Venha o vinho do Porto vintage em garrafinhas pequenas, prontas para beber, sem necessidade de mais explicações e misticismos

O vinho do Porto vintage está a passar por um mau bocado, não obstante a qualidade ser cada vez melhor.

Foto
dr

A entrevista com Paul Symington, feita por Manuel Carvalho e Pedro Garcias aqui no PÚBLICO, é capaz de ser a mais interessante que já li no mundo dos vinhos.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

A entrevista com Paul Symington, feita por Manuel Carvalho e Pedro Garcias aqui no PÚBLICO, é capaz de ser a mais interessante que já li no mundo dos vinhos.

Ele escolhe o Porto vintage como o vinho do Porto de que mais gosta, até porque cada ano é diferente dos outros, conforme o ano em que se bebe.

Ora o vinho do Porto vintage está a passar por um mau bocado, não obstante a qualidade ser cada vez melhor.

Diz-se que é por ser doce (é difícil beber mais do que dois cálices). Mas os outros grandes vinhos fortificados - os de Jerez - são secos e não é por isso que se vendem pouco. Aliás no Jerez os vinhos que se estão a vender melhor são aqueles que não são fortificados com aguardente, são datados conforme a colheita e têm indicação da vinha de onde provêm.

Como apreciador e consumidor de Porto vintage tenho as minhas opiniões. A coisa que mais me desencoraja não é o preço mas o desperdício. O vinho do Porto vintage perde rapidamente a qualidade depois de ser aberto. Idealmente abre-se uma garrafa quando se juntam dez ou doze amigos. Mas quem é que se dá à canseira de juntar doze amigos só porque quer provar um vinho do Porto?

A solução para este problema é o sistema Coravin que custa 200 euros e mantém o vinho. Porque é que não se arranja maneira de oferecer o Coravin a quem compra Porto vintage? A partir do momento em que se tem o aparelho bastará oferecer uma botija com cada garrafa.

Também se poderia oferecer uma garrafa mais pequena com a respectiva rolha para se poder reengarrafar o vinho sem prejudicá-lo.

Felizmente as casas de vinho do Porto têm progredido muito no que toca a oferecer meias-garrafas de Porto vintage. No entanto, isso não resolve o problema do desperdício.

É sabido que o vinho envelhece melhor (e menos) em garrafas de litro e meio (magnums). Não sei como é que o envelhecimento do vinho do Porto vintage ocorre em meias-garrafas. Presumivelmente envelhece depressa de mais, não sei.

Para contrariar o declínio do Porto vintage é preciso pensar no consumidor. Vou pensar em mim. Há milhares de vezes em que me apetece beber um Porto vintage - mas não bebo para não estragar o resto da garrafa, que é quase tudo.

Não tenho Coravin nem gosto de reengarrafar. Não tenho paciência. Sou preguiçoso. Também não tenho paciência para investimentos. Não quero comprar barato e esperar décadas para o vinho melhorar.
O consumidor de hoje quer comprar vinho do Porto vintage quando ele estiver melhor, pronto para beber.
Haja para os coleccionadores e pacientes garrafas inteiras de Porto vintage. Mas para os outros consumidores - que não compram Porto vintage - é preciso mudar de estratégia.

Olhemos para o mercado das águas-de-colónia e dos perfumes, nomeadamente para a casa Chanel. O vinho do Porto vintage deveria vender-se em frascos muito bonitos de 50, 75 e 100 mililitros: o suficiente para duas pessoas gulosas. 

Atendendo ao mundo dos cognacs, o vinho do Porto vintage deveria vender-se em frascos pequenos quando estivesse pronto para beber: ou antecipadamente jovem ou deliciosamente a caminho ou, na versão mais cara, no seu melhor. Poderia haver três versões: young, mature e perfect.

É de manter a sobriedade na apresentação dos Portos vintage, tal como acontece com a marca Chanel. Só o nome do vinho é que muda: o ano da colheita vintage. Deveria juntar-se informação rigorosa sobre a colheita, o clima e outros acontecimentos do ano.

Acabar-se-ia assim com o desperdício, a consciência pesada (de um Porto vintage ainda não estar “pronto” como se não estivesse delicioso vários anos antes) e com os muitos preconceitos que acompanham a degustação.

A sugerir uma grande alteração diria que é um erro vender o Porto vintage en primeur: são as casas que devem colher e distribuir os benefícios de cada colheita. É nas casas que o consumidor quer (e deve) confiar.

O Porto vintage tem de ser um prazer fácil e divertido. Não em vez do prazer que já é - mas paralelamente, para aqueles que nunca beberam e não sabem o que perdem.