma imoralidade" e o Presidente norte-americano a descrever a situação na fronteira como "uma crise do coração e uma crise da alma" durante a sua declaração ao país, na noite de terça-feira, a partir da Sala Oval da Casa Branca.

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A luta política à volta da construção de um muro na fronteira dos EUA com o México foi transformada nas últimas semanas numa batalha entre o Bem e o Mal, com o Partido Democrata a dizer que a promessa de Donald Trump é "uma imoralidade" e o Presidente norte-americano a descrever a situação na fronteira como "uma crise do coração e uma crise da alma" durante a sua declaração ao país, na noite de terça-feira, a partir da Sala Oval da Casa Branca.

Mas por trás dessa luta estão outras duas batalhas, mais vastas, que impedem a aproximação entre os dois lados: há anos que o Congresso não consegue aprovar uma reforma abrangente das leis de imigração e da segurança na fronteira; e um acordo para que isso aconteça nesta altura, através de um diálogo com concessões de ambas as partes, não é o que a base de apoio de Donald Trump procurou quando lhe deu a vitória nas eleições de 2016.

A dimensão do fosso que separa a Casa Branca e o Partido Republicano do Partido Democrata ficou patente na reacção do senador republicano Lindsey Graham após a declaração de Donald Trump na terça-feira: "Se abandonarmos o Presidente, será o fim da sua presidência e o fim do nosso partido, e nesse caso, merecemos ser castigados."

Do outro lado, quase à mesma hora, as maiores figuras do Partido Democrata no Congresso norte-americano surgiam na televisão com uma mensagem igualmente dramática: "Nós não governamos por birras. Nenhum Presidente deve poder dar um murro na mesa e exigir que se faça o que ele quer ou então o governo é encerrado e milhões de americanos são tratados como uma alavanca", disse o líder da minoria do Partido Democrata no Senado, Chuck Schumer.

No meio desta luta estão 800 mil funcionários de várias agências e departamentos públicos norte-americanos, que começaram a ser enviados para casa ou obrigados a trabalhar sem salário a partir do dia 22 de Dezembro. Este encerramento parcial do governo (conhecido como shutdown), é já o segundo mais longo de sempre no país e, se nada mudar até sábado, subirá para o topo dessa lista.

Depois da dramatização das últimas semanas — que prossegue na quinta-feira com a visita de Trump à fronteira com o México —, é cada vez mais difícil perceber o que será considerado aceitável por cada uma das partes para que o impasse termine.

Se o Presidente aceitar a proposta do Partido Democrata de desbloquear o orçamento para as agências em causa e continuar a debater o reforço da segurança na fronteira, poderá perder o apoio da sua base; se o Partido Democrata aprovar uma solução que inclua os 5,7 mil milhões de dólares que Trump pede para começar a construir o muro, terá dificuldades em explicar aos seus eleitores como é que uma promessa "imoral" passou a ser aceitável numa questão de dias ou semanas.

"Os democratas na Câmara dos Representantes não vão dar a Trump o dinheiro para o muro a menos que possam dizer aos seus eleitores que também ganharam alguma coisa", escreveu o Wall Street Journal num editorial em que defende uma solução proposta pelo senador Lindsey Graham: o Partido Democrata aprova o orçamento para o muro, e o Presidente Trump e o Partido Republicano aceitam legalizar a situação dos "dreamers" — os cerca de 800 mil adultos que chegaram aos EUA quando eram crianças e que viram o seu futuro em risco quando o Presidente Trump pôs fim ao programa provisório que lhes permitia continuar a viver, a estudar e a trabalhar no país.

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"Trump seria criticado por uma parte da direita, para quem qualquer legalização é uma 'amnistia'. Mas essas vozes são as mesmas que o criticam por não conseguir verbas para o muro, e não é possível ter as duas coisas", diz o editorial do jornal norte-americano.

Uma proposta deste tipo, que daria luz verde à construção do muro, também seria criticada por muitos eleitores do Partido Democrata. Mas, nesse caso, os líderes do partido "teriam de explicar aos 'dreamers' e às suas famílias porque é que preferem negar a Trump uma meia vitória em vez de melhorar a vida de centenas de milhares de jovens adultos ansiosos".

O problema para o Presidente Trump é que nem mesmo uma solução deste tipo garante que a sua base de apoio mais radical se mantém unida para a reeleição em 2020.

Esta semana, a colunista ultraconservadora Ann Coulter deixou bem claro, no Twitter, que o compromisso não é uma arma apreciada no seu meio: "Os 'dreamers' devem ser deportados antes dos imigrantes ilegais criminosos. Pelo menos os criminosos não nos exigem que os deixemos violar a lei."