É o bicho, é o bicho

Ao fazer tanta questão de explicar as origens de Alien, Ridley Scott corre o risco de matar a rainha dos ovos da morte.

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Há cinco anos, Ridley Scott dizia a quem o quisesse ouvir que Prometheus (2012) não era bem a “prequela” de Alien, o Oitavo Passageiro (1979) que o pessoal queria. Ninguém acreditou, claro, mesmo que de facto esse filme parecesse interessar-se mais pelas questões metafísicas subjacentes ao porquê da existência do bicho de sangue ácido do que propriamente pela explicação da ligação entre a nave de exploração Prometheus à luta de Ripley a bordo da Nostromo.

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Há cinco anos, Ridley Scott dizia a quem o quisesse ouvir que Prometheus (2012) não era bem a “prequela” de Alien, o Oitavo Passageiro (1979) que o pessoal queria. Ninguém acreditou, claro, mesmo que de facto esse filme parecesse interessar-se mais pelas questões metafísicas subjacentes ao porquê da existência do bicho de sangue ácido do que propriamente pela explicação da ligação entre a nave de exploração Prometheus à luta de Ripley a bordo da Nostromo.

Scott mudou de conversa entretanto, explicando que Prometheus era o primeiro filme de uma nova “trilogia” que explicaria de onde vinha o monstro indestrutível e faria a ponte com o Alien original. Meu dito, meu feito — Alien: Covenant é em parte uma sequela directa de Prometheus e em parte uma prequela directa de Alien, uma espécie de “ponte” entre a metafísica envergonhada de um e a mecânica do suspense/terror do outro, mas que o faz reproduzindo, sem pingo de vergonha na cara, o Alien original. A saber: olha uma tripulação acordada, olha um planeta estranho, olha uma expedição ao planeta, olha um ovo, ai ai ai ai um monstro, é o bicho, é o bicho. Não falta uma mulher de armas que não dá descanso ao bicho — aqui Katherine Waterston, muito bem num papel sem grande margem de manobra —, nem um robô com segundas intenções — Michael Fassbender, outra vez, num duplo papel.

O que é verdadeiramente irritante, em Alien: Covenant, não é percebermos outra vez a evidência de que Scott é um construtor de mundos visuais sem paralelo que só a espaços acerta na narrativa. Nem que o que começou como uma série B modelar na sua exploração do medo se tornou num franchise de variações sobre o tema. O que é mesmo irritante é que Scott sinta esta necessidade de voltar atrás e explicar como é que chegámos ao ponto A, de preencher os “buracos” na história da criatura, de unir todos os pontos.

O que tornava o Alien original tão poderoso era o medo em estado puro de não saber o que era aquilo que estava à solta na Nostromo. O que era mais interessante em Prometheus (e continua a sê-lo em Covenant) era o prolongamento desse medo para uma curiosidade metafísica sobre o universo e a criação da vida.

Ao querer à viva força passar de um para o outro, e meter o Rossio na rua da Betesga, Scott — um maximalista para quem todos os pormenores são essenciais — parece não estar a levar em conta que “a curiosidade matou o gato” ou que “o que é de mais cheira mal”. Não é que Covenant seja mau (não é) ou desinteressante (também não); é só um estágio inútil na evolução do bicho, que ao explicar como passámos da lama negra primordial de Prometheus à rainha dos ovos da morte de Alien (& sequelas) desvenda mistérios que melhor faria em deixar por resolver. E, no processo, deixa o espectador com aquela sensação de que nenhuma explicação alguma vez estará à altura do momento em que o bicho salta da barriga de John Hurt. Porquê, então, insistir?

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