Supremo Tribunal de Justiça manda destruir escutas de António Costa

Conversas do primeiro-ministro foram interceptadas durante investigação de corrupção passiva e auxílio à imigração ilegal em centro de vistos que funciona na embaixada de Cabo Verde.

Foto
Rui Gaudencio

O presidente do Supremo Tribunal de Justiça mandou destruir escutas ao primeiro-ministro António Costa feitas pelas autoridades no âmbito de uma investigação sobre corrupção passiva e de auxílio à imigração ilegal no centro comum de vistos de Cabo Verde, que funciona nas instalações da embaixada portuguesa naquele país.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O presidente do Supremo Tribunal de Justiça mandou destruir escutas ao primeiro-ministro António Costa feitas pelas autoridades no âmbito de uma investigação sobre corrupção passiva e de auxílio à imigração ilegal no centro comum de vistos de Cabo Verde, que funciona nas instalações da embaixada portuguesa naquele país.

"Foram interceptadas comunicações telefónicas nas quais intervém acidentalmente o primeiro-ministro", diz uma nota informativa da Procuradoria-Geral da República. Após um parecer nesse sentido emitido pelo Ministério Público, “o presidente do Supremo Tribunal de Justiça determinou a destruição imediata das intercepções telefónicas, por as considerar manifestamente estranhas ao processo e sem qualquer relevância para a investigação”. Segundo o mesmo comunicado o inquérito não tem arguidos constituídos e o antigo embaixador de Portugal em Cabo Verde Bernardo Lucena, que em Janeiro passado se tornou assessor diplomático do primeiro-ministro, “não é suspeito”, não existindo na investigação “quaisquer indícios” contra ele.

As informações da Procuradoria-Geral da República surgem depois de a revista Sábado ter publicado, numa antecipação à edição desta quarta-feira, que Bernardo Lucena "esteve prestes a ser detido em Lisboa pela Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária e o Departamento Central de Investigação e Acção Penal", por ter chegado a ser considerado "o principal suspeito" deste processo.

Como o PÚBLICO já noticiou há três meses, o alegado esquema de emissão fraudulenta de vistos de entrada em Portugal servirá de porta de entrada para outros países da União Europeia. Em Julho passado, o juiz Carlos Alexandre deslocou-se, com um procurador da República e inspectores da Polícia Judiciária portuguesa, à ilha de Santiago. Interrogaram suspeitos e fizeram buscas domiciliárias em Santa Catarina e na Cidade da Praia, tendo apreendido vários documentos durante a operação, que contou com a colaboração da Judiciária de Cabo Verde.

Aprovado pela Comissão Europeia em Dezembro de 2008, o centro comum de vistos destina-se a criar melhores condições de atendimento aos requerentes deste documento, contribuindo para o reforço do relacionamento entre cabo-verdianos e a União Europeia. O projecto foi promovido por Portugal e tem como parceiros a Bélgica e o Luxemburgo, representando também a Alemanha, Áustria, Eslovénia, Eslováquia, Estónia, Finlândia, França, Itália, Noruega, Países Baixos, República Checa, Suécia e Suíça na Cidade da Praia. A responsabilidade pela sua coordenação e gestão cabe ao encarregado da secção consular da embaixada de Portugal na Cidade da Praia.

Segundo o jornal cabo-verdiano A Naçãoo esquema envolvia também a “venda” da nacionalidade portuguesa, mediante valores que, por vezes, podiam atingir avultadas somas. “Há casos de pessoas que nasceram em Portugal e vieram ainda pequenas para Cabo Verde, mas que não conseguem tirar o bilhete de identidade ou passaporte português,  porque seus documentos foram usados por outras pessoas que se encontram em parte incerta na Europa”, explicou uma fonte anónima à publicação em Setembro passado.  "Tal como no caso dos vistos, suspeita-se que haja também no caso dos passaportes 'mãos' de altos funcionários da embaixada de Portugal", refere a mesma notícia, segundo a qual a rede criminosa em causa poderá ter ramificações noutros pontos do arquipélago. 

Numa notícia anterior, A Nação explicava que ao criarem dificuldades ou negarem vistos mesmo àqueles que têm direito a eles os funcionários do centro estariam a empurrar os cabo-verdianos para o esquema paralelo.