Bloco sozinho na defesa de tribunais exclusivos para violência doméstica — que podem ser inconstitucionais

Pacote de reforço do combate ao fenómeno da violência doméstica foi discutido na Comissão de Assuntos Constitucionais.

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Adriano Miranda

O Bloco de Esquerda foi praticamente cilindrado na apreciação que os restantes partidos fizeram da sua proposta para a criação de juízos exclusivos para julgar a violência doméstica. A principal crítica é a possibilidade de a proposta ser inconstitucional, aviso que é partilhado pelo Conselho Superior da Magistratura (CSM) no parecer que elaborou sobre o projecto de lei bloquista.

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O Bloco de Esquerda foi praticamente cilindrado na apreciação que os restantes partidos fizeram da sua proposta para a criação de juízos exclusivos para julgar a violência doméstica. A principal crítica é a possibilidade de a proposta ser inconstitucional, aviso que é partilhado pelo Conselho Superior da Magistratura (CSM) no parecer que elaborou sobre o projecto de lei bloquista.

A questão é que a Constituição proíbe a “existência de tribunais com competência exclusiva para o julgamento de certas categorias de crimes” — com excepção dos tribunais militares. E foi a esse argumento que os partidos se agarraram, embora todos se tenham manifestado preocupados com a quantidade de crimes de violência doméstica e a repercussão que têm na sociedade, nas famílias e nas crianças. Houve até quem, entre os deputados, tenha lembrado que a existência de tribunais dedicados a alguns tipos de crimes era uma política do Estado Novo.

O parecer do CSM também vai no mesmo sentido de alertar para a violação da Constituição e considera que “o necessário combate à violência doméstica melhor passará pelo incremento da formação dos magistrados judiciais, do que pela formalização de tribunais especializados”. O CSM também tem dúvidas sobre a aglutinação num tribunal de competências díspares sobre o tipo de crime (violência doméstica) e a regulação das responsabilidades parentais (que estão nos tribunais de família e menores) que apenas têm em comum a existência de violência doméstica. E diz que o regime proposto pelo Bloco “deixa de fora outro tipo de processos, tutelares cíveis e de crianças e jovens em perigo, que poderão também ter subjacente um quadro de violência doméstica”.

Quando o PÚBLICO noticiou a iniciativa do Bloco, tanto o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público como a Associação Sindical dos Juízes Portugueses mostraram dúvidas sobre a pertinência destes juízos. Nem a Ordem dos Advogados nem o Conselho Superior do Ministério Público responderam ao pedido de parecer do Parlamento.

A proposta do Bloco pressupõe duas experiências-piloto nas comarcas de Braga e Setúbal — as que têm um maior rácio de casos no país — e os juízes e funcionários teriam que ter formação específica e especializada na temática da violência doméstica. Estes juízos assumiriam igualmente os processos de regulação do poder paternal em que estivesse também em causa a violência doméstica. Ora esta necessidade de maior formação foi a única questão que mereceu o aplauso dos deputados do PSD, PS e PCP — o CDS remeteu a sua opinião para a discussão em plenário que está marcada para dia 26. O PSD foi tão crítico que até apelou ao Bloco para a retirar da agenda, mas a deputada Sandra Cunha não quis desistir.

Penas mais pesadas

Neste pacote de reforço do combate ao fenómeno da violência doméstica discutido na quarta-feira na Comissão de Assuntos Constitucionais, os bloquistas ouviram também críticas à sua opção de aumentar a moldura penal, no seus limites mínimo e máximo, para este crime. Os partidos preferem apostar na prevenção, considerando que não é por se aumentar um ou dois anos em algumas tipologias deste crime que se irá ajudar a dissuadir os agressores.

Outra proposta do Bloco prevê alterações ao Código de Processo Penal para que seja possível a aplicação de prisão preventiva a crimes de violência doméstica, e para que deixe de se poder recorrer, nos processos por este tipo de crime, à figura da suspensão provisória de processo. Seria a forma de contrariar o “sentimento de impunidade” e a visão de que se trata de um “crime menor”, já que há um recurso exagerado à suspensão da pena: em 75% dos processos de abuso sexual os autores foram condenados com pena suspensa e em 1390 casos só 95 cumpriram pena de prisão efectiva.