REN e Galp: juntas na vergonha

A falta de responsabilidade social que a Galp e a REN estão a revelar neste momento é um escândalo, e deve obviamente ter consequências.

Comigo e com milhões de contribuintes é assim. Mas se eu tivesse oportunidade de pagar um parecer de dezenas de milhares de euros a um “reputado jurisconsulto”, certamente tudo mudaria. Foi o que fez a Galp: “Após cuidada análise suportada em pareceres jurídicos de reputados jurisconsultos”, a empresa “decidiu não proceder à autoliquidação da contribuição extraordinária sobre o sector energético, em virtude da ilicitude deste tributo”. Da mesma forma, a REN “continua a avaliar a legalidade daquela contribuição”. E, enquanto isso, agem como jovens cançonetistas de tunas académicas, aos gritos de “não pagamos, não pagamos!”. Com a diferença que os jovens académicos acabam por pagar. E eles não pagam mesmo.

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Comigo e com milhões de contribuintes é assim. Mas se eu tivesse oportunidade de pagar um parecer de dezenas de milhares de euros a um “reputado jurisconsulto”, certamente tudo mudaria. Foi o que fez a Galp: “Após cuidada análise suportada em pareceres jurídicos de reputados jurisconsultos”, a empresa “decidiu não proceder à autoliquidação da contribuição extraordinária sobre o sector energético, em virtude da ilicitude deste tributo”. Da mesma forma, a REN “continua a avaliar a legalidade daquela contribuição”. E, enquanto isso, agem como jovens cançonetistas de tunas académicas, aos gritos de “não pagamos, não pagamos!”. Com a diferença que os jovens académicos acabam por pagar. E eles não pagam mesmo.

Da próxima vez que eu vir passar uma estrela cadente nos céus de Portugal, vou formular o seguinte desejo: um parecer jurídico suportado por reputados jurisconsultos para cada português, que lhes permita não pagar aquilo que o Estado lhes exige com tanto afinco. Eu não tenho dúvidas de que a Galp e a REN estejam a ser espoliadas com a malfadada contribuição extraordinária que as obriga a pagar uns horríveis 0,85% sobre o valor dos seus activos regulados. Só não percebo é porque é que elas estão a ser espoliadas e nós, pobres contribuintes, não estamos a ser espoliados com uma sobretaxa de 3,5% de IRS sobre a nossa actividade, que, aliás, está cada vez mais desregulada.

É por isso que espero que não seja verdade a manchete de ontem do Diário Económico, que sugere que enquanto a questão estiver em tribunal o processo de execução fiscal – já prometido, e bem, pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, e pelo ministro Moreira da Silva – ficará suspenso. Não é essa a minha experiência pessoal – o processo continua a correr e só fica suspenso se a autoridade tributária estiver para aí virada. No Portugal de 2014, até Deus está a perder em omnipotência para o Fisco, e não há qualquer razão para Ele (o Fisco) ser magnânimo para com duas empresas privilegiadas e de rentabilidade garantida. A falta de responsabilidade social que a Galp e a REN estão a revelar neste momento é um escândalo, e deve obviamente ter consequências.

Eu, quanto à REN, posso fazer pouco: quando ligo um interruptor, a electricidade insiste em vir pelos postes eléctricos dos senhores monopolistas que estão a fugir aos impostos – perdão, que estão “a avaliar a legalidade” da sua “contribuição”. Mas quanto à Galp, e já que não tenho gás em casa, estou decidido ao menos a evitar as suas bombas nos próximos tempos. Os “reputados jurisconsultos” que encham lá o depósito, da mesma forma que a Galp lhes encheu os bolsos. Eu evitarei. Com o que me sobra de IRS, prefiro investir no combustível de empresas um pouco menos jurisconsultadas mas um pouco mais decentes.