Manuais escolares, um problema português

Algumas coisas que não compreendemos sobre os livros escolares no nosso país

Todos os anos, escrevemos neste jornal sobre a dificuldade que os pais têm, em Portugal, em reutilizar os manuais escolares que herdaram de irmãos, primos ou amigos. Foram aparecendo ideias novas, como o Clube dos Livros Escolares, que em 2008 tinha um serviço online de venda de manuais em segunda mão, mas que rapidamente foi obrigado a fechar por causa de uma providência cautelar da Texto Editores, do grupo Leya. Ou os bancos de trocas, que este ano tiveram muita procura. Há avanços e recuos.

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Todos os anos, escrevemos neste jornal sobre a dificuldade que os pais têm, em Portugal, em reutilizar os manuais escolares que herdaram de irmãos, primos ou amigos. Foram aparecendo ideias novas, como o Clube dos Livros Escolares, que em 2008 tinha um serviço online de venda de manuais em segunda mão, mas que rapidamente foi obrigado a fechar por causa de uma providência cautelar da Texto Editores, do grupo Leya. Ou os bancos de trocas, que este ano tiveram muita procura. Há avanços e recuos.

E há algumas coisas que os portugueses não compreendem. Porque é que os manuais são tão caros e em média os livros do 7.º ano custam 252 euros e os do 10.º ano 251 (os outros são pouco menos). Porque é que os governos mudam os programas e as metas curriculares com tanta frequência, ignorando a própria lei que estipula um mínimo de vida para os livros. Porque é que, em tempo de austeridade e de “enorme aumento de impostos”, mal chegou ao poder o Governo introduziu novas metas curriculares. Porque é que as metas vão ao pormenor de impor, um por um, os nomes de dezenas e dezenas de autores e obras obrigatórias e não espelham apenas o nosso património cultural mínimo, num gesto de aberrante paternalismo. Porque é que as metas e os programas, que são documentos públicos feitos para os professores, forçam à mudança dos manuais. Porque é que, quando há mudanças, as editoras refazem os manuais, em vez de fazerem erratas. Porque é que as metas não são simplesmente distribuídas e discutidas pelas escolas e os professores de modo a serem reflectidas nas aulas. Porque é que os professores e as escolas não se colocam activa e eticamente do lado das famílias, em vez de pressionarem as crianças a levarem para a escola o manual “certo”, ou seja, a edição mais recente, chegando ao ponto de marcar faltas de material. Porque é que uma reimpressão de um manual escolar com tiragens de 20 ou 30 mil exemplares custa 20 euros — e em princípio sem sobras, pois as editoras só imprimem depois de saberem quantas escolas adoptaram os seus livros — e um livro inédito com uma tiragem de mil exemplares e grande risco comercial custa 15. Porque é que em nome da liberdade de escolha, há centenas de manuais no mercado. Porque é que mantemos o complexo, pesado e caro sistema de acreditação de entidades avaliadoras e certificadoras de manuais escolares — talvez o único caso em toda a Europa. Porque é que não se reconhece que movimentos como o Reutilizar.org representam a preocupação de um milhão de portugueses e não de apenas algumas pessoas. Porque é que um mesmo grupo editorial, como é o caso da Porto Editora, tem só para uma disciplina e um ano — 5.º ano de Português — cinco manuais diferentes.

Este é um problema de todos. Não é de esquerda, nem de direita. É um problema de Portugal que precisa de um plano de acção urgente.