Linha do Algarve: Falta de manobradores deixou comboios trancados na oficina

Vinte anos depois da separação da roda (CP) do carril (IP) ainda persistem problemas entre o gestor da infraestrutura e o operador CP.

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Episódio afectou a circulação na linha do Algarve. Nuno Ferreira Santos

A CP e a IP (Infraestruturas de Portugal) nem sempre se dão bem. Esta é a história de dois comboios que foram suprimidos no Algarve, não devido à habitual falta de material circulante, mas porque não havia manobrador para retirar as automotoras das oficinas. Uma tarefa que estava a cargo da IP, mas que entretanto passou para a responsabilidade da CP.

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A CP e a IP (Infraestruturas de Portugal) nem sempre se dão bem. Esta é a história de dois comboios que foram suprimidos no Algarve, não devido à habitual falta de material circulante, mas porque não havia manobrador para retirar as automotoras das oficinas. Uma tarefa que estava a cargo da IP, mas que entretanto passou para a responsabilidade da CP.

O caso ocorreu em 21 de Agosto, mas desde Setembro que o PÚBLICO tem aguardado respostas da IP e da CP acerca da supressão de dois comboios naquele dia entre Vila Real de Sto. António e Faro. A primeira respondeu, a segunda nunca o fez.

O comboio 5710, que deveria sair de Vila Real às 12h39, estava nas oficinas da estação, mas não pode partir porque faltou o manobrador para fazer as agulhas e acompanhar a manobra da automotora até à linha geral. Por esse motivo, a CP mandou suprimir o comboio e alugou um autocarro para transportar os passageiros entre Vila Real de Sto. António e Faro e outro para fazer o serviço entre Tavira e Faro, além de um táxi para transportar directamente seis passageiros para Faro a fim de não perderem o Intercidades para Lisboa.

Como a mesma composição que ia para a capital do Algarve deveria regressar a Vila Real às 13h55, também este comboio foi suprimido, tendo a CP alugado dois autocarros – um para fazer Faro – Vila Real e outro Faro – Tavira.

Questionada pela PÚBLICO, a IP explicou que “o serviço em questão, resguardo de material é da responsabilidade do operador ferroviário, sem prejuízo do mesmo serviço ter sido excepcionalmente prestado pela IP até ao fim de Julho de 2018. A IP informou atempadamente a CP que este serviço deixaria de ser prestado pela IP, devendo o operador ferroviário assegurar o referido serviço”.

A CP não respondeu ao PÚBLICO, mas, segundo José Reizinho, da Comissão de Trabalhadores daquela empresa, o que se passou foi que a IP deixou de ter manobradores e recusou-se a fazer um serviço que a CP também não queria assegurar. O resultado foi este braço de ferro que acabou com comboios suprimidos e a CP a ter que destacar pessoal seu para Vila Real de Sto. António a fim de fazer as manobras aos seus comboios.

Aquando da criação da Refer (que precedeu a Infraestruturas de Portugal), os serviços de manobras ficaram a cargo do gestor da infraestrutura. Os manobradores são os ferroviários que operam manualmente as agulhas para fazer o caminho para os comboios e dão indicações ao maquinista sobre como e quando devem avançar ou recuar.

Antigamente, antes da separação da exploração e da gestão da infraestrutura, este problema não existia pois as estações tinham sempre manobradores disponíveis para estas tarefas.

Como a IP foi ficando sem estes profissionais, passou a considerar que deveria ser a CP a assegurar este serviço aos seus comboios, tal como, aliás, acontece com a Medway (antiga CP Carga) e Takargo que têm os seus próprios profissionais para fazer a manobra.

A CP teve, assim, que destacar pessoal seu para Vila Real de Sto. António. E em Vilar Formoso, onde todas as madrugadas é preciso manobrar a locomotiva portuguesa que é desatrelada do Sud Expresso para dar lugar à locomotiva espanhola, a CP passou a enviar desde a Guarda um homem para fazer aquela operação porque a IP deixou de assegurar esse serviço naquela estação fronteiriça.

Para José Reizinho, o facto de ser agora a CP a fazer as manobras com o seu próprio pessoal acaba por corrigir um erro congénito. “Quando foi criada a Refer a partir da CP, a formação de comboios e as manobras deveriam ter ficado logo com a exploração e não com o gestor da infraestrutura. A CP é que sabe de comboios.”, disse ao PÚBLICO. 

Mas o problema é que as duas empresas estão a ficar sem este tipo de profissionais. O representante dos trabalhadores diz que “a Refer [agora Infraestruturas de Portugal], com as sucessivas reduções de pessoal, está a ficar sem manobradores e vai-se descartando dessas funções, com a agravante de que a própria CP também não tem pessoal para fazer as manobras”.