Os miúdos estão na mesma

O Cheiro de Nós não passa de um Kids en français, um filme para marcar presença que nada adianta ao trabalho de Larry Clark.

Fotogaleria

Praticamente 20 anos depois do infame Kids/Miúdos (1995), ainda é possível sermos surpreendidos por Larry Clark? A julgar por O Cheiro de Nós, espécie de Kids en français, a resposta é negativa: o fotógrafo e cineasta americano limita-se a repisar os trilhos que desbravou em filmes anteriores (e nunca melhor do que em Bully/Estranhas Amizades, 2001, painel central do seu tríptico sobre a adolescência americana). Mesmo rodando em Paris e em francês com elenco, equipa e financiamentos locais, aproveitando a maior permissividade de costumes (e o estatuto de auteur maldito e marginal que os franceses tanto apreciam), Clark limitou-se a transplantar para a capital gaulesa o seu olhar simultaneamente curioso e inquietante sobre a vida secreta dos adolescentes.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Praticamente 20 anos depois do infame Kids/Miúdos (1995), ainda é possível sermos surpreendidos por Larry Clark? A julgar por O Cheiro de Nós, espécie de Kids en français, a resposta é negativa: o fotógrafo e cineasta americano limita-se a repisar os trilhos que desbravou em filmes anteriores (e nunca melhor do que em Bully/Estranhas Amizades, 2001, painel central do seu tríptico sobre a adolescência americana). Mesmo rodando em Paris e em francês com elenco, equipa e financiamentos locais, aproveitando a maior permissividade de costumes (e o estatuto de auteur maldito e marginal que os franceses tanto apreciam), Clark limitou-se a transplantar para a capital gaulesa o seu olhar simultaneamente curioso e inquietante sobre a vida secreta dos adolescentes.

Nullable object must have a value.
ARTIGO_SIMPLES

O Cheiro de Nós segue o quotidiano de um grupo de liceais burgueses e maçados, agarrados às pranchas de skate e aos telemóveis, e em particular a complicada relação emocional entre dois amigos que trabalham nas horas vagas como rent-boys. Um deles, Math, “gay só pelo dinheiro”, é uma espécie de menino de ouro gloriosamente egoísta, fútil e manipulador; o outro, JP, segue-o por amor, mesmo sabendo dos riscos que corre. Há momentos em que parece estarmos à beira de qualquer coisa de Soderberghiano (a ideia do sexo como uma transacção puramente utilitária, que Clark despoja de qualquer tipo de atracção ou desejo), ou de estarmos a resvalar para Bonello (mas sem o seu deleite estético nem a sua melancolia soturna). Mas Clark é aqui um “colagista”, menos interessado na coesão do que nos fogos de artifício espontâneos. O Cheiro de Nós resolve-se numa série de quadros, episódios mais ou menos ligados, onde belíssimos planos de cinema (porque, sim, Clark tem um olhar de cinema que chega até a ser inspirado) e momentos de poesia trash coexistem com uma enorme sensação de déjà vu requentado. Como se o importante fosse marcar presença, dar um sinal de vida, mesmo que não haja mais nada a dizer.

Nada em O Cheiro de Nós é particularmente novo ou sequer especialmente interessante, para lá de confirmar o singular olhar de Larry Clark sobre a adolescência como um momento simultâneo de liberdade e desespero. É um filme de fotógrafo, tão evocativo como dúbio, tão ambíguo como tudo o que Clark filmou antes, mas que nada adianta ao seu percurso.