Crise económica no Brasil já é uma recessão técnica

O ambiente de instabilidade política acelerou o ritmo da deterioração da conjuntura económica. País não cresceu nos últimos cinco trimestres, e arrisca-se a viver um período prolongado de retracção.

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Brasil pode ter uma contracção da economia de 2% em 2015 UESLEI MARCELINO/REUTERS

Os indicadores desferem um duro golpe nas aspirações do Brasil a líder do bloco das economias emergentes, e mais uma machadada na credibilidade do Governo da Presidente Dilma Rousseff, cuja taxa de aprovação — à semelhança da actividade económica do país — está em queda acentuada. 
A retracção deve-se a uma nova quebra do investimento e do consumo, que já estavam em terreno negativo no primeiro trimestre.

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Os indicadores desferem um duro golpe nas aspirações do Brasil a líder do bloco das economias emergentes, e mais uma machadada na credibilidade do Governo da Presidente Dilma Rousseff, cuja taxa de aprovação — à semelhança da actividade económica do país — está em queda acentuada. 
A retracção deve-se a uma nova quebra do investimento e do consumo, que já estavam em terreno negativo no primeiro trimestre.

Pior do que os números divulgados pelo IGBE e pelo Banco Central são as previsões de diversos organismos e analistas, que apontam para uma recessão prolongada. Sem perspectivas de uma recuperação imediata, apesar dos últimos esforços do Governo, o Brasil arrisca-se a ter uma contracção da economia de 2% em 2015, seguida de uma queda que pode ser de 0,24% em 2016. A confirmarem-se as previsões, será a primeira vez desde 1948, quando o IGBE começou a medir o desempenho económico, que o país terá dois anos completos de crescimento negativo.
Mais pessimista do que as instituições oficiais, a Fundação Getúlio Vargas já classificou a economia brasileira em recessão há cinco trimestres. A actividade económica está em perda desde o início de 2014 (ou seja, este foi o quinto trimestre sem crescimento se comparado com o anterior). 

Ao contrário das autoridades, que só dão o alerta quando o PIB fica negativo por dois trimestres consecutivos, outras organizações analisam a evolução de indicadores como a produção industrial, as vendas do comércio, ou o mercado de trabalho, para declarar uma recessão “real” quando todos esses valores revelam a mesma tendência negativa.
Num relatório divulgado em Agosto, a Fundação Getúlio Vargas assinalava o início de 2014 como a data em que o ciclo de expansão económica brasileira (que arrancou após uma breve recessão em 2009, fruto da conjuntura internacional) começou a inverter. No segundo trimestre de 2014, notava o estudo, todos os indicadores relevantes estavam já em rota descendente. “Quando há uma queda generalizada do nível de actividade da economia, já podemos dizer que ela está em recessão”, explicava o economista Paulo Pichetti, um dos autores do relatório. Assim, pode considerar-se que o Brasil atravessa, actualmente, uma recessão profunda.

Subida da inflação
Nesse ano, e até mesmo já no final de 2013, vários analistas alertavam para a deterioração acelerada da economia, que se repercutia no dia-a-dia com o aumento da inflação e dos juros e a baixa dos rendimentos das famílias, e que punha em causa as contas públicas, pressionadas pela valorização cambial (real forte, dólar barato) e por um aumento da despesa em ambiente de deflação internacional — na altura, o Governo acusou-os de sabotagem e “guerra psicológica”.

Nos últimos seis meses, as condições económicas deterioraram-se ainda mais, muito por inércia mas também a reboque da crise política e de confiança que paralisou quase por completo a acção governativa depois da reeleição de Dilma Rousseff. A instabilidade política, resultado das revelações da investigação ao esquema de corrupção em torno da Petrobras, e do desmoronamento de alianças entre o Governo e o Congresso, impediu a Presidente de atacar a crise económica com maior autoridade e determinação — exacerbando o seu impacto, por causa do elevado grau de incerteza e desmoralização que tolhe os agentes económicos.

“Em geral é o investimento (ampliação de negócios e de construção) que acaba por comandar mergulhos e saltos do PIB. Mas os investimentos estão em colapso, também, por motivos que vão bem além do desânimo económico”, escreveu o  colunista da Folha de São Paulo, Vinicius Torres Freire, antecipando a divulgação dos números do PIB. “O sistema político travou, desmorona e não há por ora perspectiva de fim de agonia. Parte importante do investimento evaporou devido aos efeitos colaterais do inquérito do Petrolão, além dos efeitos secundários da asfixia financeira da Petrobras”, sublinhou.

Mea culpa de Dilma
No início da semana, a Presidente aproveitou uma entrevista com os três maiores jornais brasileiros para uma espécie de mea culpa, em que reconheceu que “errou” na sua avaliação e “subestimou” a dimensão da crise económica. “

Vocês perguntam: em que você errou? Penso que foi em ter demorado tanto para perceber que a situação podia ser mais grave do que imaginávamos. E, portanto, talvez nós tivéssemos de ter começado a fazer uma inflexão antes. Mas não tinha indício de uma coisa dessa envergadura. (.) Nós não imaginávamos que teria uma queda da arrecadação tão profunda”, confessou Dilma.

À pressa, e contra a oposição do Congresso, o Governo desenhou um programa de austeridade — ou “ajuste fiscal” — para corrigir os desequilíbrios orçamentais. Mas segundo os dados do Banco Central, tanto o Governo federal, como as administrações estaduais e municipais e as empresas públicas continuam a gastar mais do que embolsam: em Julho, o défice primário do sector público alcançou os dez mil milhões de reais, o valor mais alto desde 2001. 
Ainda de acordo com o Banco Central, nos últimos 12 meses o deve e o haver entre as despesas e as receitas do Estado produziu um “rombo primário acumulado” equivalente a 0,89% do PIB, o pior de sempre.