Guterres adverte que não é Ban Ki-moon que escolhe o secretário-geral das Nações Unidas

O antigo primeiro-ministro considera-se um “federalista europeu frustrado”. Catarina Martins fala de uma UE que é hoje um projecto “em tudo contrário ao dos direitos humanos”.

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António Guterres vai aproveitar a visita que o secretário-geral das Nações Unidas tem prevista a Portugal, em meados do próximo mês, a convite do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, para se encontrar com Ban Ki-moon, mas adverte que a decisão para lhe suceder no cargo não passa por ele, mas sim pela Assembleia Geral e o Conselho de Segurança.

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António Guterres vai aproveitar a visita que o secretário-geral das Nações Unidas tem prevista a Portugal, em meados do próximo mês, a convite do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, para se encontrar com Ban Ki-moon, mas adverte que a decisão para lhe suceder no cargo não passa por ele, mas sim pela Assembleia Geral e o Conselho de Segurança.

“O secretário-geral das Nações Unidas conhece-me muito bem e eu terei, aliás, muito gosto em estar com ele”, disse o ex-Alto Comissário para os Refugiados, afirmando, a este propósito, que “o que interessa é transmitir por parte de Portugal uma mensagem de solidariedade em relação à ONU e uma mensagem de aposta num mundo que desenvolva mecanismos multilaterais para resolver os problemas globais. Já nenhum país sozinho pode resolver os problemas das alterações climáticas ou das migrações”.

No Porto, onde participou este domingo, a convite do Bloco de Esquerda, na sessão de encerramento do encontro da comissão executiva do Partido da Esquerda Europeia (PEE), o candidato a secretário-geral das Nações Unidas criticou a “incapacidade da Europa em dar uma resposta solidária à crise dos refugiados e à crise das migrações” e não desperdiçou a oportunidade para zurzir no acordo que a União Europeia (UE) e a Turquia subescreveram em Março.

Da porta-voz do BE, Catarina Martins, ouviram-se críticas idênticas. A dirigente do Bloco referiu que a UE é hoje um projecto “em tudo contrário ao dos direitos humanos” por não ter sabido dar resposta à crise dos refugiados e frisou que “nada diminui mais uma pessoa do que “normalizar a tragédia de tanta gente em fuga”. Sublinhou depois que “um dos sinais mais evidente da crise na União Europeia é, sem dúvida, a incapacidade de integrar os milhares de pessoas que aqui acorrem como migrantes, como refugiados”. Disse que o facto de “sermos capazes de impedir a construção de muros de segregação em países membros como a Hungria e de contribuir para atacar as causas das migrações faz da União Europeia um projecto que é em tudo contrário aos direitos humanos e o acordo com a Turquia é em boa medida o espelho dessa actuação”.

Antes, António Guterres havia falado desta questão tema para evidenciar que o acordo entre a UE a Turquia é o “contrário” daquilo que devia ser, considerando necessária uma “perspectiva distinta”. Nesse sentido, propôs uma “oferta maciça de reinstalação legal” para compensar um travão colocado no movimento irregular de pessoas em direcção à Europa como forma de combater o contrabando e o tráfico humano”.

Falando para uma plateia de convidados do PEE, o ex-primeiro-ministro explicou que “infelizmente, o que foi posto em cima da mesa no acordo entre a União Europeia a Turquia não é isso. Por cada um que é reenviado para a Turquia, vai-se buscar um. Ou seja, quanto menor for o movimento, menor é o número de pessoas que vêm legalmente para a Europa, quando é exactamente o contrário. Quanto menor for o movimento, maior deve ser o número de pessoas que vêm legalmente para a Europa. O que precisamos é de uma perspectiva distinta”, insistiu Guterres.

Ladeado por Marisa Matias e Catarina Martins e discursando ora em português, ora em inglês e francês, Guterres partilhou com os participantes que sempre foi um federalista europeu, mas que agora é “federalista europeu frustrado”, proclamando uma maior colaboração entre os Estados membros da UE. Respondendo a perguntas dos membros do Partido da Esquerda Europeia, Guterres referiu que o sistema para lidar com refugiados “foi criado tendo em vista pedidos individuais de pessoas que vêem para a Europa em pequenos números”. Recorreu à Convenção de Dublin, para dizer que a responsabilidade de acolhimento foi colocada sobre o país de entrada da pessoa em causa, algo que “já não se adequa situação actual em que há movimentos em massa face aos quais é preciso fazer uma distribuição justa dos refugiados”.

“Sou a favor de um sistema europeu de asilo. Sempre fui um federalista europeu, hoje sou um federalista europeu frustrado, mas não acredito que os problemas do nosso tempo possam ser resolvidos individualmente pelos nossos países”, declarou, reclamando uma junção de esforços, Se assim não for – nota – a “Europa será menos e menos relevante para os assuntos globais”. “Não vejo a Europa a caminhar nesta direcção”, desabafou o ex-Alto Comissario das Nações Unidas para os Refugiados, considerando que o que falhou no acordo entre a União Europeia e a Turquia foi a “incapacidade que a Europa teve de ter um resposta europeia solidária á crise dos refugiados e das migrações”.

À chegada ao Seminário do Vilar, onde decorreu a iniciativa, organizada pelo BE, António Guterres, recebeu das mãos de um participante no encontro do PEE, Manuel Lopes Zebral, um documento no qual apela ao candidato a secretário-geral das Nações Unidas para o receber. Lopes Zebral preside à Associação Galiza Solidária (integra a Comissão para a Reunificação Nacional da Galiza e Portugal) e defende o “direito à autodeterminação da Galiza, como aconteceu com Timor Leste”.