Interesses franceses em Lisboa com vigilância reforçada

Asseguram que Portugal não está na rota do jihadismo, mas só 48 a 72 horas depois dos atentados chega aos serviços secretos a informação do congénere onde ocorreram.

Foto
Flores junto à embaixada de França em Lisboa em homenagem às vítimas dos atentados de Paris Miguel Manso

Sedes diplomáticas, escolas e instituições francesas em Lisboa estão com vigilância reforçada, apurou o PÚBLICO. Esta medida de excepção foi adoptada apesar das autoridades portuguesas manterem o nível de alerta antiterrorista moderado, ou seja a cota quatro de uma escala de um a cinco, na qual o primeiro valor é o de maior gravidade.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Sedes diplomáticas, escolas e instituições francesas em Lisboa estão com vigilância reforçada, apurou o PÚBLICO. Esta medida de excepção foi adoptada apesar das autoridades portuguesas manterem o nível de alerta antiterrorista moderado, ou seja a cota quatro de uma escala de um a cinco, na qual o primeiro valor é o de maior gravidade.

Para além da embaixada em Lisboa, em Santos, o Liceu Francês, nas Amoreiras, e o Instituto Franco-Português, nas Avenidas Novas, são algumas das instalações e serviços emblemáticos de França na capital nos quais a vigilância foi aumentada. Este reforço ocorreu às primeiras horas da madrugada de sábado.

Contudo, ainda antes dos atentados de Paris, em algumas embaixadas dos países da coligação internacional envolvidos nos bombardeamentos na Síria e no Iraque já vigorava há muito um grau de risco superior. Correspondia à cota três que significa “perigo significativo”. Ainda assim, a segurança policial estática foi reforçada no sábado nas representações diplomáticas em Lisboa do Reino Unido, Estados Unidos e Alemanha. Do mesmo modo, foi aumentada a presença policial nos aeroportos da Portela, Porto e Faro, tradicionalmente considerados pontos estratégicos.

A manutenção do nível moderado antiterrorista para o nosso país deve-se, apurou o PÚBLICO, ao facto de até agora não existirem elementos que permitam qualquer ligação dos terroristas que actuaram na capital francesa a Portugal. Tal deve-se, entre outros motivos, ao escasso volume de informação oriunda de Paris.

“As informações no seu conjunto são muito difusas”, admitiu à Lusa a secretária-geral do Sistema de Segurança, Helena Fazenda. Aliás, ao fim da manhã deste sábado não estava ainda agendada nenhuma reunião do Gabinete Coordenador de Segurança e da Unidade de Coordenação Antiterrorista. “Não há novidade nem motivo para qualquer reunião”, precisou um responsável ministerial.

Tal encontro só deve ocorrer nos próximos dias, quando a Lisboa chegar informação dos serviços secretos franceses. Em processos normais, só 48 a 72 horas depois dos atentados as entidades do país ou países que os investigam, transmitem a informação aos serviços congéneres. A excepção é quando existe envolvimento de cidadãos ou ramificações num país terceiro. Pelo que, ao princípio da noite de sábado, a ausência confessa de informação era considerada pelos responsáveis como bom agoiro.

“Portugal está fora da rota [do terrorismo jihadista], aliás não há razões objectivas para estar”, assegura, ao PÚBLICO, Ângelo Correia. O presidente da direcção da Câmara de Comércio e Indústria Árabe-Portuguesa enumera os motivos: “As comunidades islâmicas são escassas, estão integradas na sociedade, pelo que seria fácil de detectar a presença de radicais.”

Assim, Lisboa está à margem de alvos determinantes que o antigo político situa em cidades como Paris, Londres, Roma, Copenhaga ou Estocolmo. “O trânsito islâmico em Portugal é mais restrito que em França, Itália e Espanha”, observa.  Contudo, mostra-se favorável à decisão do Governo português de enviar 30 comandos como instrutores das tropas iraquianas.  “É necessário e positivo para a articulação com as forças locais e, assim, envolver os países árabes na luta contra o jihadismo”, sintetiza. “Os que atentaram em Paris serão, porventura, membros de células adormecidas, silenciosas, que se calhar nem frequentam habitualmente as mesquitas, por isso penetrar nessas redes é praticamente impossível”, conclui Ângelo Correia.

“Era expectável, Paris estava à espera, os locais é que são sempre a surpresa”, comenta, ao PÚBLICO, um especialista de segurança com trajecto na NATO que solicita o anonimato. “Passou-se de uma simulação para um sistema de gestão das consequências”, explica. Nesta versão, todas as fases foram cumpridas, da identificação dos terroristas, cujo processo está a decorrer, ao contra terrorismo, pela morte de quatro deles. Quanto à prevenção, a prontidão da resposta da polícia e dos serviços de emergência revela a existência de um estado de alerta, que sempre foi reconhecido pelo Governo francês.

Outro perito português assinala que os atentados de Paris 2015 e Madrid 2004 destroem uma das preocupações dos serviços de segurança: os denominados lobos solitários, cuja acção, por ser individual, é mais difícil de detectar. Trata-se, contudo, reconhece aquele especialista, de uma magra compensação. “Estamos perante um comando organizado, coordenado no tempo e no espaço, com preparação, planeamento e conhecimento do terreno”, conclui. Ou seja, com elevado grau de profissionalismo.

Desde a noite de sexta-feira, quando Lisboa foi alertada pelos meios de comunicação, pela embaixada e serviços consulares portugueses de Paris para a série de atentados desenvolveram-se múltiplos contactos entre o gabinete do primeiro-ministro, o ministro dos Negócios Estrangeiros e o titular da Administração Interna. Passos Coelho, Rui Machete e Calvão da Silva foram coordenando posições.

Ao mesmo tempo, no Palácio das Necessidades era activado o gabinete de emergência consular, coordenado pelo secretário de Estado das Comunidades, José Cesário. Este serviço divulgou a morte de dois cidadãos portugueses: um homem de 63 anos, motorista de profissão, emigrante em França, que morreu junto ao Estádio de França, e a da luso-francesa Priscilia Correia, 35 anos, assassinada na sala de espectáculos Bataclan. A possibilidade de outras das vítimas mortais ou feridos ser de origem portuguesa ainda não foi posta de parte, pois a França contabiliza como franceses os cidadãos que possuem dupla nacionalidade.