Morreu Emídio Rangel, o homem que inovou a rádio e a televisão

Tinha 66 anos. Fundador da TSF e antigo director-geral da SIC e da RTP ajudou a revolucionar a rádio e a televisão em Portugal.

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Rangel começou a sua vida profissional na rádio, em Angola na década de 60. Veio para Portugal já depois do 25 de Abril, formou-se em História. Esteve 12 anos na Radiodifusão e em 1988 fez parte da equipa fundadora da TSF.

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Rangel começou a sua vida profissional na rádio, em Angola na década de 60. Veio para Portugal já depois do 25 de Abril, formou-se em História. Esteve 12 anos na Radiodifusão e em 1988 fez parte da equipa fundadora da TSF.

Com o lançamento da televisão privada, Francisco Pinto Balsemão convida-o para director de Informação da SIC. Ali, acumulou depois também as funções de director de programas e assumiu o cargo de director-geral. Levou o canal à liderança das audiências num caminho fulgurante, chegando mesmo a mais de 50%.

Mas acabou por sair numa altura em que a estação começou num caminho descendente de perda de audiências para a TVI, quando esta começou a emitir sucessivas edições do reality show Big Brother - cuja compra Rangel recusara - e novelas de produção nacional.

Em 2001, passou para a RTP, para exercer funções também como director-geral. Acabou por sair no ano seguinte, regressando à rádio, como consultor da TSF, para desenhar o relançamento da estação noticiosa.

Desde então integrou diversos projectos, boa parte deles para Angola, e em Portugal esteve na preparação de uma das propostas para o quinto canal em sinal aberto que deveria ter sido lançado com a TDT – Televisão Digital Terrestre.

Recentemente, na apresentação do livro Vicente Jorge Silva – Conversas com Isabel Lucas, sobre o fundador do PÚBLICO, o historiador José Pacheco Pereira disse que “quando se fizer a história do jornalismo em Portugal”, além de Vicente Jorge Silva, nela teriam lugar de destaque Francisco Pinto Balsemão e Emídio Rangel.

Depois de ter lutado contra um cancro na bexiga diagnosticado há dez anos, o antigo director-geral da SIC e da RTP voltou a adoecer este ano. Depois de ter estado internado no Hospital de Santa Maria várias semanas, encontrava-se há 15 dias no Hospital Egas Moniz. O tratamento que estava a fazer ao fígado levou a que outros órgãos entrassem em falência.

O velório está marcado para as 17h de quinta-feira, na Basílica da Estrela, e a cremação do corpo será na sexta-feira, no cemitério dos Olivais, depois de uma missa na basílica às 12h.

Em Abril deste ano, Emídio Rangel falou ao PÚBLICO para contar a sua experiência como retornado, num trabalho sobre os últimos filhos do império.

Numa declaração enviada ao PÚBLICO, Francisco Pinto Balsemão diz lamentar a perda de Emídio Rangel. "Apesar das divergências que a partir de determinado momento tivemos e que foram públicas, quero sublinhar o papel fundamental que teve na história da rádio e da televisão privadas em Portugal, nomeadamente na construção da SIC", acrescenta o fundador da Impresa.

David Borges, antigo director da TSF, disse aos microfones da rádio que Rangel não foi apenas o fundador, mas sim o “criador”. Porque foi ele quem a “desenhou na sua cabeça e depois concretizou. Ao criar a TSF desenhou um novo paradigma da comunicação portuguesa.”

O jornalista, amigo pessoal de Emídio Rangel, recorda-o como uma pessoa “muito à frente do seu tempo”. Lembra o programa Nocturno que Rangel lançou na Rádio Comercial de Angola, “muito avançado para o modelo da rádio”. E diz que o fundador da TSF funcionava com base “em duas coordenadas”: como abordar um assunto que ainda não tenha sido falado ou como fazê-lo de forma diferente.

“Há um momento antes e um momento depois de Emídio Rangel” na comunicação social em Portugal, afirmou José Fragoso, antigo director da TSF àquela rádio, que está hoje a fazer uma emissão especial sobre o seu criador. O jornalista, que já passou também pela SIC, RTP e TVI com cargos de direcção de informação e de programas, considera Rangel um “visionário”, o “acelerador de partículas contra o cinzentismo da comunicação que se fazia em Portugal e contra o monopólio das rádios”.

Destaca o “carácter inovador” que Rangel imprimiu à TSF e depois também na informação da SIC, poucos anos depois. E lembra a iniciativa de enviar jornalistas para cenários de conflito e para grandes acontecimentos internacionais quando o resto da comunicação social estava ainda mergulhada num “atavismo”. Uma “vontade férrea de estar onde a coisa acontecia” que a TSF sintetizava na sua assinatura sonora “Vamos ao fim da rua, vamos ao fim do mundo”.

Numa nota no site da Presidência da República, Cavaco Silva lembra o “largo percurso profissional” de Rangel, cujo nome fica “ligado aos novos rumos do audiovisual em Portugal, tendo marcado com o seu exemplo várias gerações de jornalistas”.

O actual director-geral de Conteúdos da RTP, António Marinho, destacou na RTP Informação a capacidade de liderança de Rangel, um homem “muito sanguíneo” que “revolucionou completamente a comunicação social, quer na rádio, quer na TV”. A TSF “foi uma revolução na altura” e Rangel convidou para a sua estação os três editores das maiores rádios –Renascença, Antena 1 e Comercial.

A administração da estação pública, liderada por Alberto da Ponte prestou homenagem a Emídio Rangel, de quem diz ser “uma das maiores figuras do panorama audiovisual português”, um “nome incontornável nos media” e uma “referência da informação à direcção de programas”.

“Liderou e desenvolveu os projectos mais revolucionários das últimas duas décadas em Portugal. Soube inovar e contribuir, em muito, para a mudança na arte de fazer rádio e televisão. O seu saber e conhecimento constituem e constituirão um legado de enorme valor para o sector”, acrescenta a administração da RTP.