Desigualdade no acesso a cuidados paliativos pediátricos deve acabar

Crianças com cancro e as que vivem em Lisboa e no Porto beneficiam de mais cuidados.

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Novos casos de cancro continuam a aumentar a um ritmo acelerado Gonçalo POrtuguês

"Existe uma desigualdade muito grande em termos de acesso em todo o país, as crianças com cancro são as que dispõem de mais apoio, de mais cuidados, e as crianças que vivem em Lisboa e no Porto", disse Ana Lacerda, a propósito das Primeiras Jornadas de Cuidados Paliativos Pediátricos, que decorrem entre quinta e sexta-feira próximas em Lisboa.

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"Existe uma desigualdade muito grande em termos de acesso em todo o país, as crianças com cancro são as que dispõem de mais apoio, de mais cuidados, e as crianças que vivem em Lisboa e no Porto", disse Ana Lacerda, a propósito das Primeiras Jornadas de Cuidados Paliativos Pediátricos, que decorrem entre quinta e sexta-feira próximas em Lisboa.

Segundo o relatório elaborado pelo Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento dos Cuidados Paliativos Pediátricos, coordenado por Ana Lacerda, existem 44 serviços hospitalares no continente e quatro nas regiões autónomas que prestam estes cuidados. O maior número de serviços situa-se no Norte e na região de Lisboa e Vale do Tejo (15 em cada), seguido da região Centro (9), do Alentejo (4) e Algarve (1).

O relatório acentua que existe uma "desigualdade de acesso em termos de diagnóstico (apenas crianças com cancro, doenças respiratórias e necessidade de nutrição parentérica parecem beneficiar de tais apoios) e de local de residência". Ana Lacerda advertiu que "é preciso atender a estas desigualdades e procurar que elas desapareçam e há muito por fazer efectivamente".

Para a médica, também "é urgente sensibilizar a sociedade e os profissionais de saúde para a importância de mudar o paradigma dos cuidados à criança com doença crónica complexa". Estes cuidados são basicamente prestados a "crianças que vivem com doenças crónicas complexas e é sobretudo para isso que trabalhamos", frisou.

Estima-se que vivam em Portugal pelo menos seis mil crianças com necessidades paliativas. Destas, cerca de 200 morrem anualmente, a grande maioria no hospital. "Os seus cuidados têm-se caracterizado por um foco excessivo na intervenção médica, centralização em hospitais terciários, fragmentação e ausência de coordenação, escassez de apoio domiciliário e psicossocial", salienta o relatório.

Contudo, existem algumas experiências (de articulação, de reorganização de serviços, de apoio domiciliário) que se têm revelado "sustentáveis e frutíferas" e que devem ser replicadas de "forma organizada", defende.

O relatório propõe um modelo para estes cuidados assente em "quatro pilares": formação dos profissionais envolvidos nos cuidados de crianças com necessidades paliativas, promoção da prestação de cuidados domiciliários, reorganização das instalações pediátricas e a "articulação eficaz entre todos os prestadores de cuidados de saúde".

Defende também a criação de "unidades pediátricas que respondam de forma atempada e adequada às necessidades de internamento para capacitação ou descanso do cuidador, controlo de sintomas e fim de vida".

Para Ana Lacerda, é necessário "melhorar a formação de todos os profissionais para poder proporcionar às crianças cuidados de qualidade", a "par da necessidade das direcções dos hospitais e dos serviços entenderem a necessidade imperiosa que existe neste momento de desenvolver estas equipas e estas unidades".