No caso do vírus Zika “o excesso de zelo faz sentido”

Professor de Virologia da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa recomenda que homens que viajem para o Brasil, e estejam a tentar ter filhos, façam análises após o regresso.

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O vírus Zika é transmitido através da picada do mosquito do género Aedes AFP

O que se sabe sobre a infecção por vírus Zika é muito pouco. “Na ignorância é melhor prevenir de forma mais drástica. O excesso de zelo faz sentido”, defende José Miguel Azevedo Pereira, professor de Virologia da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, um dos organizadores de um congresso sobre infecções virais emergentes que decorre esta quarta-feira na instituição. Uma das recomendações que faz é aos homens que viajem para países onde o vírus está activo, como o Brasil, e estejam a tentar ter filhos: façam análises 15 dias depois do regresso.

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O que se sabe sobre a infecção por vírus Zika é muito pouco. “Na ignorância é melhor prevenir de forma mais drástica. O excesso de zelo faz sentido”, defende José Miguel Azevedo Pereira, professor de Virologia da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, um dos organizadores de um congresso sobre infecções virais emergentes que decorre esta quarta-feira na instituição. Uma das recomendações que faz é aos homens que viajem para países onde o vírus está activo, como o Brasil, e estejam a tentar ter filhos: façam análises 15 dias depois do regresso.

O vírus Zika é transmitido através da picada do mosquito do género Aedes. Só um em cada cinco pessoas infectadas desenvolve sintomas, que não diferem muito de uma vulgar gripe, nota o especialista, como são a febre ligeira, dores articulares, erupção cutânea e conjuntivite. É, portanto, uma infecção que é, por norma, benigna.

Assim, o grande foco de preocupação são mesmo os perigos, ainda em estudo, de a infecção da mulher grávida poder levar ao desenvolvimento de malformações do sistema nervoso central em fetos ou recém-nascidos, como é a microcefalia. E aqui, ao contrário por exemplo da infecção materna por rubéola, em que o perigo de afectar o feto está concentrado no primeiro trimestre da gestação, não se sabe ainda com certeza se no Zika o risco de exposição existe durante toda a gravidez, diz o especialista. E no caso da rubéola existe vacina.

A juntar às recomendações já existentes das autoridades de saúde, que dizem que as grávidas ou mulheres em idade fértil que pretendam engravidar não devem viajar para países onde o vírus está activo, como é o caso do Brasil, José Miguel Azevedo Pereira deixaria uma outra recomendação, para os homens que estejam a tentar ter filhos. Ainda não há certezas quanto à possibilidade de transmissão por via sexual mas, em caso de dúvida, o investigador defende que os homens nesta situação, e que viajam para estes países, mesmo sem qualquer sintoma, devem fazer análises sanguíneas 15 dias depois do seu regresso. Isto porque o período de incubação descrito rondará uma semana e meia. O objectivo é prevenir o risco de eventual transmissão à parceira que queira engravidar.

O vírus foi detectado no sémen mas ainda não foi provado com toda a certeza se é transmitido por via sexual, explica. “Sabe-se que existe mas não se quantificou as [suas] concentrações”. Não há provas de que exista na saliva, urina ou fezes. “No sangue sabe-se que também existe mas não se quantificou as concentrações". Também não sabe ainda se é eliminado pelo organismo depois de pouco tempo ou se persiste vários meses depois da infecção, algo que está a ser estudado em pessoas infectadas recentemente. “Sobre o Zika há mais pontos de interrogação do que afirmações concretas.”

A aproximação dos Jogos Olímpicos no Brasil, que começam em Agosto, deve ser uma razão de preocupação acrescida, defende o professor. No Brasil contaram-se um milhão e meio de infecções  e, desde o início do surto, no ano passado, terão nascido mais de 700 bebés com microcefalia, estando a ser estudados 4200 casos suspeitos, referiu a agência Reuters. “Até Agosto haverá muito mais informações.”

Se é verdade que o evento coincide com o Inverno brasileiro, altura em que as temperaturas vão descer, o que leva ao decréscimo da actividade dos mosquitos portadores do vírus, também é verdade que vai haver grande densidade populacional de pessoas vindas de todo o mundo naquele país, o que potencia a transmissão.

Este era um vírus que estava delimitado a zonas do continente africano, passou depois para a Ásia e ilhas do Pacífico, mas “só teve atenção pública” em 2015 com o Brasil. A investigação ao Zika é, assim, recente “e há dados pouco consistentes e por vezes contraditórios”. Por essa razão, a Faculdade de Farmácia de Lisboa organizou o congresso “Infecções Virais Emergentes: Infecções por Vírus Zika e Outros Arbovírus”, que decorre a 16 de Março naquela faculdade.

Foram notificados casos de doença por vírus Zika em vários países, nomeadamente Cabo Verde, Colômbia, El Salvador, Fiji, Guatemala, México, Nova Caledónia, Panamá, Paraguai, Porto Rico, Samoa, Ilhas Salomão, Suriname, Vanuatu, Venezuela, Martinica, Guiana Francesa e Honduras.

Em Portugal, foram, até ao momento, confirmados laboratorialmente pelo Instituto Ricardo Jorge 11 casos que ocorreram em cidadãos portugueses, dez regressados do Brasil. Todos evoluíram favoravelmente.