Caldo entornado na cerimónia de entrega do Prémio Camões em São Paulo

O vencedor do Prémio Camões, Raduan Nassar, fez discurso crítico contra o Governo de Michel Temer. O ministro da Cultura subiu ao palanque e a cerimónia transformou-se num aceso debate.

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Radau Nassar foi o vencedor deste ano do Prémio Camões Flavio Florido/Folhapress/Arquivo

A cerimónia de entrega do Prémio Camões ao escritor Raduan Nassar, em São Paulo, foi tudo menos pacífica. Depois de o vencedor do galardão ter realizado um discurso duro e crítico contra o Governo brasileiro, o ministro da Cultura do Brasil, Roberto Freire, subiu ao palanque e resolveu defender a honra do Presidente Michel Temer. E o caldo entornou-se.

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A cerimónia de entrega do Prémio Camões ao escritor Raduan Nassar, em São Paulo, foi tudo menos pacífica. Depois de o vencedor do galardão ter realizado um discurso duro e crítico contra o Governo brasileiro, o ministro da Cultura do Brasil, Roberto Freire, subiu ao palanque e resolveu defender a honra do Presidente Michel Temer. E o caldo entornou-se.

Nassar afirmou que os brasileiros vivem “tempos sombrios” e que o actual Governo é “repressor”, criticando também a nomeação de Alexandre de Moraes para o Supremo Tribunal Federal, acusando-o de ter um “currículo amplo de violência”, cita o Globo. O tema sobre o Supremo brasileiro iniciou-se depois de o juiz Teori Zavascki, que era também o relator da Operação Lava-Jatoter morrido quando o avião em que seguia se ter despenhado no mar de Paraty, a 250 quilómetros do Rio de Janeiro. Coube então ao Presidente nomear o substituto no Supremo, escolhendo o ministro da Justiça do seu Governo, Alexandre de Moraes.

Mas as críticas não se ficaram por aqui, e o escritor afirmou ainda que no Brasil há “violência contra a oposição democrática ao manifestar-se na rua”, referindo-se mais tarde a alguns dos temas que têm marcado a vida política de Brasília.

Seguiu-se o ministro da Cultura. E a partir daqui o público que assistia à cerimónia também teve um papel importante. Freire afirmou sentir-se “perplexo” ao ouvir um discurso de “pessoas com idade que viveram um efectivo golpe nos anos 1960”, confundirem os tempos de ditadura militar no Brasil com o período actual, lembrando as “forças armadas reprimindo, torturando, fazendo desaparecer, criando exílio para muitos dos nossos compatriotas”. “Vocês aqui presentes evidentemente são testemunhas de que não há nenhuma confusão em relação ao momento democrático que vive o Brasil”, acrescentou o ministro da Cultura. As pessoas presentes na sala começaram a apupar o governante.

No meio de interrupções e discussões acaloradas por parte do público, Freire foi respondendo aos presentes defendendo a democracia actual, exemplificando com o prémio atribuído a Raduan, “um adversário político do Governo”, e que recebeu a distinção apesar disso.

“Por isso mesmo o ministro da Cultura do Governo veio trazer o prémio e ele aceitou, e vocês estão aqui a querer impedir que nós falemos. Esse histrionismo oposicionista evidentemente tem os seus dias contados. Até porque não vai haver volta Dilma", rematou Freire enquanto o público gritava “viva Raduan” e “fora Temer”. Um dos presentes atirou: “Este é o dia de Raduan, não o seu”. O ministro respondeu: “Ele desrespeitou-nos a todos”.

“Raduan, pela sua obra, não merecia isso de vocês. Merecia, sim, o prémio que o Governo brasileiro está a dar juntamento com o Governo português”, finalizou o ministro, aqui já sob aplausos misturados com vaias.

Mais tarde, o Ministério da Cultura brasileiro divulgou uma nota em que “lamenta” a “prática do Partido dos Trabalhadores em aparelhar órgãos públicos e organizar ataques para tentar desestabilizar o processo democrático”. “Durante a cerimónia de entrega do Prémio Camões de Literatura, em São Paulo, o ministro da Cultura, Roberto Freire, teve sua fala interrompida por manifestantes partidários, sinal de desrespeito à premiação oficial dos Governos de Brasil e Portugal”, refere o comunicado.