O filme do desencontro entre o cineasta e o poeta

Edgar Pêra filma Fernando Pessoa em Lisbon Revisited, uma colagem audiovisual fora de concurso em Locarno

Foto
"Lisbon Revisited", de Edgar Pêra DR

Prosseguindo na senda do 3D que começou a explorar com Cine-Sapiens, a sua contribuição para o projecto colectivo de Guimarães 3x3D, Lisbon Revisited é um filme-colagem à volta da obra de Fernando Pessoa. Como o cineasta explicou na introdução à primeira das duas projecções do filme, Pessoa é para ele o poeta que melhor define o século XX “mas também os nossos dias”, de uma contemporaneidade omnipresente. A partir de uma selecção de escritos dos seus vários heterónimos (e de uma das cartas de Ophélia Queirós), Pêra constrói uma absorvente e inquietante paisagem sonora de vozes, fragmentos de texto, música pré-existente (Berlioz, Schumann, Mahler) e construções abstractas, o todo ilustrado por imagens de Lisboa manipuladas ao extremo.

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Prosseguindo na senda do 3D que começou a explorar com Cine-Sapiens, a sua contribuição para o projecto colectivo de Guimarães 3x3D, Lisbon Revisited é um filme-colagem à volta da obra de Fernando Pessoa. Como o cineasta explicou na introdução à primeira das duas projecções do filme, Pessoa é para ele o poeta que melhor define o século XX “mas também os nossos dias”, de uma contemporaneidade omnipresente. A partir de uma selecção de escritos dos seus vários heterónimos (e de uma das cartas de Ophélia Queirós), Pêra constrói uma absorvente e inquietante paisagem sonora de vozes, fragmentos de texto, música pré-existente (Berlioz, Schumann, Mahler) e construções abstractas, o todo ilustrado por imagens de Lisboa manipuladas ao extremo.

Lisbon Revisited é imediatamente visível como mais um dos múltiplos “kino-diários” de Pêra/“homem-câmara”, outra das suas experiências formais não-lineares que têm composto a maioria da sua obra, com a sua aposta num experimentalismo sensorial amplificado pelas possibilidades da imagem em relevo. Mas esbarra num problema de raiz que não era forçosamente previsível: este parece ser, não um, mas antes dois filmes, que correm em paralelo sem nunca se encontrarem verdadeiramente. Um, sonoro, é um portento de inquietação e sugestão que pedia um trabalho de imagem que estivesse ao mesmo nível. Mas o outro, visual, não está; e rapidamente se torna cansativo e redundante, devido ao (ab)uso da inversão de cores. 

Edgar Pêra nunca foi, apenas, um cineasta da imagem e a sofisticação do seu trabalho sonoro tem sido uma constante na sua obra. A surpresa é que, desta vez, seja pelo som que recordamos um filme do cineasta. E é pena que este encontro entre os heterónimos pessoanos e as alucinações pêreanas - que podiam ter tanto para dizer uns ao outro -  seja, na prática, um desencontro em que fica cada um para seu lado. 

Notícia corrigida às 12h30: Pêra usa inversão de cores e não solarização da sua imagem