Avaliação dos alunos: directores não vão cumprir orientações do ministério

Em causa está uma nota informativa enviadas às escolas pelo ministério e que altera o que se encontra estabelecido na lei sobre a forma e as condições em que os conselhos de turma se devem reunir para atribuir as notas aos alunos. Directores dizem que é "urgente" haver um sinal positivo por parte do Governo.

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Filinto Lima Paulo Pimenta

Cerca de 40 directores de agrupamentos de escolas do Norte e Centro do país decidiram, nesta quarta-feira, que só irão “ratificar as deliberações tomadas pelos conselhos de turma que estejam constituídos de acordo com a lei”, o que significa, na prática, que não cumprirão as instruções enviadas pelo Ministério da Educação (ME) para as escolas, disse ao PÚBLICO o presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas, Filinto Lima, que esteve presente no encontro.

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Cerca de 40 directores de agrupamentos de escolas do Norte e Centro do país decidiram, nesta quarta-feira, que só irão “ratificar as deliberações tomadas pelos conselhos de turma que estejam constituídos de acordo com a lei”, o que significa, na prática, que não cumprirão as instruções enviadas pelo Ministério da Educação (ME) para as escolas, disse ao PÚBLICO o presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas, Filinto Lima, que esteve presente no encontro.

Em algumas escolas as instruções da tutela estarão a ser cumpridas. Mas, pelo menos os directores que estiveram reunidos nesta quarta-feira, "vão cumprir o que está na lei e não vão cometer qualquer ilegalidade", diz Filinto Lima. E o que a portaria n.º 243/2012 determina é o seguinte: “Para efeitos de avaliação dos alunos, o conselho de turma é constituído por todos os professores da turma”; “sempre que se verificar ausência imprevista de um membro do conselho de turma, a reunião é adiada, no máximo por quarenta e oito horas, de forma a assegurar a presença de todos"; “a deliberação final quanto à classificação a atribuir em cada disciplina é da competência do conselho de turma que, para o efeito, aprecia a proposta apresentada por cada professor, as informações que a suportam e a situação global do aluno”; “as deliberações do conselho de turma devem resultar do consenso dos professores que o integram, admitindo-se o recurso ao sistema de votação, quando se verificar a impossibilidade de obtenção desse consenso”.

Para fazer face às greves dos professores às reuniões dos conselhos de turma, que estão a decorrer desde 4 de Junho, por iniciativa do novo Sindicato de Todos os Professores (Stop), o Ministério da Educação, através da Direcção-Geral dos Estabelecimentos Escolares (Dgeste) enviou, nesta segunda-feira, uma nota informativa às escolas que diz o seguinte: "Quando não se realize uma reunião do conselho de turma para efeitos de avaliação por motivo de ausência de um ou mais professores, a segunda reunião deve ser convocada" para "o dia seguinte". Se nessa segunda reunião "ainda não estiverem todos os professores presentes" deve ser marcada nova para, uma vez mais, "o dia seguinte". "Para a terceira reunião, o director de turma (ou quem o substitua) deve recolher antecipadamente todos os elementos referentes à avaliação de cada aluno fornecidos por todos os professores". O que significa que as notas poderão ser lançadas sem terem sido ponderadas pela totalidade do conselho de turma.

Esta possibilidade está prevista na legislação mas apenas no caso em que "a ausência de um dos membros do conselho de turma" seja "superior a 48 horas”. Este é o prazo estabelecido (48 horas) para se convocar uma nova reunião caso haja um professor que falte à reunião do conselho, como tem vindo a acontecer devido às greves às avaliações. Só que nesta greve as ausências são rotativas, ou seja, o docente que faltou inicialmente estará presente na reunião seguinte.

Na nota informativa da Dgeste também se determina que o prazo para convocar nova reunião é de 24 horas, quando a lei é clara ao estabelecer que este período é de 48 horas. Nesta terça-feira, o secretário de Estado da Educação, João Costa, indicou em declarações aos jornalistas que as orientações enviadas às escolas sobre as avaliações dos alunos são apenas esclarecimentos dos normativos em vigor e não uma medida extraordinária face à greve dos professores.

Em resposta ao PÚBLICO, o ministério acrescenta que a nota da Dgeste é um "esclarecimento solicitado por vários directores, que explicita os procedimentos que são adoptados em qualquer contexto de impossibilidade de realização regular dos conselhos de turma." 

Nas respostas enviadas por email, o ME indica ainda que "tem vindo a responder aos pedidos de informação que as direcções têm dirigido, afirmando a competência dos directores para realizarem as reuniões nos tempos e modos previstos na legislação ou para adoptarem os melhores procedimentos, adequados à realidade de cada escola, para garantir que, a par do respeito pela greve, é garantido o direito à avaliação".

Directores apelam a Costa

“A nota informativa foi uma bomba que caiu nas escolas e que provocou uma enorme indignação entre os directores e professores”, comentou Filinto Lima, frisando que através deste documento o que o Ministério da Educação fez foi “desprezar um momento nobre da avaliação dos alunos, aquele que é o momento do sim ou não relativo à progressão dos estudantes”.

“Está a tirar a importância e a solenidade de que estas reuniões finais dos conselhos de turma sempre se revestiram”, corrobora o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares, Manuel Pereira, sublinhando que uma “nota informativa não se sobrepõe à lei”. 

Manuel Pereira alerta que “a situação se está a extremar todos os dias nas escolas” e que o “Governo tem de lançar pontes com urgência em vez de construir muros”.

Também Filinto Lima apela ao Governo e ao primeiro-ministro para que “dê um sinal urgente com vista ao recomeço das negociações com os sindicatos de professores” para evitar que “este final de ano lectivo se torne ainda mais caótico”.

O que não deve, acrescentou, “é acicatar os ânimos como aconteceu com a nota informativa, que por certo vai levar mais professores a aderirem” ao novo ciclo de greves às avaliações, que se inicia nesta segunda-feira, marcado pelas duas federações sindicais de professores e que tem a adesão de todos os outros sindicatos.

Perguntas por escrito

Mas nesta quinta-feira os ânimos não foram apaziguados. Os sindicatos deslocaram-se ao Ministério da Educação para uma nova ronda de negociações sobre a organização do próximo ano lectivo e, como já tinham anunciado, pretendiam abordar os problemas criados pela nota da Dgeste. Queriam ainda falar, uma vez mais, sobre a recuperação do tempo de serviço prestado durante o congelamento das carreiras, que está no centro do conflito.

Só que, ao contrário do que aconteceu na última ronda realizada na passada semana, o secretário de Estado da Educação, João Costa, não compareceu nas reuniões e nenhum outro governante o substituiu.

“Pensámos que hoje podia existir algum sinal por parte do ministério. Mas nada. O que me leva a pensar que o ministério ainda não percebeu o que está a acontecer nas escolas”, comentou o líder da Federação Nacional de Professores (Fenprof), Mário Nogueira, à saída da reunião.

Apesar da ausência de governantes, a Fenprof quis saber se já existiam respostas às perguntas que colocaram na ronda da semana passada: se o Governo está disponível para abrir novas negociações sobre o tempo de serviço e que entendimento poderão os sindicatos fazer do que António Costa disse no Parlamento sobre o pagamento, em 2019, de dois anos, nove meses e 18 dias dos mais de nove que os professores exigem que sejam contabilizados.

“Disseram-nos que não compete ao Ministério da Educação comentar as afirmações do primeiro-ministro e que se queremos respostas, então que apresentemos perguntas por escrito”, adiantou Nogueira.

Notas condicionadas

Na próxima segunda-feira, dia 18, começa a temporada de exames nacionais. Por determinação do ME, e à semelhança do que já tinha acontecido em 2013 quando se realizou uma greve similar, os alunos poderão ir a exame sem terem ainda a nota final dada pelos professores.

Na sequência das greves que decorreram desde 4 de Junho serão muitos os estudantes nesta situação, prevê Filinto Lima, adiantando que no seu agrupamento vai acontecer com todos os do 9.º ano (não tem secundário) uma vez que não se realizou ainda qualquer reunião de avaliação.

Entretanto, em declarações ao PÚBLICO, a presidente do Sindicato Independente de Professores e Educadores (SIPE), Júlia Azevedo, indicou que hoje será entregue um pré-aviso de greve para estender as paralisações até 19 de Julho, afectando assim, sobretudo, as reuniões que não se conseguirem realizar este mês. Até agora a greve marcada pelas duas federações sindicais de docentes e apoiada pelos outros sindicatos, que se iniciará no dia 18, tinha como limite 29 de Junho.

Caso a nota do ministério seja acatada por muitos directores, o SIPE está a ponderar apresentar queixa junto da Organização Internacional de Trabalho por “boicote declarado ao direito à greve”, que está consignado na Constituição.

Por seu lado, o Sindicato de Todos os Professores deixou nesta quinta-feira uma proposta no ME no sentido de que no Orçamento de Estado para 2019 se concretize um "compromisso público", assumido pelo Governo, "para o pagamento da dívida que tem para com os professores no que se refere à contagem do tempo de serviço 'congelado' de nove anos, quatro meses e dois dias".  Essa concretização, precisa o Stop, deverá ser feita "com a explicitação do calendário de pagamento proposto pelo ME/ Governo (objecto de negociação".

Na lei do Orçamento de Estado para 2018 já está prevista que a recuperação do tempo de serviço será feita. Mas até agora, o Governo só se disponibilizou a contabilizar dois anos, nove meses e 18 dias do tempo de serviço congelado.