A centenária Cooperativa do Povo Portuense quer abrir-se mais à cidade

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A cooperativa foi fundada por operários há 112 anos e é herdeira do antigo Instituto Antero de Quental Rui farinha

Nova direcção promete apoiar idosos em situação de isolamento, organizar debates e ceder espaços a empresas e artistas

Na parede do gabinete da direcção está pendurada a bandeira da Cooperativa de Solidariedade Social do Povo Portuense. Exibe três palavras: "autonomia"; "cooperação"; e "colectivismo". A última diz mais do contexto histórico no qual nasceu o Instituto Antero de Quental, a semente da cooperativa, do que do momento presente, diz o novo presidente da CSSPP, Paulo Jorge Teixeira. Mas a palavra "cooperação" faz tanto sentido hoje como há 112 anos, acredita.

Ocupa um prédio discreto da Rua do Paraíso. É um daqueles edifícios que parece (porque é) de outros tempos. O guiché, em madeira e vitrais, que separa os sócios dos funcionários da cooperativa, tem duas palavras desenhadas com primor: "Caixa" e "Expediente". Por aqui há ainda uma pequena biblioteca, uma sala de teatro onde já esteve a companhia Seiva Trupe e salas, muitas salas, à espera de vida.

Paulo Jorge Teixeira, que foi eleito na sexta-feira presidente da instituição, quer reforçar o papel da CSSPP, fundada em 1900, na vida da cidade. "Às vezes, é quase incompreensível para um jovem de 20 anos perceber o que fazemos", reconhece o empresário, de 46 anos, ligado à CSSPP há onze.

E o que a cooperativa faz, entre outras coisas, é, numa lógica próxima do mutualismo, fornecer consultas a preços sociais para os seus sócios - 2,5 ou quatro euros para clínica geral e 35 euros nas especialidades, nas clínicas da cooperativa (Rua de Camões, no Porto, e na Madalena, em Gaia) e noutras duas com as quais têm parcerias. Paga também um terço das despesas dos funerais dos sócios.

Estes benefícios estão à disposição de todos por três euros por mês. Mas Paulo Jorge Teixeira, que começou nos movimentos liceais e universitários e nunca mais deixou o associativismo, acredita que o futuro tem de passar por uma visão menos ligada aos benefícios pessoais, que privilegie a "participação cívica". "Esta cooperativa foi fundada por pessoas que pensavam livres", vinca. "Queremos intervir civicamente na cidade."

Missão: rejuvenescer

Mesmo os mais velhos participam pouco: dos 18 mil sócios, nem quatro dezenas aparecem nas assembleias gerais e a lista de Teixeira foi a única a concorrer às eleições. "Era bom que houvesse [uma lista concorrente]", diz o antigo presidente, Alcides Cacheira, que será o "braço direito" do novo presidente.

O "rejuvenescimento" da CSSPP (a média de idades dos sócios ronda os 60 anos) é uma das missões para os quatro anos de mandato de Paulo Jorge Teixeira. Para isso, projecta disponibilizar, a "preços económicos", espaços para que empresas ou ateliês de artistas e criativos se possam instalar no edifício, bem como a organização de debates e outros eventos na sala de teatro. Objectivo: conseguir 400 novos sócios a cada quatro meses.

Um dos projectos que vai envolver jovens, voluntários, é a criação de uma linha telefónica para pessoas idosas em situação de isolamento. Implementar mecanismos de apoio domiciliário para "vencer a solidão" e garantir cuidados de saúde a pessoas com dificuldades de locomoção é outro dos desafios.

A nova direcção espera também que a celebração dos 120 anos do nascimento do Instituto Antero de Quental (que, associando-se a outras organizações, formou a cooperativa), iniciativa de operários do Porto, seja um momento de abertura da CSSPP à cidade.

Para Paulo Jorge Teixeira, pelas "razões erradas", os portugueses estão a perceber que o Estado não pode fazer tudo. Nos últimos anos, diz, valorizaram-se quase exclusivamente as "relações de trabalho". É hora de recuperar a velhinha "cooperação" que está na bandeira da CSSPP, afirma.

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