CGD arrisca perdas de 900 milhões no "caso La Seda"

Há precisamente dez anos, a Caixa recebeu orientações políticas para entrar numa aventura industrial luso-espanhola que se revelou um erro. Investimentos e créditos dados dentro do comportamento de risco que na época era habitual no sector. E hoje chegou a factura.

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Dossier da La Seda é um dos principais problemas que o presidente da CGD tem para resolver nos próximos meses Paulo Pimenta

A Caixa Geral de Depósitos (CGD) arrisca perder mais de 900 milhões de euros em operações empresariais montadas à volta do grupo do sector petroquímico La Seda Barcelona e articuladas politicamente entre Portugal e Espanha, um traço marcante da década passada. 

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A Caixa Geral de Depósitos (CGD) arrisca perder mais de 900 milhões de euros em operações empresariais montadas à volta do grupo do sector petroquímico La Seda Barcelona e articuladas politicamente entre Portugal e Espanha, um traço marcante da década passada. 

Este é um dos principais problemas que o presidente da CGD tem para resolver nos próximos meses e que resulta de decisões de investimento e de financiamento tomadas quando José Sócrates era primeiro-ministro e à frente do banco estavam dois socialistas: Carlos Santos Ferreira e Armando Vara, o seu vice-presidente. E não é apenas a dimensão dos prejuízos que o torna sensível. É também porque denuncia as dificuldades de muitos gestores bancários em resistir às pressões e orientações dos governantes.

É um dossier com histórias diferentes: a da espanhola La Seda (que produzia poliéster termoplástico para fabricar garrafas e outros produtos em plástico) e a das portuguesas Selenis (accionista da La Seda e fabricante de plásticos), Artlant (a fornecedora da La Seda) e Barbosa Almeida (accionista). Empresas com estratégias diferentes que se cruzaram num dado momento, entre 2006 e 2010. No meio, como pivô, esteve sempre a CGD. O banco que foi ao mesmo tempo financiador da La Seda, da Artlant, da Selenis e da Barbosa e Almeida; investidor da La Seda e da Artlant; e o promotor do projecto que iria revitalizar o complexo de Sines. 

Hoje, a La Seda, a Artlant e a Selenis, que chegou a deter 24% da empresa catalã, integram a lista dos grandes devedores da Caixa, mas estão insolventes. A La Seda pediu a protecção contra credores, a Artlant está ao abrigo de um plano especial de eevitalização (PER) e a Selenis (hoje Jupiter e do grupo Matos Gil) declarou-se falida.  

A dimensão da exposição da Caixa a este núcleo empresarial não é igual: na La Seda investiu 121,3 milhões e deu financiamentos de 75 milhões; na Artlant aplicou 25 milhões e reclama créditos de 520 milhões. E à Selenis (do grupo Matos Gil) emprestou 165 milhões. 

Uma década depois de realizar o primeiro de vários investimentos na esfera empresarial da espanhola La Seda, o banco público arrisca perdas (em dívida e capital) superiores a 900 milhões de euros, ou seja, quase 22% do esforço público (4100 milhões) de recapitalização que vai ser feito na Caixa (de 5200 milhões). 

Mas este é apenas um dos dossiers que ajuda a perceber a degradação do balanço do banco do Estado, que entre 2011 e 2015 contabilizou mais de 6000 milhões de créditos perdidos. Deste bolo, 4200 milhões resultam de empréstimos saídos da banca de investimento e da área de project finance – de onde também partiram os créditos à La Seda, à Artlant e à Selenis, parte substancial dados como perdidos ou em risco. 

O tema poderia ter ficado fechado para a CGD na última legislatura, se o executivo de Passos Coelho tivesse dotado a instituição dos capitais solicitados pela anterior gestão liderada por José de Matos. Mas não foi essa a decisão. E, hoje, a operação La Seda (com todas as suas vertentes) continua a ser, provavelmente, um grande problema para António Domingues, embora não o mais ruinoso. O que mais pesa nos números vermelhos são os mais de mil milhões que o banco emprestou a vários accionistas do BCP para, em 2007, entrarem na guerra de poder dentro da instituição concorrente. É, por isso, expectável que Domingues aproveite o fecho das contas anuais para carregar nas imparidades, levá-las a reservas e apresentar prejuízos em 2016, surgindo assim com melhores rentabilidades no ano seguinte. É o que ajuda a compreender a dimensão do plano de recapitalização estatal que propôs.  

Para além de reflectir eventuais erros de avaliação, o caso La Seda e as suas derivações expõe de forma crua os comportamentos de risco comuns a toda a banca durante a década passada. E mostra ainda as ligações intrincadas entre alguns gestores e a política, que no fundo fizeram a história da CGD entre 2000 e 2011.