O “Hygge” do Oeste

Aqui, no Oeste, os dias enevoados e frios não dão um bronze digno de 50 "hashtags" inspiracionais no Pinterest ou um "post" de "like" fácil no Facebook. Esqueçam, nem com filtros

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João Ferreira Oliveira/Arquivo

Muitas vezes me queixo, lamento e lamurio sobre o tempo que faz pelo Oeste. Que faz frio, que está sempre encoberto, o raio da chuva morrinha e aquele nevoeiro crónico do fim do dia. É verdade, há dias em que não se ganha para a neura. O Oeste não é para gente fraquinha dos nervos, acreditem. Mas o que eu nunca disse é que por aqui, pelo Oeste, talvez à conta deste tempo, há um espírito diferente.

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Muitas vezes me queixo, lamento e lamurio sobre o tempo que faz pelo Oeste. Que faz frio, que está sempre encoberto, o raio da chuva morrinha e aquele nevoeiro crónico do fim do dia. É verdade, há dias em que não se ganha para a neura. O Oeste não é para gente fraquinha dos nervos, acreditem. Mas o que eu nunca disse é que por aqui, pelo Oeste, talvez à conta deste tempo, há um espírito diferente.

Aqui aprendemos a ver o há que de bonito no cinzento sensaborão. A ver um lado bom numa coisa da qual toda a gente foge a sete pés, de preferência rumo ao Algarve. Onde está quentinho, onde a água não faz reumatismo e as pessoas estão descascadas e sorridentes. Aqui, no Oeste, os dias enevoados e frios não dão um bronze digno de 50 hashtags inspiracionais no Pinterest ou um post de like fácil no Facebook. Esqueçam, nem com filtros. Nada dessa coisa do pôr-do-sol fofinho, porque nunca se sabe quando acontece: é preciso que não se levante a névoa do lado do mar e isso, bem sabemos nós, os do Oeste, pode ser uma raridade sem data anunciada. Por aqui, as redes sociais não vingam muito. O que esses dias, mais ou menos cinzentos, com mais ou menos humidade nos ossos, nos dão não se publica, guarda-se. É a areia muito fria nos pés, o cheiro a maresia que quase se apanha com a mão, a cor de chumbo quase, quase azul, o baço dos sons que não saem de ao pé de nós por lhes faltar a claridade dos dias para chegarem mais longe. É o conforto do tal casaquinho que se leva sempre no banco de trás porque já sabemos que vai estar frio. Mas não faz mal. É um frio que já conhecemos, a gente perdoa-lhe, faz parte desta coisa de nos sentirmos em casa.

Agora anda para aí uma onda a falar do Hygge dinamarquês, que é uma espécie de pedra filosofal da felicidade que eles lá têm. Mas é fraquito. Pode estar muito na moda e dar muitas fotografias de gente em camisolão e peúgas, a beber coisas quentes à lareira, mas não chega aos calcanhares do "Hygge do Oeste". Até porque a comida por lá não é grande coisa e aquilo é gente que dá pouca conversa à mesa. E, convenhamos, ninguém consegue ser feliz sem conversa e a comer mal.

No Oeste é que é. Onde se dá valor àquelas míseras horas de sol, que se não vierem paciência, não é por isso que a gente se chateia. Amanhã vai estar melhor. Onde tudo passa depois do meio-dia e se não passar, amanhã vai estar melhor. É este o espírito do Oeste. Onde até dá para andar de bicicleta. Desde que se leve um casaquinho, claro. E sim, amanhã, já se sabe: vai ser melhor.