Literaturas lusófonas: Edição da obra do padre António Vieira, um sonho centenário

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A investigadora Annabela Rita Daniel Rocha

À nossa espera está Annabela Rita, professora da faculdade, que pede ajuda aos colegas para mostrarem, em cima de uma mesa, algumas das dezenas de obras já concluídas ou ainda em execução pelos investigadores do centro. Guardado noutra sala está o ex-líbris do centro: a edição dos 27 volumes, entre os 30 que terá, da obra do padre António Vieira.

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À nossa espera está Annabela Rita, professora da faculdade, que pede ajuda aos colegas para mostrarem, em cima de uma mesa, algumas das dezenas de obras já concluídas ou ainda em execução pelos investigadores do centro. Guardado noutra sala está o ex-líbris do centro: a edição dos 27 volumes, entre os 30 que terá, da obra do padre António Vieira.

Iniciada em 2012, sob a direcção de José Eduardo Franco e Pedro Calafate, a edição da obra completa do padre António Vieira reúne não só textos já publicados em edições parciais como manuscritos inéditos, todos procurados em bibliotecas e arquivos em Portugal, Espanha, Itália, Inglaterra, França ou Brasil.

O projecto concentrou mais de 72 especialistas e consultores internacionais, em parceria com mais de 20 universidades portuguesas e estrangeiras. O objectivo é reunir em linguagem actualizada as obras do padre António Vieira, considerado por Fernando Pessoa o imperador da língua portuguesa, para que qualquer cidadão as possa ler.

“É um serviço à cultura portuguesa. Estamos a publicar o maior projecto editorial em língua portuguesa ”, considera Annabela Rita sobre este trabalho, financiado em 500 mil euros pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. “Esta edição é sonhada há mais de 150 anos por gerações diferentes de estudiosos da língua e da cultura portuguesas, quer portugueses, quer brasileiros, quer ainda de outras nacionalidades”, conta José Eduardo Franco, director do CLEPUL. “Será um acontecimento cultural editar a obra completa daquele que é, ao lado de Camões, o autor cimeiro da nossa prosa.”

Depois a conversa toma outro rumo: a avaliação da FCT, que nesta primeira fase já sentenciou que o CLEPUL não vai passar à etapa seguinte. Teve Bom na classificação. Annabela Rita é contundente: diz não compreender os novos critérios e métodos de avaliação nem a falta de conhecimento dos avaliadores sobre o trabalho dos centros.

“Tem de haver adequação do avaliador ao avaliado. Eu não vou avaliar pessoas da matemática. Olhamos para aqueles painéis [de peritos da avaliação] e, de um modo geral, não conhecemos ninguém. Temos de nos sentir avaliados por alguém que conhece as matérias”, critica. “Os painéis de 2008 tinham muita gente desconhecida para alguns centros, como o caso das lusofonias. Mas pessoas provaram que dominavam a língua portuguesa, que conheciam o panorama bibliográfico e as matérias”, diz referindo-se à avaliação anterior do centro.

Nos três primeiros relatórios de avaliação, de avaliadores estrangeiros anónimos, o centro teve as notas 12, 14 e 17. “Verificamos que há uma amplitude de classificações, que não há consistência. Um painel destes é posto em causa pela avaliação que produziu”, considera Annabela Rita. “A avaliação é injusta e assimétrica.”

A nota final de Bom irá traduzir-se em pouco mais de 30.000 euros por ano, entre 2015 a 2020. Antes, o financiamento para o centro funcionar atingia cerca de 200.000 euros anuais, utilizados, entre outras coisas, para a revisão de textos e traduções, comprar bibliografia, computadores e máquinas fotográficas. Em 2013, os 200.000 euros passaram para 100.000. “Agora a redução é drástica. O financiamento vai dar para pagar ao secretário que tem a burocracia do centro.”

Outra crítica do centro que tem como intuito divulgar a língua portuguesa: antes, a FCT pedia que os relatórios do centro fossem em português e inglês, agora só é usada obrigatoriamente a segunda língua. “É uma menorização da língua portuguesa. Estamos a ser avaliados sobre matéria escrita em português, a cultura portuguesa, por pessoas que não falam português”, expõe Annabela Rita.

A indignação é visível no seu rosto. “Os centros morrem se não produzirem, morrem se não publicarem. Querem que a investigação científica continue ou que continue só em certas áreas?”


Texto editado por Teresa Firmino